2008-07-07

* Fotonotícia: PASSEATA DOS 100 MIL

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É possível pensar em imagens e com imagens.Veja a galeria de fotos.

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Quando as palavras tocam o silêncio, a imagem é capaz de retomar o ímpeto pelo diálogo
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* 26 de junho de 1968. Passeata dos 100 mil, no Rio de Janeiro, nasceu como um ato de estudantes, mas transformou-se numa grande manifestação popular contra o regime militar. Apoiando os estudantes estavam professores, operários, artistas, intelectuais trabalhadores de diferentes ofícios lutando pela democracia. Lá estavam Oscar Niemeyer, Clarice Lispector, Carlos Scliar, Ernanes Fernandes, Elayne Fonseca, Ziraldo, Fernando Gabeira, Milton Nascimento, Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil e tantos outros.
E com uma câmara na mão e uma idéia na cabeça, Glauber Rocha também filmava a manifestação popular. Deixou inacabado um curta, que marcou no mês de junho: a manifestação dos alunos da UFRJ que, no dia 4, anunciaram uma greve geral; a concentração estudantil na reitoria da mesma universidade, na Praia Vermelha no dia 20, que culminou com a prisão de 400 estudantes levados para o campo do Botafogo; e, no dia 26, a Passeata dos Cem Mil.


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* Fotonotícia: CAETANO VELOSO E OUTROS ARTISTAS EM PROTESTO

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Fotonotícia: * JORNALISTAS CONCENTRADOS NA CINELÂNDIA EM 1968

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* JORNALISTAS CONCENTRADOS NA CINELÂNDIA EM 1968

O jornalismo era uma das maneiras de idealistas lutarem contra a repressão militar.

* Fotonotícia: RESTAURANTE CALABOUÇO. MORTE DE EDSON LUIZ

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* • RESTAURANTE CALABOUÇO - Estudantes velam o corpo de Edson Luís Lima Souto, morto em confronto com a polícia militar durante uma manifestação contra o fechamento do restaurante Calabouço, em 28 de março de 1968, no Rio de Janeiro.

O enterro de Édson Luis reúne mais de 50 mil pessoas no Rio em um protesto contra o regime militar.

* Trecho de uma crônica de José Carlos de Oliveira - Uma sugestão construtiva – 20-4-1968.

"A carga da cavalaria da PM sobre a multidão encurralada contra a Candelária: quem não viu? A investida dos soldados armados de sabres e cassetetes contra a multidão desorganizada e aterrorizada na avenida; quem esqueceu? (...) Os soldados se excediam, mas não estavam moralmente liquidados, tanto que destruíram máquinas fotográficas e filmes".

* Fotonotícia:ASTRONAUTAS DA APOLLO 8

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Dia 24 de dezembro de 1968, os astronautas da nave espacial Apollo 8 foram consagrados como os primeiros a orbitar a Lua.

* Fotonotícia - MAIO DE 68 - PARIS

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* PARIS INFLAMADA - Protestos de maio de 68 inauguram uma nova forma de ação política, que tinha como alicerte o desejo individual.

* Fotonotícia - PROTESTOS NA ALEMANHA

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* Daniel Cohn-Bendit (ao microfone) participando de passeata na Alemanha a favor da liberação do desejo, de sexualidade.

* Fotonotícia: ESCOLA DE DIREITO/UFMG - 1968

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* ESCOLA DE DIREIRO/UFMG - Manifestação dos estudantes mineiros contra a ditadura militar, em frente à Faculdade de Direito da UFMG. foto: Arquivo Nacional / Correio da Manhã – 01.01.1968

Na América Latina o significado maior de 1968 foi os protestos dos estudantes contra as ditaduras militares; lutavam-se pela democratização do país, das universidades e da vida pública em geral.

"* Fotonotícia: MOVIMENTOS DOS ESTUDANTES FRANCESES

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Maio de 1968, França. O movimento dos estudantes franceses, liderados pelos alunos das universidades de Sorbonne e de Nanterre que foram para as ruas de Paris manifestar contra a moral repressora da sociedade e a política reacionária do presidente Charles de Gaulle.

Na França, não era a guerra ou os direitos civis que incomodavam tanto os jovens. Os estudantes protestavam contra a universidade: a instituição era autoritária e hierárquica, onde os alunos eram proibidos até de questionar professores na sala de aula.

* Fotonotícia: BEATLES E O GURU INDIANO

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Visita dos Beatles ao guru indiano Maharishi Mahesh Yogi, India. Final do mês de março de 1968 os integrantes do conjunto de rock procuram o guru para aprender meditação transcendental.

* Fotonotícia: PRIMAVERA DE PRAGA

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* A Primavera de Praga, Tchecoslováquia – 22 de agosto de 1968. Experiência de democracia esmagada pelos tanques soviéticos

O lider Alexander Dubcek foi empossado como primeiro-secretário do Partido Comunista da Tchecoslováquia. Ele prega o "Socialismo com Face Humana", em oposição à União Soviética, iniciando a Primavera de Praga.

Dias 20 e 21 de agosto de 1968 mais de 200 mil soldados soviéticos, fortemente armados com cerca de 5 mil tanques invandem o país e põem fim à Primavera de Praga.

Apesar de derrotado, o movimento mostrou e provocou rachaduras no bloco comunista que, anos mais tarde, acabou com a queda do Muro de Berlim.

* Fotonotícia: LUTHER KING

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Dia 4 de abril de 1968, o pastor Martin Luther King, lider dos direitos dos negros e da emancipação da mulher, é assassinado em Memphis, nos EUA. Pouco após sua morte, a Suprema Corte declarou que todas as formas de segregação eram contrárias à Constituição dos Estados Unidos da América – Mas não foi a geração de 68 que favoreceu a ascensão de negros a posições de destaque no país. Dez anos antes de 68 os norte-americanos já faziam campanhas pelos direitos civis. Não apenas em relação à segregação racial. Nos USA jovens com menos de 21 anos não podiam votar em ser votados naquela época.

* Fotonotícia: LED ZEPPELIN

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Dia 15 de outubro de 1968, a banda inglesa Lede Zeppelin, faz seu primeiro show. Mais tarde virou um dos mitos sagrados da história do rock.

* JIMI HENDRIX EM 1967

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Nas mãos de Jimi Hendrix, a guitara é capaz até de gritar de tanta ousadia. Ele caminha para entrar para a história do Rock como um virtuoso da guitarra.




em 12 de março de 2010
REVISAR

XXII – ESTALISHMENT

Suzana recompõe-se mentalmente, dizendo:
- Mesmo assim, penso que a mulher tem que se impor socialmente sem forçar muito a barra. Estar informada e atenta é o melhor jeito de ajudar a construir a sociedade que queremos, ainda que sem ações espetaculares.
- Sem dúvida – abona o rapaz.
- Precisamos de nos colocar socialmente, claro. Mas por razão, qualidade e profissionalismo em todas as situações. A sociedade moderna precisa de uma mulher consciente, ponderada, coerente e corajosa. Ou não?
- Tudo bem, mas...
- De qualquer forma, imagino que essa revolução de costumes ainda vai levar muito tempo para fazer a cabeça do homem brasileiro que é machão p’ra caramba.
Mathier em tom de pregação:
- Suzana, se liga. Elas não voltam atrás, nada será mais como antes. Opor-se ao establishment é decisivo O esquema é, cada dia mais, avançar no campo do poder e do respeito.
- Pago p’ra ver.
- Põe dentro de sua cabecinha uma coisa: nenhuma mente que se abre para uma nova idéia voltará a ter o tamanho original. Isso é sine qua non para o progresso da humanidade.
- Ora, viva!... Parabéns.
- Para seu governo, a luta não tem sido em vão. As mulheres já começam a ocupar novos espaços na sociedade transformando sonhos impossíveis em sonhos possíveis.
- Ah, que bom!...
- E bem-sucedidas.
- Glória a Deus!
- Tanto é que, hoje, nas faculdades boa parte dos alunos é do sexo feminino, inclusive nas áreas predominantemente dos machões, não é legal?
- Claro.
O rapaz mais enfático:
- Isso joga por terra as teses científicas que atestam que o cérebro da mulher é frágil e inapto para assimilar conhecimentos complexos como a Matemática, a Biologia ou a Física, permitindo enviar às mulheres e meninas mensagem clara de mudanças sociais, segundo a qual a igualdade de oportunidades é um direito inalienável.
- Ah, sim.
- É o fim de uma era. Hoje as mulheres invadem as universidades e deixam os campus muito mais bonitos e atraentes – elogia Mathier.
- Sei!... – expressa Suzana, com jeito de quem ainda tem dúvidas sobre o futuro das mulheres no mundo contemporâneo -. Mas, nosso destino, em particular das mulheres pobres, deve continuar muito sombrio diante da violência contra o sexo feminino. Segundo dados da OMS, duas em cada 10 mulheres da América Latina já foram vítimas de violência física, psicológica ou familiar. Estima-se que uma mulher em cada grupo de três no mundo é agredida, violentada ou vítima de outras espécies de abusos durante sua vida.
- Lamentável..
- Crimes cometidos contra as mulheres, na maioria da vezes, justificados como atos em defesa da honra – destaca Suzana.
- Mais lamentável ainda.
- Na história, claro que as mulheres foram oprimidas, estrupadas na alma e no corpo. E quase tudo continua como antes no quartel de Abrantes. Absurdamente, em nome da defesa da honra da família, mulheres e meninas são mortas a tiros, apedrejadas, queimadas, enterradas vivas, estranguladas, asfixiadas e apunhaladas até a morte, num ritmo assustador – enumera Suzana. Ainda existem países que adotam a castração das mulheres através do corte clitoriano. Um absurdo que persiste...
- Deus me livre, não gosto nem de ouvir falar, desumano – horriza Mathier.
- É preciso denunciar, Math. É preciso que Governantes, em todo o mundo, priorizem políticas públicas relativas a questões que dizem respeito às mulheres. Caso contrário nada muda.
- Combato.Vez ou outra faço uma matéria sobre o tema.
- Eu sei.
Até aqui até aqui
- No entanto, a maior parte desses crimes não aparcem nos jornais, assim como as inumeráveis violências infligidas às mulheres e às meninas por seus maridos, pais, irmãos, mtios ou outros homens.
Mathier competa indignado:
- Sabemos que a motivação da violência vai desde a violação das normas familiares ou comunitárias em matéria de comportamento sexual, à recusa a um casamento forçado, passando por pedidos de divórcio ou reclamações sobre herança. E o pior, Suzana, em alguns países, os autores desses crimes são tratados com admiração.
- Ainda bem que Deus deu a persistência como grande característica da mulher! – suspira a mulher.


- A tendência é só diminuir, é claro. Número de mulheres que se preparam para o universo profissional aumenta ano a ano. A constituição assegura a todos os cidadãos igualdade de direitos e deveres, seja homem seja mulher. Há avanços: as mulheres alcançaram um nível educacional mais elevado, participam cada vez mais do mercado de trabalho e estão mais representadas na política. Nesse sentido, vários países desenvolveram leis de igualdade, de cotas, contra a violência de gênero e criaram mecanismos institucionais para promover a igualdade nas atividades do Estado.
- São, sem dúvida, importantes avanços.
- Certo que o progresso em algumas áreas é lento.
- Quem é que garante. Veja bem, as domésticas, coitadas, enfrentam o pressuposto que a empregador deva servir dela sexualmente. E as casas de prostituição vão prosseguir como um destino freqüente para elas, meros objetos de prazer do homem.
E mais enfática: Até aqui até aqui
- Triste sociedade esta em que vivemos onde a mulher continua sendo agredida pela violência masculina que não diminui, mesmo com esse movimento todo. Sentindo-me humilhada, constrangida, envergonhada, porque no Brasil, a cada hora uma mulher é espancada no Brasil, que a maioria dos assassinatos de mulheres são cometidos por seus parceiros, maridos ou namorados, em nome da defesa da honra, principalmente em Beagá. E, pelo jeito, não vai diminuir nunca. E o mundo ainda é um lugar machista. Ainda há, e por muito vai permanecer, sérias desigualdades de gênero em nossas sociedades.

- Ah, vai!...
- Vai nada. O machismo é uma doença cultural que consiste basicamente na crença de que o homem é superior à mulher e que, para merecê-lo e conservá-lo, a mulher deve atender aos seus desejos e satisfazê-lo em tudo. É a mulher como objeto de cama e mesa.
- Pode acreditar, querida, o mundo está mudando.
- Não será desta vez, no futuro bem distante, quem sabe.
- O filósofo alemão Nietzche disse que a mulher moderna caminha para se tornar super-homem.
- Explique melhor.

- Não no sentido da força, mas da capacidade que ela tem de se superar. Quis dizer que, por mais que elas assumem a independência, vão ter sempre a alma feminina, a sensibilidade...
- Ai, Math.Tomara.
- Ô Suzana, desencana. A mulher de hoje quer morar sozinha, pagar suas contas e ter independência, inclusive sexual. Quer igualdade no campo do poder e do respeito, sem perder a ternura, claro.
- É... Nisso, você tem razão. Ter um canto para chamar de meu e poder aproveitar bons momentos de lazer que traduzam a personalidade e as emoções do morador. Ai, nem acredito.
- A mulher está deixando de ser alvo e passando a ser flecha. Sua mira é a liberdade, liberdade, liberdade. Se tiver a fim de lutar por uma vontade ela quer agir de forma clara, sem opressão. Por que não, os tempos são outros.
E levantando os braços, entoa a voz, Mathier:
- Abaixo o preconceito. Viva a revolução feminina!!!...
- Aposto que ainda tem muitos homens que não pensam assim.
- Tem sim. Todos aqueles que dançam samba para lá de desafinado.
- Sei não.
- A toda ação libertária corresponde uma repressora. Toda mudança cobra um alto preço emocional. No princípio, encontra resistência, porque antes de se tomar uma decisão difícil, e durante a tomada, chora-se muito, os questionamentos são inúmeros, a vida se desestabiliza. Isso porque perturba aqueles que interpretam de forma negativa a liberação da mulher. São hipócritas que ainda pensam que lugar de mulher é na beira do fogão, são reacionários de meia tijela, seres renitentes que implicam com toda novidade.

- É?
- São míopes e não enxergam a grandeza desse momento histórico, porcos reacionários de idéia tacanha, seres renitentes que implicam com toda novidade. Incomodados com as investidas femininas, algo que afetou o cérebro desses idiotas, acusam as mulheres até de boicotar o romantismo. Vê se pode?
- Não sem razão.
- Que nada!... O romantismo não vai acabar nunca, pode crer. O foco é que está mudando. Ama-se pela cor dos olhos, dos cabelos, pelo tom da voz. Ama-se pela sedução da boca, pela leveza das mãos que se desmancham, cada vez mais, em carinhos um para o outro. Ama-se pelo mistério, pelo indefinível. Os tempos são outros, os machões terão que se acostumar com as novas regras. Digo o óbvio: é mais fácil atacar do que defender uma idéia. Satisfeita?

- Seria lindo, Math. Até porque, quem gosta de mulher muito para frente são as próprias mulheres. Homens, nem tanto. Ainda há muitos desejosos de casar à moda antiga.
- A partir de Adão e Eva, o jogo do amor, aquele que versa sobre o encontro entre duas pessoas, pode ser considerado o mais antigo do mundo, vem mudando ao longo dos séculos.
- Claro.
- Para eles, cujo arquetipo niversal de beleza feminina está na femilidade e na fertilidade, que as noivas reverberam, brancas e radiantes, elas continuarão a vir na contramão dos ditames contemporâneos e se voltam para costumes tradicionais, numa tentativa de resgatar valores e manter a união sobre bases mais sólidas. Mas então chega o depois, a coisa feita, e aí a recompensa fica escancarada na face. Portanto, nao se preocupe, cada um cria sua historia e não há tática ideal para essa campeonato sentimental.
- Acho que por as relações estarem caindo tão no vazio, por a vivencia de tudo ocorrer muito rápido, gente nova vem buscando namoro tradicional de outros tempos , por escolha e não para cumprir uma determinação dos pais, como antes. Penso que tudo que é difícil fica mesmo mais gostoso.
- Ah, Suzana!...
- Sem essa de um discurso careta, acho que é hora de negar a banalidade das relações para garantir a felicidade eterna se é que ela existe. O que resta é ficar na torcida para que os casais encontrem as próprias regras do jogo.
- É assim que pensa, ‘né?

- As moderninhas de hoje, que andam com quase tudo de fora, que me desculpem. Imagino que a doidice na cabeça já anda extrapolando limites, tanto que os homens de antigamente sentiam muito mais tesão com as mulheres; bastava ver um pedaço de perna, um decote mais ousado... Hoje, a banalização está acabando com o mistério, o desejo de querer ver mais. Tudo tão escachado e sem limites que até eles, os homens, se assustam. É tanta libertinagem que está dando efeito contrário.
- Calma lá, sem esculacho. Vai, justamente, na contramão de tudo. Hoje, a mulher pega, mata e come machos constrangidos e inseguros, perplexos diante de tanta liberdade.
- Ou seja se há muita gente precoce no sexo, há outros tantos que preferem adiar o inicio da vida sexual e até ficar sem sexo até o casamento. E se estamos falando da necessidade de um novo modelo de civilização, muitas coisas precisam mudar, sim. O processo de mudança é lento, e vai exigir uma revisão de hábitos que se arpoximam mais de um estilo de vida responsável e sobretudo, sustentável. O importante é que essa diversidade de opção seja respeitada.

- Aí, tudo bem.
- Tenho minhas ressalvas ao amor com tanta liberdade e autonomia como na fórmula de Sartre e Simone. Se um dia encontrar alguém que mereça, quero viver um amor como o dos românticos, um amor de fusão e de consistência.
- Ó!... A gente fica imaginando como as pessoas se tornam tão caretas, mesmo tendo sido tão “modernos” em algum momento da vida.
E com suave ironia, ela:
- Carrego na alma a herança de uma memória romântica, tradição que curte a sensibilidade ingênua do romantismo que trata os sentimentos com toda delicadeza e fala direto ao coração. Adoro historias românticas! Sabe de uma coisa, o mito de amor romântico ainda prevalece dentro de mim. Sou o avesso do realismo absoluto; minha geração é do amor e uma cabana. Pra mim romance envolve romance.




- Ah, é? O amor nunca sai de moda, ainda bem. E é por isso que o estilo romântico sempre faz tanto sucesso.
- Quero mais é que meu homem, romântico sem ser choroso, claro, me mande flores e me corteje com serenatas, me bote no pedestal, resgate de amor romântico. Foi a maior prova de amor.
- Huuummmm!.... Ainda sonha com príncipe à antiga.
- Uma atmosfera que remete a um passado romântico. Em que as horas passavam devagar. Sou romântica até o fundo de minha alma, viu?
- Bom saber.

- Sempre. Não me conquista gente bem resolvida com seus afetos. Só confio em quem enlouquece de ciúme, em quem perde a cabeça quando sua mulher ou seu marido está conversando com alguém do sexo oposto com cara de quem achou um espécime interessante na festa... Enche de boas vibrações o coração da mulher.

- Muito, muito bom. Se chorar ou se sorrir, importante e ter emoções. Puro romantismo.
- Olha só, eu sou romântica, mas estou sozinha. Portando, o dia em que eu encontrar um parceiro assim, por mim eu viveria com ele sem papel assinado.
- Pelo menos enquanto do divórcio não chegar.
- Isso aí, meu lindo.
Risos.














6. até pag 134

Suzana aplaca das faces o sorriso, pensa um pouco e exclama:
- Decepcionado?
- Ahã?
- Bitolada!
- Repete.

- Bitolada. É o que deve pensar de mim.
- Eu, que isso!
- Me acha bitolada, antiquada demais, Math?
- Como é do perfil feminino... Na mulher nada é muito racional. Tudo é coração, inclusive a cabeça.
Estar informado e atento é o melhor jeito de ajudar a construir a sociedade que queremos, ainda que sem ações espetaculares

- Pelo contrário, você é uma mulher politizada, mas tem que modificar a forma como enxerga o mundo cá fora e a sua própria vida. Mas, tem gente que nunca muda de ponto de vista porque fica parada no tempo. Imagino que precisa rever a direção de sua bússola e mudar o foco do seu olhar, porque a luta das mulheres contra o preconceito é os melhor símbolo de uma transformação. Põe isso na cabecinha, ainda é tempo.
- E deixar de ser careta, bloqueada,´né?
- Não é bem assim.
- Sei que é. Deve pensar que sou uma mulher de pouca visão e muito intransigente com certas questões.
- O mundo vem mudando por fora e dentro de nós. E muito.
- Sim.
- Em tempos de mudanças, querida, a gente tem que se ligar em tudo. Você muda, o mercado muda, o mundo muda. Caso contrário o trem passa e perdemos a viagem. Quer um conselho?
- Estou ouvindo.
- Deve parar de querer mudar o mundo. Deve começar a pensar em mudar você já, porque esses são os melhores anos das nossas vidas.

- Ahã?...
- Adiante, coração. Mas é preciso ter força. É preciso ter raça. É preciso ter gana sempre. Quem traz no corpo a marca Maria, Maria. Viver é outra coisa, Suzana.

- Isso mesmo que ouviu. Seja diferente, avance. Vai em frente porque a gente tem que fazer aquilo de que gosta.
- Loge de mim ser porta-voz de mulheres tão incoconsequentes!...
- Ah, não quer entender coisica de nada, ‘né?
- Desencantado comigo?
- Não é isso.
- Bem, me desculpe.
- Desculpar de quê?
- Estou sendo ranzinza, chata. Mas, esse papo com você foi ótimo, prometo rever meus conceitos.
- No fundo, a imagem que a mulher construiu ao longo da vida sobre o sexo e a sexualidade e a forma com que ela se relacionou tanto com seu corpo como com o dos outros costumam ter peso ainda maior que o dos ditos desígnios da natureza.
- Pode ser.
- Melhor assim: ficar em sintonia com o futuro.
- Vou trabalhar também na parte da tarde, sair de casa e ter mais contato com o mundo lá fora.
- Pensa fazer o quê?
- Ainda não sei o que vou arranjar nesse tempo. Por enquanto estou pensando, mas vou atrás de outro emprego, apesar de que José Renato nunca gostou que trabalhasse fora, só torce contra mim, sempre. Para ele, seus projetos tem prioridade sobre seus sonhos. Ninguém quer ficar acorrentado à casa, anulada por um marido castrador e violento, sendo que lá fora tem tanta coisa para fazer.
- Algum problema?
- Todos.
- Aiaiaiiii.... Estranho isso vir dele!
- Também acho uma grande bobagem. É assim mesmo pensa uma coisa e fala outra.
- Neurose não. Escravidão pior ainda.
- Lamento dizer mas seu amiguinha é falso.
- Cada dia me convenço mais de que as mulheres são de um sistema planetário. Nós homens de outro. Coisa da natureza mesmo. Não tem jeito, nascemos com uma mão de ferro para sobrecarregar a mulher no papel de esposa e mãe, quando não amante para suas horas de loucura sexual. A gente se atrapalham com excesso de testosterona e infindável criancice. Vocês querem mais romance. Nos queremos mais liberdade. Vocês são doces, nos são rudes. Todos querem amar, mas ninguém se entende. Vedadeiro campo minado. Aquela história de juro que vou fazer você feliz!.... Papo furado. Hoje, meu amor enfrenta o gargalho da indiferença do outro. Ruiu. E vou fazer de tudo para que essa passado passe e não provoque minhas recordações. E aprendi que Mulher faz amaor para ter sexo, homem faz sexo para ter amor. - É por aí, nada mais do que viúva de um sonho. Talvez foi muito importante para mim, fui feliz, sim. Só que o amor de Suzana agora está longe do José Renato. É isso, o coração não pensa.
- Não. Promessa não cumprida com reposta tardia e a conta-gotas. São as voltas que a vida dá.



Esse é o quadro, o resto são variações sobre o mesmo tema. Amor é como um sonho, casamento é um despertador.


- Para ele deveria parar de trabalhar para ser mãe, a dona de casa, desde o inicio me pressiona a largar de trabalhar. Nosso casamento, nada ao vosso reino - revela a moça.

- Gosto de sua resistência. Tudo que a mulher tem e mal sabe usar, a força de vontado e o domínio sobre o desejo.
- Sabe por quê?
- Diz.
- Porque eu não abro mão de ganhar meu dinheiro e fazer o que me deixa feliz e o que deixa feliz é o meu trabalho. Não adianta ele encher minha cabeça, entende?
- Isso, menina, bola pra frente. Mulher financeiramente independente fica mais livre p’ra ir e vir. Menos polêmica e com mais sex-appeal.
- Quem sabe, assim, com tanto estímulo, posso encarar as transformações com mais tranqüilidade. Acho que minha vida vai melhorar quandoeu arrumar outro emprego e sair desse casamento, que está indo para o fundo do poço.


Meus sonhos me deixam viva.

- Assim que se fala.
- Pode não parecer, mas torço pela liberação da mulher, sim.
- Não parece. E você? Esta fazendo sua parte?

- Historicamente é uma luta antiga no Brasil, iniciada nas primeiras décadas do século XIX com a publicação do livro “Direitos das Mulheres e a Injustiça dos Homens” pela pernambucana Nísia Floresta Brasileira Augusta, que exigia mais respeito para o sexo feminino, já naquela época.
- Nísia?
- Nunca leu nada sobre ela?
- Não, nunca.
- Sua obra foi publicada em 1832, protestando contra a condição inferiorizada da mulher, até a divisão sexual do trabalho, isto é, das ocupações femininas com menor valor salarial e menos poder.
- Olha!...
- Na verdade, foi uma tradução adaptada para a realidade brasileira das idéias avançadas que já circulavam na Europa.
- Pô!
- Math, não sou tão desentenada assim não, medito mais em branda a respeito dessa conquista feminina, porque o mundo enlouqueceu à minha volta. Não tem como não ser, quanto mais vivo mais aprendo. Na verdade, jogo naquele time de mulheres que promovem uma revolução silenciosa, mas que se mostram à frente de seu tempo, dando voz à emancipação feminina. Sou fã e admiro a luta de Françoise Giroud e de Simone de Beauvoir, ambas francesas e de Simone Weil. Mulheres todo-poderosas que, em dose dupla, revolucionaram a visão do feminino e seguem lutando para tirar o véu de uma sociedade hipócrita desde que o mundo é mundo. Elas no comando. Joias francesas que conseguem dar vazão à amargura em todos as suas nuances.


- Pô!... Bravo! Simone de Beauvoir, principalmente. Sou fã dela, já leu O Segundo Sexo?
- Está na minha lista.
- Me refiro a ele como a minha bíblia. Lançado na França, em 1949, logo foi condenado pelo Vaticano. Mas, o tiro saiu pela culatra, só na primeira semana foram vendidos 22 mil exemplares do primeiro volume.
- Sem sombra de dúvida. A condenção do livro pelo clero, na época, repercutiu logo como forte atestado do impacto de 936 páginas analisando e denunciando a condição feminina escritas por essa que nunca se limitou a ser mulher de Jean-Paul Sartre.
- Nessas linhas, querida, Simone toca numa corda sensível da questão histórica da mulhare fáustica do desejo de reconhecimento.

- Pois é, Math, a gente pode e deve se adaptar aos novos tempos, abraçar o futuro etc... Mas alguns corte principles são imutáveis. Não acha?
- Sou suspeito.
- Nunca neguei que são mulheres extraordinárias que ajudam a definir o papel da mulher nesse final do século XX. Mas, acho que o bonde está indo depressa demais, meu ritmo é outro. Não podemos achar que estamos inventado a roda. O importante é saber contar de um jeito novo, velhas coisas. Entende?
- Pode ser, Suzana. Mas, as mudanças estão ai para quem quer ou não quer ver. Não vai negar, vai?
- Lógico que não. Nós, mulheres, precisamos transformar e passar à ação em todos os âmbitos. Não estamos pedindo uma mudança, nós a estamos protagonizando. Buscamos, com os homens, transformar a sociedade, atingir um desenvolvimento econômico e social mais justo neste mundo globalizado e superar os obstáculos que impedem a igualdade.
- Os ventos que sopram nesse momento vão deixar marcas profundas nas relações políticas e culturais no Brasil e no mundo. Acredite.

- Não nego que muitos costumes sociais precisam mudar. Os hábitos também. A maneira de pensar, a maneira de ser... eu sou batalhadora, sim. Alerta: em território masculino, mulher para entrar tem que ter muita competência, profissionalismo e sobre tudo, persistência.
- Sim. Sim. Profissionalismo supera o preconceito, promove mudanças.
- Afinal, o mundo faz parte de nossa historia.

- Então?
- Meu feminismo não é o do ódio ou de ressentimento, muito menos valorizo os comportamentos transgressivos; acho que devemos ter sempre um pé no passado, outro no futuro. Numa manifestação pacífica, passo isso, diariamente, aos meus alunos, que são jovens, descolados, modernos e, com certeza, a grande maioria, a favor da legalização do aborto e sem grilos. Sou moderna, mas nem tanto segura.

- Maravilha. Para dar mais visibilidade à importância da mulher na sociedade, a ONU quer criar um dia em homenagem ao sexo feminino.
Suzana, com humor:
- Rainha do lar!...
- Lógico que não. Para lembrar sua importância social.
- Seria bom mesmo.
- Então continue, a seu jeito, perdendo o medo do espelho, dos seus desejos e de correr riscos mesmo que tudo dê errado. É outra maneira de engrossar as fileiras de luta pela emancipação definitiva da mulher.
- Tudo bem. Tudo Bem. Por isso mesmo, vou batalhar pelo meu novo emprego e tomar posse de mim...
Mathier abaixo os olhos, dizendo:
- Imagina fazer o quê?
- Só não quero como professora, já ensino pela manhã.
- Que mais faz parte de seu talento?
- Falo inglês fluentemente.
- Então...
- Pensei num emprego de secretária biling...
- Boa pedida.
- Mesmo sem experiência acha que dou conta?
- Sim. Por que não? Se não correr o risco é melhor rasgar seu diploma e abrir uma quitanda.
Risos.
- Acha que seria um boa quitandeira?
- Pacas!...Chamosa assim ia quebrar seus concorrentes.

- Bobo. Vamos lá, eu sei que as oportunidade de emprego são raras, mas preciso trabalhar. Preciso me focar em alguma coisa.
- Quando dizem que está difícil arrumar emprego, estão errados. Emprego no Brasil tem de monte. Falta especialização.
Especialização em alguma profissão é essencial para um bom atendimento. No seu caso não é tão difícil assim.
- Ainda bem.
- E depois, quem tem rumo até o vento contra é a favor, isto é, todas as conquistas profissionais são produtos de esforço e dedicação.
- Claro.
- Escuta aqui, não vai se estressar na escolha da carreira e vocação.

- E como arrumar um emprego assim?
- Batalhando a gente consegue; correr atrás.

- Sem querer abusar já abusando, você me ajuda?
- Dou a maior força. Não sei se o Zé...
- Ai, socorro! Chiiiiii... Gracinha, acho que essa estória não vai dar certo. Sinal de encrenca danada, pepino na certa. Que os outros vão pensar, ‘né?
- Mexeriqueiros de plantão... Sempre tem um por perto para por mais lenha na fogueira e proclamar aos quatro ventos.
- Sem dúvida, pode dar o que falar e nos deixar na maior saia justa. Nós não podemos correr esse risco.


- Oh, não! Aproveitadores sempre existiram. Mexeriqueiros. Fofoqueiros, sim senhor. Deus me livre de cair na boca do povo!
- Fofocar é um dos traços mais intrínsecos da personalidade humana, falando da vida alheia. Gera ciumeira, intrigas...
- Ah, e essa idéia pode render muito, pode dar uma moda de viola daquela, contando a história de nós dois. Não pode vacilar.


- Impressionante, não?
- Sim. Toda fofoca tem um pouco de verdade, ou não?

- Está coberto de razão. Não vai faltar gente maliciosa para azedar tudo, dizendo que temos um caso bastante antigo. Sempre vai ter um mala cornetando, um saco.
- Pode aparecer, sim. Não por ser amigo de seu marido. Talvez não seja prudente que eu interceda tão empenhadamente, você pode estar correndo o risco. Longe de atritar com meu amigo Zé. O vento leva, daqui a pouco vai estar em Londres.


Suzana levanta-se e, olhando nos olhos do amigo, afirma:
- Oi dó. Não tem essa! Não sou tão ingênua. É assunto sério... Desistir, nunca. Vai que vai... Digo não e vou em frente.

- Isso mesmo. No que puder, conte com meu apoio.
- Com a cabeça que ele tem pode até achar que temos um caso, é isso?
- Temo. Não quero criar polêmica entre os dois, muito menos encrenca, por enquanto melhor eu ficar na minha.
- Tudo bem, se não, azar o meu. Quanto ao Zé, que se dane!
Depois de uma pausa, reabrindo o sorriso, Suzana:
- Sabe de uma coisa, também tenho curiosidades para folhear uma revista masculina. Nunca fiz isso, acredita?
- Play-Boy?
- Pode ser. A mais badalada.
O rapaz volta o rosto para o pratinho de azeitonas.
- Gosto não só pelas fotos, mas também pelos artigos e piadas. Principalmente de nus controversos de Helmut Newton. Se você pensar em fotos incríveis nesse estilo em Paris, pode saber: é ele que produz. Não tem nada a ver, sem apelar, faz um nu muito comportado. Nem seio, tudo escondidnho em meio à tecnica, mas é lindo; doce imagem e silêncio libidionoso na curtição, completando essa mandala do universo sexual.
- Mesmo imaginando que não deve ser fácil tirar a roupa e ficar dependurada numa banca de revistas, admiro a coragem dessas mulheres.
- Pousaria?
- De jeito maneira.
- Por mim, tudo bem. Arrumo uma edição para você nem que seja pedindo emprestado a um amigo.
- Ai, eu quero.
- Sem erro... Vez ou outra tem uma de bobeira lá na redação.
- Quero sim.
- São campeãs de vendas em qualquer lugar. Aqui proibidas.
- A curiosidade é geral?
- Na verdade, a indústria pornográfica pegou carona no liberalismo libidinoso dos últimos séculos e se tornou um dos mais rentáveis negócios do mundo. A partir desse século, as sociedades de consumo se “pornificaram” para consumir todo e qualquer tipo de pornografia nas revistas, nos livros e no cinema.
- Gente!...
- Sabia que, desde o século XIX, a Biblioteca Nacional da França, guarda a sete chaves, uma coleção de livros de conteúdo erótico, verdadeiros arquivos secretos revelam parte da história popular da frança. Tudo guardado num ambiente especial conhecido por L’ Enfer de la Biliothèque Nationalle, Eros au Secret”, criado no engenhoso governo de Napoleão para conservar essa parte da história, a serviço de um mundo de possibilidades, como um verdadeiro diálogo com maturidade.
textos nos quais sexo e erotismo são tratados com inteligência e muito humor.
- É só o que faltava? Escreveram para quem?
- A humanidade percorre sempre nas mesmas fantasias da vida de sexo, bebida, música, exageros, traição, experimentar, desexperimentar, mitos, desmistificações, alegrias, tristezas, sobresair-se, impor-se, revelar, encobrir, tudo dá na mesma, ninguém é maior, nem é melhor desde que seja humano, todos nós gostamos do melhor para nós, enfim, é o destino da civilização.
- Só é.
- Pensando nisso, o acervo sem vergonha faz parte da vocação histórica da França pela história da humanidade. Dá interpretação erótica a cenas comuns, tradicionais; histórias sobre como as pessoas observam o mundo por esse ângulo.

- Precisava?
- Pornopopéia. Picaresca. Escrita suja e despojada.
- Tanto faz.
- Obras para além do chulo, a poesia. Tem livro sobre tudo que é safadeza, narrando a rocambolesca historia das mulheres e homens mundanos em geral e, às vezes, de uma mulher em particular de um ponto de vista pornô, daquele incesturoso ou insestuosa se apaixona de forma obssessiva pela sua irmã , pela mãe, pelo pais ou por uma mulher que é casada com seu único amigo. A coleção exibe tesouros...

- Curuis. Devem ser publicação que se metem em tudo que é situação sem respeitar nenhum valor humano, nenhuma barreira moral. E, pelo jeito, deve ser tudo a base de gírias que são repetidas à exaustão, fazendo da narração uma torrente de chulices; renuncia total ao lirismo.
- Uma espécie de Instituto Francês de documentos pornôs, um baú de tesouros com publicações de aventuras bisaras de rapazes e donzelas, ao mesmo tempo, espertos, ignorantes, inocentes e patifes, mas que sabem tudo de sexo.
- Só podia ser francês mesmo.
- Bom.
- Não vejo tanta utilidade. Falta de ambição para além da orgástica, ele encontra, assim, certa coerência no quadro
- Memória importante tratada com uma coisa viva e que respira. Foi a vez da pornografia encontrar, desse teatro de grandes lances que se ocupa a civilização, hospedagem na mais célebre casa de livros do mundo.
Suzana depois de um fôlego, quis saber:
- Que babado!!!... Arquivo morto?
- Biblioteca viva, onde até o silêncio tem cheiro de sexo. Durante anos e anos permaneceu escondida numa sala sem janelas do prédio, tipo secreta, resguardando livros tidos como imorais, malditos e proibidos, que desnudam o sexo e a hipocrisia desde 1600 e alguma coisa – exemplares de 1637 adiante; todos também considerados difamatórios e ofensivos aos valores da Igreja e ao prestigio da Santa Fé.
- Garanto que são autores de baixo nível que inventaram histórias para difamar a Igreja Católica!
- Bem, isso eu não sei. Mas, dizem que os aspectos sociais nesses livros são tão evidentes que, se um católico se ofender, talvez seja porque sua fé não é tão forte assim.
- Tudo ao alcance do público?
- Por enquanto, apenas seletos acadêmicos têm acesso a eles, mesmo assim, com autorização especial para ter acesso a um livro fantasma que assombra o mundo cristão há mais de dois séculos.
- Uai, quais os riscos?
- Sei lá, falta de segurança, talvez. Imagino que mais tarde, quem sabe, esse acervo valioso estará disponível para o público em geral. Vai cair bem. Até porque é uma pista da leitura superficial a que a população se dedicava.
- Versões originais ou clandestinas?
- A maioria, sim. Embora claramente não fossem grandes artistas, principalmente os ilustradores eram desenhistas competentes, valorizando publicações de papéis satíricos. São raríssimas e formam um acervo proibido, oculto há séculos - a ambigüidade sexual é antiga, mas não sai da moda.
- Muitos livros?
- De acordo com as enciclopédias, cerca de dois mil livros raros de erotismo e pornografia que escaparam da fogueira ou da censura, recheado de sexo, intrigas e boa dose de humor.
- Santo Deus!...
- Para quem que ver imagens, a Biblioteca tem uma seleção democrática, atendendo o foco de diversos interesses. Do manjado Marquês de Sade que reúne dezenas de contos ilustrados em cenários inusitados a ilustradores anônimos que colocavam cenas de suas transas casuais com madames da corte.
- Pegavam pesado. Você não acha que são publicações exageradas demais em certos aspectos?

- Pode até ser. Não importa. O que importa é que a Biblioteca organizou uma verdadeira radiografia de pulsões e idiossincrasias do século 19. Não faltam edições de autores famosos, como do Marquês de Sadi e de outros “nomões”, cujas obras tematizam sexo, com todos os excessos da luxúria, bem escritos e bem ilustrados.
- Incrível!
- Durante o período pré-Revolução Francesa, a nobreza era alvo de sátiras e, com isso, muito material de cunho político circulou anonimamente pelas ruas de Paris. Entre eles o livro “pornô-palaciano” fartamente ilustrado: “Os futuros uterinos de Maria Antonieta, mulher de Luis XVI”, que exibe a imperatriz em picantes cenas de alcova que vivia discretos romances, mantidos sempre em segredo de Estado.
- Curuis!... Quem é o dono das histórias
- Anônimos. Mas, deixaram provas de que a literatura erótica sempre existiu.
- Permanece existindo. Não tem jeito, o ser humano é absurdamente sexista.
- Graças a Deus. Até eu, seduzido pelo tema, lancei uma revista de nus no Brasil, mas a censura proibiu sua circulação.
- Doideira. Qual o nome dela?
- “Nus”. Pelo menos imagino que foi a primeira experiência em lançar nas bancas de jornais e revistas um veículo de comunicação desse gênero. Não é aquele negócio de sair mostrando fotos adoidadas de mulheres em poses, sabe como é, conta uma história.
- Nu artístico ou erótico?
Mathier ri com malícia.
- Artístico. Na capa, a Vênus de Millus.
- Conta outra.
- Juro. Posso mostrar a você um exemplar.
- Quero ver, mocinho.
- Quando quiser.
- Mas, fique sabendo que não posaria nua de jeito nenhum, nem que a vaca tussa.
- Pena.








CIÚMES


7.

Num gesto de dúvida, Mathier:
- Bem, voltando ao assunto... a gente falava mesmo de quê?
- Dos bailinhos do CAAPE.
- Ah, sim. Mas não acontecem apenas ali.
- Aonde mais?
- Na região central os mais animados são os bailes dos clubes recreativos, como a Sexta Jovem do Minas Tenis ou o Sábado Dançante do Clube Belo Horizonte, todos para jovens, sem firulas ou formalidade. De vez em quando dou um pulo lá no Montanhês para sacudir o esqueleto; meu quebra-galho noturno quando a fome de dançar aperta.
Suzana espantada, pergunta incrédula:
- Valha-me Cristo, você é um frequentador de cabarés na Guaicurus?

- O quê?
E torce o nariz.
- Você faz isso? Aderiu ao comércio baixo da zona boêmia?
- Hein?
- Vai a esse lugar?
- Sim.
- Aquilo alí só produz putaria. Ai, que nojo!...
- Sim. Para quem não sabe é o templo mais freqüentado pela elite intelectual da boemia alterosa que lota suas mesas e discutem como mudar a vida cultural do país. O Montanhês é uma área universal, uma boate-estado, desmilitarizada, onde, comprende-se, as dançarinas dão os catamênios.
- Que isso?
- Ora, as regras.
- Meu Deus!... Lá, a bagunça é maior; cheio de mau elementos zanzando por aí.
O rapaz disfarça uma irritação para não se trair:

- Menos. Deixa de ser boba.
- Farrista. E não é? Quando Mathier, conhecido por jornalista chega ao local, a animação outras proporções.

- Nem tanto. Como todo quadrado, as dançarinas tem quadro lados iguais. O lado gostoso, o lado nutritivo, o lado prático e o lado saudável. E estão sempre prontas para um replay.

- Saliente!
- Eu, hein!
- Aquilo ali, dizem, é um lamaceiro só, um bordel, maison de rendez-vouz. Melhor dizendo, campo de butim para noitadas de vagabundos com as xexelentas.
- Cebesta! De onde tirou isso? A casa tem clima e jeito de baile do interior. Não tem maldade nenhuma; quase nada acontece. Proibido beijar na boca, ninguém fica alizando o outro; não há qualquer atmosfera de libidinagem. As meninas conversam enquanto dança. Se algum casal se forma, o convida a moça para sua mesa. Ai, sim, comibina a base e duração de seus relacionamentos e partem descendo as escadas até a rua Guaicurus, de onde escapam como coelhinhos desentocados e alegres para dentro de um taxi.
- Ora, pensei que... Puxa, beijo é bom de dar e de se ver também.
- Mas, no recinto, é proibido beijar.
- Tudo, arrumado o programa as mocinhas vão direto para a libertinagem.
- Sim, e daí? Dali... bem dali vão para quartos de hotéis nas proximidades da rodoviária. Ou sei lá onde.
- Ah, que horror!Que pobreza!
- Todo mundo fala que é uma casa de encontros que os homens armam sua tenda e vão logo tirar um psirico. Diga-me com quem andas e eu te direi quem és.
- Lorota. Lorota. É mais alta patente da cidade quando o assunto e se divertir dançando. Capitulou?
- Não rima. Mas é melhor acreditar, ‘né?
- Come-se bem, comida com ficha corrida.
- Ali!?...
- Um clube de dança com restaurante da melhor qualidade, só que localizado na zona boemia. Quê que tem?
Depois de um silencio abissal, Suzana:
- Pode? Você é maluco de freqüentar um lugar sujo assim. Aquilo ale é uma zona.
- Já disse, ali não é um bordel. Ali encontramos todo mundo dançando feliz da vida. As dançarinas recebem a gente super bem, um lugar especial.
- Grande coisa!... Falso glamour, movido a intereresseiras metidas a esnobes. Putas idiotas ou cafetinas?
- Êpa! Que ali é um templo da luxúria, não há como negar, mas luxuria moderada, tipo: bóra dançar, mulherada.

- Moderada!
- Pense-se ou diga-se o pior do Montanhês, ledo engano pois ali é uma casa clássica, tendo o céu como limite.
- Math, não venha com essa.
- Ora bolas, gosto de sair para dançar. Mas tenho limites. Claro que, à noite pega no baixo meretrício, o bicho pega, mas aí cada um na sua. Quem quiser mais do que dançar e chegar à via de fato que se consume noutra freguesia.
- Esse é irmão desse.
- Diga-se de passagem a casa, como quando constatei, observando os eventuais casais e o número solos (às vezes duetos) das moças a oferecer seus passos e suas formas na pista, observados, de uma escadria baixa e larga, como u auditório, pela macharia, não permite, entre cliente e fornecedor, pegações além dos limites do razoável, como numa casa de gafieira, que inibe beijo e outras manifestação públicas de, digamos, afeto. Ali se estabelecem as bases..

OS DONOS DA NOITE


Mathier, criativamente, responde de forma cifrada, só para perturbar mais ainda a amiga:
- Foco viço. Agregam formas ortogonais de cores fortes, regidas por geometria estrita para noites sem fim, noites eternas!
- Que isso, ficou maluco?
- Prosaico? Melhor dizendo: que delas, do delineamento de seus corpos, emana forças prodigiosas fazendo conexão total com o frescor de belas e dançarinas que nos mostram, através da uma linguagem física seu trabalho em perfeito domínio do som e o corpo em circulo; folgo em afirmar que representam de modo soberbo, as dançarinas francesas empregam também; vibram intensas no salão com a pulsação veemente de uma mulher no cio. Minha querida, é a celebração da dança! Basta nos exposmos à elas, sem reticências, para que começamos a agir.
Isso pode parecer conversa fiada, mas é o que comprova a extraordinária mostra das dançarinas do Montanhês, escolhidas a dedo.
- Que apologia mais barata, Math! Nem parece...
- Sem critica.
- Círculo, rodando. Rostinhos colados com elas! É mesmo um poeta para lá de fanfarrão!
- Entenda como achar melhor. Rimbaud dizia de seu poeta: eu é um outro.
-Rimbaud também gostava de danção com suas “mulheres dos outros”?
- Ah, Suzana. A única coisa que posso dizer é que são mestras dançarinas e sua estranha leveza do ser que nos contaminam os passos. Com elas perdemos a inibição e a encanação com o corpo.

- Ah, sei.
- Parece pouco, e é mesmo. Reconheço que outros querem mais, eu não.
- Chiiiii!
- Ah, Suzana, cai na real. Mesmo se fosse, os bordeis sempre foram verdadeiras escolas do amor e do sexo para a rapaziada, como se fossem uma especial aula de educação sexual para iniciantes.
- Ah, claro! Me responda uma pergunta não quer calar, paga alguma para transar?
- Jamais paguei por uma mulher. Nessa parte, nunca entendi que satisfação só existe se não existe o prazer da conquista. Detesto essa idéia de mulher coisificada.
- Imagino. Seduzindo moças honestas cá fora e sendo seduzido por libertinas na zona. Apenas se beneficiar deles, caso contrário, um tiro pela culatra. Tai, eu fico curiosa com toda essa tramóia intelectual.
- Bobagens.
- Ah, esses homens!... Não emendam, estão sempre metidos em rolo com essas piranhas!
- Nem todos. Eu, por exemplo, da boemia só me interessa as pessoas. É nisso que acreditamos.
- Pago para ver. São mulheres da noite.
- Sim. Isso não quer dizer...
Suzana com um olhar de cobiça.
- Tem medo delas se enrabichar por você, ‘né?
- Vira essa boca para lá.
- Tudo bem. Tudo bem. Posso fazer outra pergunta?
- Sim.
- Por curiosidade, claro, como é esse lugar onde as mulheres recebem grana para dançar?
- Interessou?
- Folclore apenas. O povo acrescenta, mas não inventa.
- Em volta da grande pista de dança, sentam-se uma dezena mulheres de perna cruzada, olhando para fregueses de ternos amontoados nas mesas bebendo, fumando... Boa parte deles vão ali só para olhar, divertir...
- E como se vestem?
- Sobriamente, sem muito espalhafato. Normalmente um vestido justo tomara que caia e dança rebolando profissionalmente.
- Bem no meio da zona, ‘né?
- Sim. Lá mesmo.
Depois de uma gargalhada, Suzana:
- Se bobear vou lá só para conhecer, me leva
- Pirou?
- Estou brincando, sô!
- Pois, fica fria, vou lá para dançar, algum problema?
- Não. Nenhum.
E com um olhar de triunfo, o moço:
- Está para nascer uma mulher para empatar minha dança. Gosto de rodar no salão com uma dama.
- Você é fogo, hein!...Pensa que não sei que lá só tem mulher à-toa...
- Entenda, mulher.
- Sem-vergonha, vai lá para outra coisa também?
- Corta essa.
- Acredito, viu? Lugar sujo e mal-frequentado. Um antro de prostitutas, cafetões, pederastas, bandidos... Gente da pior espécie.
- Encasqueta não!... O Zé Renato tem DNA próprio, não é sua praia.
Por pouco ela não caiu numa gargalhada, mas afirma com zombaria:
- Pelo jeito é dele o guru da night e do dia.
- Caçoa não, Suzana. Todo homem já deu suas aprontadas e tem seus segredos.
Mas ele não me acompanha nessas aventuras e posso afiançar-lhe que não há romances secretos de José Renato. E mais, é tão minha amiga que não me vejo no direito de sonegar nenhuma informação a esse respeito.
- Sei. Pelo que já conheço da figura, o outro sexo ele traz nacisamente em si mesmo.
- Também não precisa banalizar. Acredite, o Zé sempre foi um homem de hábitos comedidos, não só pelo temperamento, mas também pela sua condição de professor emérito, não é chegado num arrasta-pé, nunca foi meu parceiro de noitadas pela cidade.


- Eu, heim!... Estou pouco me lixando.
- E depois, Suzana, ele não é chegado nesse tipo de atividade de andar pela noite atrás de divertimento. Ele é um homem bem visível. Pelo que vejo, não tem a menor queda por vagabundas. É um cara bem centrado.
- E você, tem?
- Já disse, vou ali só para dançar e me distrair. Gosto de muito de boa música e lá tem; são duas extraordinárias orquestras com um repertório eclético, divertido e, o mais importante, dançante; um brilho na correria noturna. Ali é dançar, dançar. E e dar um tempo nessa vida de correria. É muita gente, mas muito prazeroso.

Risos.
- Antipático. Se tem uma, duas, três, em especial, com quem gostar de dançar, a dança não é só movimento, é envolvimento. Pode crer.
- Ah, Suzana.
- E não é? Aposto que vive se desmanchando por essas mucréias. Me engana que eu gosto.
- Verdade. A melodia me eleva a alma, tanto é que se toca uma dança, eu danço; se toca uma missa, eu comungo. Coisa que só quem adora de verdade a dança pode avaliar.

- Deixa para lá, cara. Sem segundas intenções, só curiosidade: é verdade que nesse templo de breguice as mulheres cobram para dançar?
- Sim. Quer saber?
- So perguntei por perguntar
- Então
- Me explica isso direito; só curiosidade mesmo.
- Por minutos. Tem um fiscal que perfura um cartão marcando seu tempo na pista de danças. Ganham da casa essa participação.
- Só. Não fazem programa?
- Ao contrário das outras casas do gênero, no Montanhês não há taxas para saídas com os clientes. As moças ganham para dançar. Em troca ganham um ambiente supostamente seguro para seduzir e nogociar. Descobrindo novos desafios. É por isso que das dançarinas do Montanhês tem que ser muito diferenciadas, é preciso atender paladares muito distintos.

- E a pista de dança?
- Bonita. Imponente. Uma grande arena circular, toda espelhada, com muitos globos no teto que refletem fachos de luzes coloridas projetadas por canhões de luz.
- Nossa! – exclama Suzana admirada.
- Sem dúvida nenhuma, é a maior e mais bem equipada boate da cidade. Mas os que imaginam que por trás do néon cinético da fachada existe um anto dionisíaco de imoralidade estão enganados.
- Assanhamento nenhum pode. Ali, tem de tudo, claro. Até homens sozinhos, geralmente senhores, que espalham-se pelas mesas enquanto se dedicam à principal atividade dessa e de outras casas do gênero: olhar. Seus funcionários parecem ter orgulho até da limpeza: se um copo cerveja é derrubado no piso em pouco tempo um faxineiro surge para limpar o chão, trocando até a tolha da mesa.

- Vale a pena?
- Ora, se vale!. Elas entendem do riscado, gente boa. Dançam muito bem, tanto que, se tivesse dinheiro sobrando, freqüentaria mais a casa. Vou dançar ali quando fico com saudade de dançar apenas, apenas.
- Está brincando.
- Gosto cuidar de plantas, ouvir música, tomar café, apreciar boa cerveja e sair para dançar, quando tenho grana. Não penso em juntar, não quero ficar rico, porque sei que quando multiplicamos nossos bens, corremos o risco de reduzir nossos valores.

- Sério?
- Adoro divertir na noite.
- Tanto assim?
- Mas não faço disso o objetivo principal na vida, como muitos de minha idade que se entregam à devassidão.
- Ó, isso é que é consciência!
- No Montanhês, além do prazer de ouvir boa música, apuramos nossos passos na dança de salão. É um exercício que faz bem ao corpo, à alma e ao cérebro. De quebra, estabiliza o humor.
- Perai!... Então não vai lá só p’ra dançar?
- Só.
- Duvideodó.
- Juro.
- Aposto que, enfeitiçado pelo clima, desfruta de um aconchego na cama dessas lambisgóias a torto e a direito!
- Você quando põe uma coisa na cabeça...
E emendando logo:
- Escuta aqui, não me deito com elas, sério. Fico na minha, sem afeição nenhuma.
- Embroma não, mocinho. Nem um sarrinho?
- Por Deus. Gosto é da farra, da festa, da animação.
- Na zona?
- Quê que tem?
- Não acha que é muita extravagância?
- Nada me fascina mais do que uma noite alegre e divertida, mesmo que seja lá.
Suzana com expressão de estômago revirado:
- Iac... Deve ser uma espelunca cheia de pulgas! Dá nojo.
- Nojo!... Nojo de quê? O lugar é bem asseado e as mulheres limpinhas, cheirosas...
Suzana inspira, respira, inspira, respira.
- Cheirosas!... Aposto que usam esses magrifes e cabochás falsificados que vendem por aí.
- Pode até ser. No Brasil falsificam até remédio p’ra consciência pesada. Mas, são cheirosinhas, sim.
- Vou acreditar nessa história, viu?
- Melhor e mais razoável.
- Não sei. Mas, sei que quando se pode um homem encontrar parceiras em lugares mais decentes, não precisa ele de ir às casas de tolerância, onde é possível pegar doenças venéreas com muito mais facilidade.
- Ora, Suzana!...
- Ora o quê, vocês homens....
- Tempero pronto, nem pensar. Pode ser mesmo indigesto. Estou cansado de saber que se bobear o bicho pega. Tenho juízo, nem sou promíscuo. Não arrisco minha saúde nem minha vida naquele lugar. Eu sei que aquilo ali é um verdadeiro campo minado.
- De qualquer forma está sempre atrás de um rabo de saia, não é mesmo? Faz parte de seu currículo de conquistador , de pegador – caçoa Suzana mais aliviada.
- Nada a ver. Procuro mais numa mulher.
- Será?
- Não faço sexo por sexo. Nunca.
- Surpresa.
- Para mim, sexo não é só um encontro de dois órgãos sexuais, é um encontro de duas pessas inteiras.
- Olha, o rapazinho tem mais juízo do que imaginava!... Ponto para você.
- Gracias. Vamos parar com isso, porque não vou falar mais nada desse assunto, boca fechada.


- Juízo, hein? Senão pode entrar numa fria.
- Tá legal. Tenho de sobra.

- Acabando com essa conversa fiada, além dos clubes, da zona boêmia, onde mais os homens se divertem correndo atrás das raparigas?
O moço ri.
- Em Beagá a vida noturna é bem agitada e a paquera se espalha pela cidade. Podemos não ter uma vida noturna como a do Rio, mas dá p’ra sair de casa e divertir, curtir bem a nigth. Paquera para todos os gostos, até porque, quando noite cai, o charme do mineiro sobe.
- Onde começa a via-sacra?
- Bem. O ponto de encontro para as mais diversas tribos é o Maletão, considerado o lugar mais descolado da Capital, um fervor fuçando e tecendo memória. É lugar de todas as mentes e culturas, até da intelectualidade, mas uma intelectualidade irreverente, que mistura artistas, escritores, políticos e gente comum, e não aquela sisuda e hermética de outros templos da boemia belo-horizontina.
Situado entre vários extremos, a cena noturna de Belo horizonte nos ano 1980 e 90 foi memóral. On-line

Mathier em tom de chacota:
- Saio quase toda noite. Faço minha via sacra.
- Tipo cachorrão, farejando tudo, urinando em todo poste na sua frente.
- Uai, acha que fico marcando território.
- E ai, que cara feia é essa?
- Brincadeira!

- Verdade. Os cães deixam mensagens em forma de odor. O xixi no poste é um recado para outros cães sobre sua presença.
- Ah, Suzana, só você mesmo!
- Não sabia que a frequencia com que um cão passa por um determinado lugar, é para difundir sua saúde sexual e seu interesse em copular?
- Essa para mim é novidade.
- Falo com base científica. O olfato ultrassensivel é o principal sentido canino. Come de tudo. E não engorda.
- Inteligência canina, aprendi mais uma.
- Numa boa, rapaz. Numa boa.

Nas galerias do prédio tem diversão para todos os gostos e tudo que alguém possa imaginar: botecos que servem de maratona etílico-gastronômica, restaurantes com boa comida, lá até barres dos intelectuais, , principalmente, virou febre entre os fashionistas, arqueitetos artistas de teatro ou cinema. Tem o bar do Lucas e o Lua Nova para a geração cabeça-feita viciada em biriba, no Centro, atraindo a freguesia com cardápio repleto de tira-gosto. Subindo a escada rolante encontramos as famosas, conhecidas por inferninhos, onde não entram moças donzelas, porque ali tudo pulula. Para elas tem o Tip Top, o Chez Bastião, a Adega 1300, o Bierhaus, o Monjolo, o Tom Marrom... que incluem desde os boêmios de plantão, até estudantes universitários e famílias inteiras, da avó aos netos – lugares com boa chance para enturmar, sentir o cheiro de gente bonita, beber cerveja gelada e virar a madrugada em conversas animadas, sobretudo, de encontros que podem engatar namoro. Animação. Paquera para todos. Essas novas boates eu acho besta. A Belo Horizonte que eu gosto é a noturna dos amigos, da boemia lá no Maletão.

- Namoro?
- Isso mesmo. Mais tarde o clima fica mais quente e festivo, porque, parece que, de madrugada, as pessoas ficam mais receptivas, sensíveis, posso afiançar.

- Muito certo. Pelo que vejo, paquera pode acontecer até num cafezinho.
- Também. Só depende da química.
- Eu é que não conheço nenhum deles!
- Não sabe o que está perdendo. São verdadeiros chamarizes para o pecado da gula ou para se render à luxuria de ambientes favoráveis à paquera com atendimento nota 10. Diversão em estilo universal.
- Onde fica esse paraíso?
- Quase todas fervem na Savassi; a maior concentração de gatinhas cheias de charme por metro quadrado da cidade para beber, fuxicar e consumir. Um show!... Lotada de barzinhos, carros e gente bonita o ano todo fazendo em Beagá o calor do inverno e o frescor do verão; o negócio é dar um giro por aí... lugares perfeitos para quem gosta de badalação, a noite promete porque a paquera é solta – troca de olhar, palavras, envio de bilhetes, sinais; tudo para tentar seduzir alguém para um namorozinho, mesmo que de uma noite só.

- Vixe!
- Entretenimento é a marca da região da Savassi, boates também fazem parte do variado cardápio oferecido aos freqüentadores – ai por essas casas uma enorme diversidade de restaurantes para agradar diferentes gostos da moçada que se esbalda de bebidas e tira gostos. Beagá é a Capital nacional dos bares para homem nenhum botar defeito, a “mulézada” bonita é farta. Mineiro jovem tem preocupação de vida e morte, somos todos imortais – insinua Mathier.

- Legal. Estou impressionadíssima com Belo Horizonte, não sabia que era tão agitada assim.
- Bons lugares não faltam para curtir a night e conhecer pessoas interessantes em Beagá, provando que estamos longe de ser uma cidade provinciana, como dizem por aí. Costumo dizer os barzinhos de Beagá são como esquina onde todas as tribos se encontram, animando a situação. Ou seja, tudo o que faz da Capital uma cidade contemporânea e, também, motivo de orgulho para a galera mineira. A cidade está entrando no rol das capitais mais influentes do mundo no quesito barzinho.
- Grande coisa!... Ah, minto, de vez em quando vamos à Camponesa.
- Naquele esquema careta de jantarzinho comemorativo, família perfeitinha?

- É.
- Em outros tempos foi a bola da vez, estava com tudo. Agora a casa anda meio démodé, antigona.
- Acha? Mas, na cabeça antiguinha de sua amiga aqui, ali é um restaurante animado com música ao vivo.
- Micha. Nos barzinhos a combinação é melhor: cerveja gelada, petisco, música, gente bonita e muita diversão pela noite a dentro, principalmente, sexta-feira e sábado, dias especiais para beber, comer e se mexer. Ali a gente curte momentos de alegria, encontra novos amigos; rola música, rola interatividade e é óbvio que rola uns rolinhos também; descontração pura. O álcool anda mais solto.
- Haja cerveja.
- Quem já viveu suas noitadas sabe o quanto é arriscado abusar da bebida e, com um dose nas veias, cai em tentações de auto-confiança. Melhor beber menos principalmente se for dirigir.
- É. E as boates?
- Prefiro os bailinhos nos clubes ou os barzinhos da cidade. Mas, de vez em quando, para troca de energia, pinto na Old Face, na Caverna, na People... reduto dos playbois mais abonados nas altas baladas. São as mais “moderninhas” onde rola a balada com altos agitos bombados aos acordes dos sensuais de um rock, twist e muito iê-iê-iê a noite toda; os mais loucos agitos superbombados - convite irrecusável para cair na gandaia; não há festinha que não rola. E para quem gosta de clima mais maneiro, boa pedida é ir ao aconchegante Top-Bar, o point predileto dos mais românticos. Lá o som é outro, a harmonia pega mais leve e a atmosfera envolve mais; p’ra lá de romântico... Especialmente para um momento especial e curtir um clima ao som do teclado de um piano com muitos beijos.
- Acertou em cheio. Adoro piano.
- Sem dúvida, a casa é bem atraente. Ali, a noite promete bons drinks, um vista maravilhosa e um friozinho, a qualquer época, que dá mais vontade de dançar e ficar bem pertinho da pessoa amada. Além desse ambiente, da varanda sob a luz do luar, podemos contemplar a vastidão da cidade num cenário bonito, uma vista de tirar o fôlego e um convite à contemplação ao lado de boas companhias e bons vinhos. O que nos convida a beijar porque , num instante, nos damos conta de quão belo é esse mundo e de como a vida pode realmente ser bela.
- ... ... ...
- Oiiiii! Acorda!... Em que pensa?
- Nada, é que... Despertou-me a curiosidade para conhecer a casa.
- Top-Bar?
- Sim.
- Na cobertura do prédio que fica na rua Tamoios com Afonso Pena, muito legal.
- Ah!... Um dia, quem sabe.
- Chama o homem.
- Quem?
- O Zé, claro. Meu amigo, que por sinal é seu marido. São meus convidados. Vão amar o lugar.
A moça perturba-se. O rapaz percebe e logo pergunta:
- Por que você ficou com essa carinha triste.
- Queria que tivesse como? Rindo de satisfação?
- E por que não?
Suzana dá de ombros e responde com certa sisudez:
- Acho essa ironia péssima.
- Qual o problema, mulher?
- Que coisa!... Pare. Chega.

- Não?
- Bom exemplo para cima de mim! Ahhh, faça-me o favor.

- Por que não?
- Esse assunto de novo? Não fale mais dele, já tinha esquecido esse grosso. Meu marido que não me quer mais! Não mistura as coisas e vamos engatar outro papo menos careta.
- Só quero ajudar.
- Eu odeio, já disse. Brincadeira mais sem graça, sem humor. Não gosto de ouvir, troca o disco, que já deve estar furando.



Mathier deteve-se de repente.
- Desculpe, desculpe, não tive nenhuma intenção... Liberta-se Suzana da culpa com gélida indiferença


- Caramba, pára de forçar a barra. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.


- Forçando, eu?
- Ai, meu Deus!
- Que cara feia é essa?
- Me poupe. O Zé de novo?
- De novo, falei besteira?
- Eu, hein, nem pensar.
- Meu Deus!
- Piada, ‘né Math, piada!
E o rapaz mantendo a ironia:
- A vida é mesmo uma piada. Uai, agora ele é o patinho feio?
- Ele faz tantas vezes a mesma piada que acaba sendo engraçado.
- Pilhérico?
- Entenda como quiser – dispara a moça.
- Não me diga?
- Já disse, não me importa mais. Seu amigo é carta fora do baralho.
- Estou triste com essa reviravolta - queixa.
- Problema seu.
- Ora... Ora... Só quero consertar as coisas.
- Para seu governo, posso até me reconciliar com ele, mas só aqui há 200 anos, com um pouco sorte, quem sabe.
- Você me Vamos deixa esse papo baixo-astral de lado
faria uma enorma favor se mudasse de assunto. Ele que vá para os quintos do inferno e você vai chatear a vovózinha, vai!
- Tudo bem, recado dado.
- Viaja não, sô!... Depois de tudo que ele vem fazendo comigo, muito obrigado. Acabou o encanto.
- Posso dar uma forcinha.
- Mui amigo!... Cai na real, Math. Seu amiguinho já desapareceu no ralo da minha história. Vamos acabar por aqui, esse assunto não me interessa.

- Pô!
- Não vou falar sobre isso, nem a pau. Se insistir, ó, fico de mal com você, de verdade. Para de ficar pegando no meu pé com essa assunto.
- Tudo bem, querida. Também não vou ficar repetindo, repetindo... Prometo.Já não está aqui quem falou, mas não não vai ficar com essa cara de enterro, amarrada, a noite inteira, vai?
- Psssiu... não qeuro nem pensar nisso. Então muda o disco.

- Ridículo. Tem mais? – desconversa a moça que puxava uma tragada o cigarro.
- O quê? – pergunta o rapaz depois de um suspiro para restabelecer o humor.
- Quero saber mais lugar de paquera onde a macacada reúne para caçar - Papo cabeça

- Não sou uma referencia da noite de BH e não tenho interesse em sê-lo.
- Ah, me conta, vai.
- Vamos ver. Para os estudantes que querem moçoilas mais simples sem ter que pagar nem um Martini o “barato” é ir ao footing no largo da Igreja São José. Acontece aos domingos. Ali o affair é com as meninas que trabalham em casa de família.
- Como é que é?
- Não sabia?
- Para variar, não.
- Nada do que pensou, viu?
- Que bonito, hein!
- Hummmm...
- La vem você falando besteira de novo.
- Bobinha.
- Coisa mais escroque, cara! Nem acredito que vive pegando mulheres lá também
- Nunca.
- Sem graça, mentiroso.
- Ah, não!...
- É falando que os mentirosos se entregam, sabia?
- Vem, não.

- Desmentir o indesmentível é coisa de conquistador barato, sabia?
Mathier, com um sorriso bobo estampado na cara,
não sabia o que dizer. Ela:
- Lá também é sua praia, ‘né?
- Ora, Suzana.
- Engraçado! Vocês homens, hein!...
- Para bem dizer a verdade, nunca fui lá. Só ouço falar.
- Não cola. Conta outra, mocinho..
- Preciso jurar?
- Marmota, tá que tá, hein? Espoleta, nem elas escapam?
- Minha praia é outra, já disse.
- Engraçadinho. Desculpa mais esfarrapada! Uma hora vai entrar numa “roubada”, espere para ver.
- Juro.
- De lá ao parque Municipal é um pulo. Meninas, tremei! Aposto que todos os dias, o insciável e priápico galã Mathier sai de vara em riste para pegar e dar um um tranco nas piranhas no Parque Municipal
- Ora, Suzana, não brinca.

-* O fenômeno comportadinho e galinha ao mesmo tempo ronda por aí no seu pedaço!
- Não brinca. Mulher é mesmo um trem muito doido!

- Saliente como é, está sempre de plantão para o que der e vier... Pelo jeito goza do maior cartaz entre elas...
- Juro por Deus!
- De dedos cruzados, ‘né?
- Você também, hein!
- Vai negar? Vai?
- Nego. Já disse, meu “rolé” é outro.
- Só me faltava essa!
- Ô, Suzana!...
- O homem é mesmo muito besta, sabia? Isso que chamo de metáfora do mal.
- É?
- Muito feia essa parte. Melhor pular.
- Melhor mesmo.
- Há... Há... Mas, vou morrer de tanto rir quando encontrar uma moça enrabichada por você que ponha fim nessa boa vida de boemia!
- Putsgrila!...
- Eu bem que avisei. Não perde por esperar.
O jovem franze a testa.
- Por favor, não me rogue praga.
- É o que acontece com todo homem muito assanhado.
- Isola. Não caio nessa.
- Pelo que a gente vê, os que fogem do casamento feito diabo da cruz são os que se amarram mais cedo – diverte-se a moça.
- Cascata.
Que que eu posso dizer

- Abre o olho, Math. Se não sabe, fique sabendo que as mulheres são articulosas, planejam detalhes, pensam lá na frente e dão a volta ao mundo para alcançar o que desejam. Se bobear, morde a isca.
- Que isso, jacaré, que isso?
- Há... Há... Vai se dá mal, cara. Um descuidozinho e, bumba, é um laço!
Suzana quis falar mais, ele interfere:
- Bem!... Bem!... Não é melhor virar o disco?
A moça insiste:
- Não se sente só nessa multidão de amores? Viver só de test-drive não garantia de futuro, viu.
- Tem cada teoria, hein? Só porque sou louco por mulheres acha que sou portador de inválido de sentimento. Não é isso.


- Sem brincadeira, essa escolhinha de ficar só paquerando, não dá. Está na hora de crescer, não acha?
- Crescer?
- Um dia espera encontrar alguém?
- Só.
- Não pensa casar, ter filhos ou vai ficar o resto da vida nessas aventuras de mulherengo?
Mathier responde com um sorriso no rosto, brincando:
- Bom, vai. A hora que você quiser, loira.
- Bobo, estou falando sério.
- Eu também.
- Tá, tá, tá... Não acha que já chegou a hora disso e não viver separado de sua metade ideal?

- Achar o tampo de minha panela!... Há... Há... De acordo com minha mãe, tenho vocação para solteirice e jamais deixar de ser um eterno pretendente...
- Math!...
- Vou me divertindo com as erradas até encontrar a pessoa certa. As pessoas casam cedo por falta de experiência ou tarde por desespero.
- Entendi a direta, viu?


O fascismo italiano, por exemplo, desejoso de braços para ampliar e fortalecer a nação, instituiu uma imposto sobre o celibato: não quer casar? Paga multa. Alguns dirão que é natural que seja assim: o casamento serve ao interesse da especie; para que ela continue existindo, é necessário que a gente se reproduza ou, no mínimo, adote formas de divisão do trabalho que facilitava a sobrevivência. Voce na casou? Sorte sua, fica firme e livre.
Não desvia o assunto.
- Casamento não é uma coisa que a gente resolve de uma hora para a outra.
- Mesmo com tantas paixões às vezes na bate carência?
- Onde quer chegar?

- Há... Há... digo eu, posso até entender, mas...

- Pessoas quando procuram seus parceiros, estão interessadas em alguém que não apenas as completem, mas também sejam capazes de preencher seus défits. Pensa ou não?
- Mesmo casado com a literatura, penso. Sempre preguntei aos deuses quando vou encontrar minha outra metade e eles, sem me levar a sério, nunca me responderam. Portanto, imagino que a flexa do cupido vai me acertar, um dia, pode crer. Mas, por enquanto, que seja como eles querem.
- E viva a solteirice!
- De bem com a vida, solteiros de todas as idades aproveitam a liberdade para se dedicar à carreira e à diversão.

Risos.
- Desculpa de aleijado é muleta.
- Ô, Zuzana, não diga isso.
- Ah!... Não pensa encarar um casamento de verdade.

- Não é isso. Olha, o que vejo por aí acontecer com meu amigos que cruzam com sua cara metade muito cedo, é uma merda. A partir desse esbarrão... o relacionamento entra numa aspiral de questionamentos e passa a se confrontar com o que ele havia sido durante a vida inteira – explica o amigo. – ele não aceita sua condição de apaixonado e começa a projetar nela. Quando ele pega uma chamada dela na secretária eletrônica, mas não atende direito, ele se vê. Porque é assim que ele aje com as outras mulheres.
Ela é uma carioca, Ele um paulista da noite. É uma comédia que observa as relações humanas, a impossibilidade de se permitr gostar do outro,
O ciúme corrói totalmente
Disse que nuna viu tanto mulher bonita dando em cima. Se a garota tem 20, ele diz que tem 28, se tem 18, ele passa a ter 26
E aí? Nessas altura da vida, nunca teve vontade de casar, ter filhos?
Até que tem, só que está muito complicado. Diz que a mulherada está fácil demias. Mal se conehcem e já estão transando.
Papo vai, papo vem, descobrimos

Ele era um Bon Vivant e enlouquece. Passa a ver imagens dela em situações. O filme invade o inconsciente de um sedutor.
- no inicio trabalheir soziinho, queria me inserir na história, porque os roamances te dão essa posibilidade. O autro geralmente tem apego, não aceitam mudanças. Mas o Sabino chegou para entregar a essência.

- Viver a fantasia é gostoso, apaixonante, faz bem ao ego. Só que , como toda paixão, tem prazo de validade e, no fechar da cortina, pode trazer mágoas, dores e muitas frustrações, mesmo sem estabelecer laços amorosos duradouros.

- Sei disso, claro que sei. Claro que penso em casar e construir uma historia de vida familiar e não passagens. Vai chegar a hora de baixar a cortina, sim. Por isso não dispenso um romance com princípio, meio e fim, mesmo sabendo que depois, se não der certo, costuma dar uma mão-de-obra danada para desmanchar o namoro. Sou gato escaldado – afirma o rapaz.
- Ó, meu Deus!...
- Numa boa. Quando sinto que não vai dar papo legal tiro meu time de campo. Só me contento com o melhor, já dizia Oscar Wilde.
- Conheço essa história. É velha, os homens quando não estão interessados são craques em despistar e sair fora.
- Tenho jogo de cintura para desfazer a fantasia sem deixar traumas. Ando com curativos coloridos no bolso para consertar um eventual coração partido.
- Cretino.
- Não é bem assim.
Quem pega todo mundo acaba pegando o pior – avisa Suzana.

- Não ponho minha mão no fogo.
- Mesmo?


- Vou ser sincero: não sei sei ser de outro jeito,
- Ô, falo sério! Pensa ou não pensa?
- Claro, um dia. Como qualquer cristão, quero ser muito feliz ao lado de um grande amor, curtir afeto pela mulher e desejo pela fêmea. Até porque, essa idéia de colocar um novo habitante nesse planeta educado por mim, dando opiniões e dirigindo automóveis é mesmo muito bacana.
- Beleza. A gente não ama com os olhos, com eles a gente deseja. O amor vem com a convivência, vem de outras fontes. Essa é a minha opinião.
- Lógico. No fundo, no fundo todo mundo quer ter seu clã, gerar filhos e perpetuar a espécie – paternidade é enxergar além do presente. Não renuncio, por um instante sequer, a intenção de estabelecer a mais elevada e pura vida familiar. Casar mesmo, de papel passado. Na igreja, no cartório, tudo que a gente tem direito... ou juntar os panos, o que está começando a ser comum no Brasil.
- Casar ou brincar de casinha?
- Que isso, menina. Palavra de Don Juan, o dia que decidir a me amarrar a alguém serei um aposentado da boemia por vontade própria, assim posso agir com mais cuidado para sair dessa com lucro.
Investimento de risco.

- Sei. E daqueles que pensa o casamento como investimento de risco.
- E não é.

- . O último que fosse se amarrar em alguém.

- Falando sério mesmo, a idéia de um casal de um belo dia resolver juntar os trapos e ir morar numa mesma casa já não novidade pra ninguém. Afinal, com a permissividade das relações contemporâneas, aliada às dificuldades que envolvem a formalização de um casamento, muitos preferem simplesmente unir as escovas de dente na surdina, sem maios alardes.
Pela carga de tradição e formalidade, o casamento religioso também costuma ser visto por muito com um ritual careta.
As música, as palavras dita pelos padres e a representação da cerimônio podem soar como mera formalidade. Sinto que nossa geração quer bvuscar o mais cômido. E assumir um casamento no papel possui mil implicações. Quer se poupar disso.
é uma escolha madura e evita de o casal se esquivar a cada dificuldade. A formalização cria uma segurança que pode se transformar na idéia de posse. Com isso, as pessoas passam a cuidar menos da relação e se negam a modificar seus comportamentos.
Morar junto pode dar novo fôlego ao próprio casamento. O que as pessoas precisam é de encontra sua maneira singular nessa construção, ao invés de simplesmente optar pelo padrão vigente – defende.
O sonho não acabou.
A gente estabeleceu regras, aprende a respeitar o outro e vem dando certo

- Pago para ver. Mas, se acontecer me convida que vou para a festa.
- Festa não combina muito comigo. Gastar milhares de cruzeiros em um casamento é ridículo e nunca foi meu sonho. Acho que nunca faria isso – quero casar muito discretamente no civil.
- Quero ver.
- Um dia, encontrarei minha cara metade. Ai, sim vou desenvolver uma bela dependência amorosa dessa pessoa. E pode até durar para sempre. Mas, ainda não prefiro fechar datas. A hora chega para todo mundo, calma. Mas, antes...
- Vai nessa, vai; a vida sexual é oscilante, pode acabar sozinho.
- Não faço a menor idéia
- Me fale, tem alguma eleita para o futuro?
- Preciso dizer?
- Não. Desculpe-me, perguntei por perguntar.
- Namoro firme, não. Estou dando um tempo. Para que pressa, eles acabem vindo mesmo. Confio no meu taco.
- Convencido.
- Ai, descupe-me, falei bobagem! Tudo, menos ficar sozinho

- Precisa mais?
- Descupe-me. Confesso que ainda não sou exatamente hábil em selecionar uma jovem adequada a este objetivo, que cumpra o protótipo de uma boa mãe, uma boa dona de casa, aquele modelo princesinha do lar.
- Está vendo!... Está vendo!...
- Vendo o quê?
- Xeque-mate, matei! Machista.
- ...
- Na hora de casar todo homem corre logo atrás das mocinhas de família, as mais purinhas. Daquelas esposas que chegam em casa cansadas, mas ainda preparam o jantar e se desdobram em preocupações com o maridinho. Ora, Math!...
- Falei isso de gozação, não percebeu?
Suzana leva o dedo indicador da mão direita ao olho esquerdo, dizendo:
- Este é irmão deste!...
- O fato é que ainda me pergunto quem sou, p’ra aonde vou e como articular a passagem possível entre o pessoal e o coletivo. Talvez, por isso ainda tomo todo cuidado para não me envolver com pessoas tão especiais assim.
- Desculpa esfarrapada não engana ninguém, viu?
- Já disse: falei de gozação...
- Não adianta querer consertar. Na paixão, idealizamos a outra pessoa e projetamos nela uma imagem que possuímos internamente. Isso é vero – ilustra Suzana em tom de ironia.
- Tudo bem. Tudo bem. Que cozinhe para seu maridão, mas que também ele cozinhe para ela. E estão sempre, olhos nos olhos, jantando à luz de velas. Certo?
- Ó, vocês homens são todos folgados! Ficam de galho em galho porque não querem ter uma árvore inteira. Cuidado, heim! A vida na terra é provisória e passageira...
Mathier ri e declara:
- Mas, o dia que encontrar a minha alma gêmea o coração vai falar mais alto. Serei leal e fiel a ela, confie em mim. Por isso quero preparar uma casa cheia de livros na estante e muitos quadros nas paredes para constituir uma família bem ligada à cultura. Entende?
- Parabéns. Assim, você mostra que tem um pouco de juízo, mesmo partindo do múltiplo para chegar ao uno.
- Suzana, tudo no seu tempo. Tudo.
- Sei. Homem viajado como você, leva uma vida de boemia, vivendo seu tempo, pegando geral.
- Só.






8. até 170

O rapaz, curioso:
- E aí, o que achou do meu discurso?
- Tem nexo em alguns pontos. Mas, noutros...
- Noutros?
- Bobagens. Quer saber: no fundo, no fundo é um bom moço. Charmoso, culto, bem-educado, romântico e tem um papo legal. E por cima carismático. Quer mais?
- Bondade sua.
- Sinto até um pouco de inveja, no bom sentido, é claro, da vida que leva: uma vida cheia de coisas boas p’ra fazer e pouca preocupação com o resto.
- E por que não faz o mesmo, mocinha?
- Seria uma boa, Math, minha vida anda muito sem tempero. Tanto que, ultimamente, só tenho acumulado know-how de gata-borralheira.
Risos.
- Como quem sonha com seu príncipe encantado?
- Quem sabe? O Zé que tenho em casa é aquela murrinha. Quero sair de casa, divertir, ver gente bem transada... E não mais ficar guardando a vida p’ra depois.
- Põe ele p’ra frente.
- Não conhece a figura.
- É... Bem, agora que sabe tudo de mim, fale de você.
- Quer saber o quê?
- De sua vida, de seus desejos.
- Secretos?
- Pode ser.
- Fica para outro dia.
- Hoje.
- Vou pensar.
- Hoje
- Hoje, não posso.
- Tudo bem. Tudo bem.
Bebendo um gole de cerveja, Mathier quis saber:
- Pelo menos sai de vez em quando para um cineminha?
- Antes de casar, ia sempre. Depois, muito raramente, o Zé me levava ao Cine Metrópole, aqui perto. Agora, com o pimpolho, sabe como é, vivo sob o toque de recolher, sempre que posso enfiada dentro de casa. Ele é a minha loucura. Gosto mesmo de ficar em casa com a família, onde me sinto segura e recarrego as energias. Mãe mais presente, sabe como é.
- Ai, Suzana!

A moça fala com um longo sorriso nos lábios do poder de um filho:
- Me perdoa a corujice. Quase que só tenho olhos para ele desde que nasceu. Curto em casa a chuva, um bom livro comendo pipoca doce da vovó e minha companhia preferida, o filhão. Isso é bom. São momentos de um mundo ideal, onde passo os dias sorrindo com o sorriso de meu filho.
- Sei.
- Deus é muito bom. Veio com a mão divina sobre minha cabeça quando me trouxe essa criança.
- O resto babau?
- A gente se retrai, não vive como devia. Mas, um filho preenche muito, a ponto de despertar ciúmes no marido. Saio mais com ele, adoramos fazer compra no Mercado Central, apaixonado pelo corredor dos bichos.
- Eu também vou muito ali, sou mineiríssimo. Adoro comer biscoitos no Mercado Central e sentir o poder avassalador de um simples cheiro, conjugado ao tempo e a memória. Fico impressionado com o cheiro do polvilho que convivi em toda a minha vida e imediatamente associava minha infância.
- Poeta mesmo! Um osasis do pensamento claro.
- Bem, leva ele ao cinema.
- Numa sessão da noite. Imagine!!!
- Ora, Suzana!... Não tenho filhos, mas vejo quanta culpa colocamos nas costas dos filhos, como o se eles tivessem que dar conta de todos os nossos fracassos. Deixei de fazer isso, de ir ali, de compara aquilo, de voltar aos estudos, tudo para que você pudesse “dar gente”. Mamae demais, tanto que está esquecendo o papel de mulher. Não sente falta?

- De quê?
- Um cineminha de vez em quando?
- Claro. E sei que preciso sair desse mundinho cada vez mais restrito, até como bom motivo para socializar. Bom sair, conversar, rir, dançar... sentir a chuva

- O que está acontecendo com você para suportar tudo isso.
- Ah, sei lá. Falta de oportunidade, talvez.
- Então?
- Ir ao cinema, jantar, beber, jogar conversa fora, sabe com é: sentir uma fêmea incluída na sociedade de consumo. Um dia desses chamo uma amiga para ir comigo ver um filme... Pode até ser brega, mas queria ver Roberto Carlos em Ritmo de Aventuras.
- Roberto Carlos!
- Brega, ’né?
- Nem tanto, um filme bom. BRock.
- Como assim?
- Versão nacional do rock. Faz toda a diferença. A onda de Roberto continua sendo um rock maneiro, dançante, que ele faz com Erasmo Carlos. Iê-ie-iê é o nosso rock definitivo, a música pop brasileiro dos anos 1960. E isso nos revela um fenômeno muito parecido com o que se constada nos USA, o rock comandando as paradas.
- Americano, sim, mas daqui. Por trás do carisma de um cara legal surgiu um cantor e compositor que ajudou a virar o leme do pop nacional
- Claro. Tranformada e enriquecido por nossas caraceterisca essenciais de rapazes latino-americano com suas guitaras elétricas.
- E não vou mais deixar você tão só. Linda canção, ele não tem vergonha de ser romântico, fala coisas tão lindas, a cada disco novo traz som com mais nuances.
- São vitoriosos, sem dúvida alguma. Não há civilização norte-americana sem Sinatra, nem francesa sem Aznavour ou namorados daqui sem Roberto Carlos ajudando o rapaz a abrir os botões da blusa dela.
Risos.
- Bobo!
- Como jovenguardista, pelo sabor do gesto, sou fã dele também. A nossa geração está descobrindo o rock-dançante com letras inocentes que a Jovem Guarda criou. Não fazem discos com tanta distorçao nas guitarras que às vezes torna difícil perceber a melodia.

- Por que brega? Depende do ponto de vista.
- Concordo. Ele sabe proporcionar aos seus ouvintes boas melodias, para mim, ele e Erasmo traduziram o rock ao estilo brasileiro, sem dúvida, estão no meio dos precursores da aproximação entre rock e MPB, melhor dizendo: MPB’n’Rock
O primeiro disco que comprei na vida é Proibido Fumar, em 1964, traduzindo ao pé da letra a febre do rock, determinando até a maneira da moçada se vestir. Ouvi até furar, na minha vitrola cor-de-rosa. Apesar de achar o grandão menos romântico.
- Nem tão diferentes assim: dupla inseparável

- Sem dúvida. E depois vale conferir a inauguração da fase cinematográfica do cantor que está se transformando num Frank Sinatra brasileiro. Segue o padrão Jovem-Guarda mostrando um jovem rebelde, com vontade de transgredir e anunciando ruptura com os padrões da moda, fazendo história com as calças boca de sino, colares no pescoço.
- Gosto do roquinho deles, sim, mistura bem rock com a música brasileira. É a nossa geração mais alegre do que nunca, apesar da Ditadura.
- Fui a um show de Roberto e pensei como não se imaginar no paraíso, junto a milhares de pessoas se apertando no Teatro Francisco Nunes para escutar em silencio sepulcral as músicas românticas do Rei.
- Quem melhor traduziu o ritmo do rock para o português foi a dupla Roberto e Erasmo Carlos, com milhões de seguidores.
- Ótimo. Mas, gostaria de ver mesmo Belle de Jour, com Catherine Deneuve.
- Se liga no título: Bela da Tarde. A arte de boa dramaturgie, um espetáculo lindo e de alta categoria. O filme tem, sim, o amor como uma das questões principais, mas é inovador.

- Me inspira. É a Em Bovary selando assim esse intricado circuito de subjetividade, diríamos de transexualidade. Bela da tarde é, por isso, um filme espetacular. Ema é tanto uma figura de carne e osso ( melhor de papel) como uma vasta gama de reflexões, são os espelhos que lhe dão a imagem da sua perversidade, do seu desespero e da sua vitoriosa derrota.
protagonista da vez.
‘ - Filmaço, é maravilhoso. É uma bom cinema do primeiro ao último minuto. Tadas a situações, as minúcias psicológicas, políticas e históricas da página impressa viram som e imagem, com execpicionais interpretação de
Crítico, sem ser moralista, o mais popular e o mais belo filme do mestre do surrealismo. O filme tem uma proposta inovadora: subversão total de certos principicipios lógicos da vida em sociedade, e que tem o poder de integrar uma mulher à classificação mais intimas da narrativa. Quer saber?
- Um pouquinho, pode contar.
- Pelo jeito gosta mesmo de antes saber o enredo. Vai assistir, sim. Em alguns momentos é lúdico, noutros é emotivo, há instantes mais realistas. Estou falando de conexão com o espectador, de compartilhar emoções. Ao assistir a Bela da Tarde você sorri, chora, lamenta, revolta, sente afeto.


- Acho bom. Entro no cinema com o espírito crítico preparado, questiono muito, tudo.
- Lançado o ano passado na França, Buñel narra a história de Séverine, apresentando uma jovem milionária e infeliz, de uma beleza assustadora que busca um discreto bordel para realizar suas fantasias sexuais. Casada com um cirurgião de sucesso e infeliz, que procura conseguir o prazer que seu marido não consegue dar a ela na cama.
- Puxa!
- De maneira certa ou errada, Séverine parece saber de si mesma, e não seria de todo insensato ou pueril ver A Bela da Tarde como um acúmulo de más notícias alinhavadas de forma talentosa por um dos maiores cineastas de todos os tempos. No meio do caminho, porém, tenta implacá-lo em outro registro, mais sério e profundo. Soa um pouco esquizofrênico, mas nada moralista.

- Eu sei, entretenimento e cultura de alto nível.

- Só mais um detalhe: Séverine acaba acostumando-se a uma vida de traição e mistérios envolvendo seus clientes, homens mulherengos e com eles faz cenas picantes num grau ousadia acima da média.

- Clientes?
- Não sabia, protituta também tem clientela fixa.
- Só me faltava essa.
- Pois tem. Ademais, Catherine tem atuação memorável no papel, está bárbara. Podemos dizer que cresceu muito como atriz; conseguiu dar o tom exato numa personagem cheia de conflitos. Bárbara. Uma mulher, exageradamente, linda.

- No final.
- Quer mesmo saber.
- Quero.
- Viveu essa vida dupla até o aparecimento de Marcel, um delinquente que se enamora da mulher, e complica a cômoda situação da protagonista.
- Imagino.
- Vai gostar. O cinema volta a apimentar as suas tramas com cenas de sexo longas, ousadas e de forte impacto visual, mas fique tranqüila: niguem fica constrangido com as cenas de sexo, masturbação e taras mostradas durante o espetáculo. Ah, sim, seu estilista preferido teve breve participação no filme.
- Olha!... Mais um motivo. Não perco. Sempre tem um bom filme para indicar, uma boa música para ouvir, um livro para recomendar.


- Segundo Voltaire, o supérfluo é uma coisa extremamente necessária.
- E é. E o filme é ótimo.
- Mas cinema é cultura, e boa. Hoje em dia é imensa a quantidade de imagens que invadem nossas mentes e nossos olhos. Mas o cinema nos dá prazer especial. Os filmes, uns marcam nossa memória outros nos ajudam a definir padrões, éticos ou estéticos. E tem os casos em que um filme pode até mudar o norte de nossa vida, mexendo com a gente a ponto de decidirmos "o que vamos fazer na vida".
- Claro. Claro. Como cinéfilo de carteirinha, qual o melhor filme já produzido até hoje: dezembro de 68?
- Ah, são tantos. Mas, assim, assim de supetão, votaria no “Cidadão Kane” de Orson Welles, rodado em 1941, como o melhor filme de todos os tempos.
- Tão especial assim?
- Sim, especialíssimo.
- Me fala.
- Bem, em primeiro lugar que é a própria síntese do cinema moderno, narrando a história de vida do jornalista fictício Charles Foster Kane, papel interpretado pelo próprio Orson Welles, uma obra-prima, sem dúvida.
- Mesmo?
- Também se mostrou um bom ator. O filmo foi construído em cima da palavra “Rosebud”, uma espécie de código para a felicidade, o desejo, o sentido da vida - um marco na história do cinema, quanto ao roteiro, filmagem e cenário,
- Rosebud?
- Sim, rosebud.
- Semanticamente, “Rosebud” se traduz do inglês por “Botão de Rosa”, e é uma referência poética clara ao órgão genital feminino do prazer: o clitóris.
- Isso mesmo.
- A anatomia da genitália feminina é freqüentemente associada à forma de um botão de rosa pelos poetas. Assim, “Rosebud” simboliza aquilo que há de mais íntimo, de mais misterioso, mais escondido, mais particular, mais encoberto. Neste sentido, o autor Orson Welles reservou a palavra “Rosebud” para associar poeticamente àquilo que o personagem possuía de mais íntimo, de mais particular. “Rosebud” era o seu lugarzinho especial de prazer, onde só ele podia tocar, era seu refúgio particular onde ninguém, em toda sua vida conturbada, tinha acesso.
- Pôxa!
- Outra curiosidade: vale lembrar que o filme fora produzido em 1941, época em que o corpo feminino ainda era um mistério sexual dentro do universo masculino. O próprio Freud, que viveu até o início do século XX, e que tanto atribuiu a questão sexual como influente na vida particular das pessoas, ele mesmo acreditava que a mulher só possuía o prazer vaginal, ignorando por completo a função do clitóris. Portanto, quando Welles coloca a analogia “Rosebud” elegantemente em uma tela de cinema, em 1941, só por isso já é possível ter uma idéia da grandeza literária de sua obra.
- Ah, não perco por nada.
- Bom, é um filme que raramente a gente pode ver. Normalmente programada em seções de artes. Só ficar atenta. Enquanto isso, volta a se familiarizar com a tela grande, menina.
- Interessante.
- Entre o filmes na praça, lá mesmo, no Metrópole, está em cartaz uma boa fita do cardápio nacional O Homem Nu, de Roberto Santos, com Leila Diniz e Paulo José. Todos precisam ir ao cinema, e correndo, comprar um ingresso para asistir essa fita.
- Puxa!
- É o filme brasileiro, por sinal carioca, mais importante do ano, fundamental como obra cinematográfica. O diretor recreiou de forma admirável o conto de Fernando Sabino. É a câmara dando voltas ensandecidas em torno de um homem nu. Fui ver... E recomendo; boa adaptação para a tela grande; o filme procura atrair o publico com a sugestão inicial de humor e sensualidade também, por que não. É na rua que transcorre o clímax da história. Legal, muito legal.

- Boa fita mesmo?
- Nota 8. O diretor expressa com maestria a sensação de que tudo dura o tempo da pipoca no cinema. Dizem que bons livros dão maus filmes e maus livros dão bons filmes. Nesse caso, nada disso.
- Penso que podem dar bons e maus filmes. Li a resenha. Parece que boa mesmo a fita.
- Sabino é cinematográfico. Quem conhece sua obra e viu o longa se identificou com o livro. Mineiro como sempre, brasileiro como nunca.

- Vou assistir.
- Roteiro forte e bem amarrado. Mas, o grande lance é que ele não é um pastelão à Benjamin Stiller, mas também não chegou a ser um Teorema, obra do cineasta italiano Pier Paolo Pasolini. Não é uma comédia explícita ou banal, o humor e a comicidade estão nos acontecimentos. Vale a pena ver.
- Nas entrelinhas do cinema, nova leva de filmes adaptados de obras literárias instiga reflexão sobre o namoro das letras com as telas. A obra é bem boa. Nem tanto pela direção, que poderia ser mais ousada, mas pela personagem em si. Vai gostar.
- Quando a sétima arte supera a literatura!... Leila?
- Ela própria levando cores para a tela preta-e-branca. A atriz brilhou. Leila, sim, é audácia pura. Arrasa no papel da mulher forte e sexy ao mesmo tempo. Só não da pra dizer que não teve para mais ninguém, porque aquele núcleo é cheio de feras. Ela tem inteligência corporal, presença cênica e compreensão da cena. Tem verve criativa e é contemporânea
- Que barato!
- A artista está melhor do que no filme “Todas as Mulheres do Mundo”, em que aparece loira, linda e nua.


- Nuazinha?
- Nuinha, nuinha... É a gata da vez, uma sex-symbol tupiniquim. Voluptuoso personagem que lembra Brigit Bardod em seus dias de glória.

- Virou deusa.
- Liberou geral, da cabeça aos pés em grandes jogos de sedução em cartaz. Para homem nenhum deixar de ajoelhar e bater palmas diante de tanta sensualidade que tira de letra.
- Só acho ridículo essa coisa de sex-symbol. Qualquer mulher ou homem famoso pode virar um sex-symbol

- Não sobra, nem falta nada. Se encarar a estampa do Calendário da Pirelli, a folhinha via pegar fogo. E as oficinas mecânicas mais ardentes.
- Deixe de bobagens, sô?
-Leila posou para a maioria dos cliques, trajando nada mais do que o vento e gotinhas de Chanel nº 5. Que corpo!
- Que corpo, que trazeiro, ‘né? Pode completar, seu... seu...
- A Leila, então, na sensualidade dos seus 23 anos é a garota da vez, revelação do cinema; atriz jovem com beleza e vigor mostrando como uma mulher pode ser sexy: da roupa que veste à cuca que tem; torna-se porta-voz de uma sensibilidade feminina e profudamente engajada nos rumos do mundo moderno. Além de encarnar, como poucas no cinema, uma mulher fogosa, tem a inteligência de fazê-lo de forma irônica, um ícone, que tem os homens a seus pés. Uma mulher que você consegue encontrar na rua, na praia...
- Poder ser. Perto dela sou uma Polliana
- Leila Diniz é, hoje, a namoradinha do Brasil, mas é líder nata, uma voz que se expressa... Tanto que a artista virou porta-voz de sua geração.
- Um pouco exagerada. Seios espivitados e oferecidos. E tem muito predisposição ao exibicionismo, mas concordo.
- Um ícone, sem dúvida. Além de ser uma grande atriz, é o símbolo da luta contra o preconceito e pela liberdade de costumes no Brasil. Mesmo com aquela aparência de artista avoada, Leila é a face mais visível dessa batalha. É uma Helen Brown menos revolucionária e cheia de fragilidades. Aposto no seu talento.
- Para mim está mais para Brigitte Bardot. Se o cinema brasileiro tivesse um rosto só, poderia ser o dela.
- Deus se manifesta através do belo, taí a natureza para confirmar. Brigite tupiniquim. Moderna, sexy, cabelos despenteado. Bela e fera ao mesmo tempo, tanto que os homens a valorizam com os olhos. Brigite foi ousada para sua época, Leila também, eternas fêmeas.
- Ah, claro. Aprecio o humor escrachado e a maneira que ela lida com as futilidades femininas, sem ser banal. Aposto que, se a censura permitisse, nesse Natal, ela toparia fazer uma homenagem brasileira à artista norte-americana Bette Page, a sex symbol norte-americana que posou para Play-Boy usando um gorro de papai Noel, e nada mais.

- Já imagino o pôster dela pendurado no meu quarto. Não seria um Piar-Up sensualíssimo?

- Carismática, cheia de energia e de teatralidade. Amor, festa, devoção à carreira cinematográfica. Uma luz sobre si mesmo e sobre nós. Vai lá, esculacha, dá um show através de um apelo vibrante por direitos e oportunidades iguais aos dos homens para o sexo feminino. Mas, tão feminina, tão bela, tão feliz que se Freud tivesse conhecido a atriz, nos teria poupado o divã.
- “Ã-hã.
- Já fez de tudo na vida e não se arrepende de nada; derrotou o tempo e descobriu o segredo da vida: viver inensamente. Receio, que um dia, seduzida pela fama, deixe de ser a mensageira do sublime na nova geração de mulheres para se tornar um produto, objeto de consumo.
- Acredito que não, ela tem cabeça boa.
- Afinada com o mundo ao seu redor, alegre, carismática. É a multiplicação; o mundo todo e todo dela. E por cima, deve ser uma máquina de fazer amor


- É. Tenho fé que vai chegar o dia de Leila para todas as brasileiras.
Leila é irreverente, simpática e, sobretudo descolada. Ela inventou a nova mulher tupiniquim. Leila, para sempre, Diniz.
- Se fosse simples assim.
- Mas, não é inalcançável.
- Pode demorar muito ainda, rapaz. Muito...


- Suzana, a nudez está em toda parte!
- Eu sei, é só ver as mulheres nas praias do Rio de Janeiro que usam biquínis tão pequenos que o tecido é insuficiente para fazer uma gravata borboleta. Malucas. Cheguei à conclusão de que a pornografia, que é a apresentação de nudez ou de ato sexual com a intenção de provocar a excitação, vem se disfarçando de um comportamento comum, para poder atingir um público maior, que é a família.

- É isso mesmo, soltaram os biquinis em praias cariocas! Dentro do mar da moda tem Rio tem estilo. Tem mulher mais bonita do que uma mulher bonita brasileira, e de biquíni?
- Não precisava de tanto. No ocidente, o século 20 está vendo um progressivo desvertir-se feminino. Sabe-se lá o que nos aguarda.


- Copacabana é isso aí ao oferecer a beleza descoberta
. Nunca fica na mesmice. O bairro sempre tem uma novidade, um atrativo a mais. Correto?
- Menor que é mais. Copacabana é demais!

- Passei uma temporada lá morando numa quitinete na Viveiro de Castro com avenida Princesa Isabel, travalhava no Jornal do Comércio.
- Não sabia.
- Primeiro simestre do ano atrasado.
- De aprontar bastante.
- Numa boa.
- Aí, que inveja!
- Vez ou outra tomo o Vera Cruz no sábado à noite, viajo a noite toda, passo o dia na praia, e volto no norturno.
- Tudo isso por uma praia. Ou pela paquera mais fácil com garotas livres e descoladas.
- Não é só. Também para se livrar do estresse da frenética correria que me meto cada dia mais.
- Me diga, conhece muitas garotas lá?
- Algumas. Mas, prefiro as daqui. Para imprenssionar mais, vou ao Rio para pegar um bronze e voltar com o corpo salgado com gostinho de mar.
- Garoto esperto e cheio de rolos.

- E bota mais nisso bem ao gosto do freguês e está decifrado nosso inconsciente coletivo. Bem-aventurada a inglesa que, na esteira contracultura, criou o biquíni. E as praias do Rio, desde quando o sol ilumina a pedra nua que serve de base ao Cristo Redentor, acolhem a legião de machos e fêmeas no eterno cio do calor tropical, reverberando nosso destino e vocação admirar o trazeiro das mulheres, não sendo artista carrega-se o silencio culpado.
O biquini agora tem vários estilos, nem precisa ser mais carioca. Basta ter o estado de espírito do Rio.

Cinéfilo roxo
Moda criada na Inglaterra curtida na carioquice de uma agitada Ipanema.
A felicidade de apresentar nem que seja um curta

Pra xuxu O biquíni (ou bikini) é um maiô de duas peças de tamanho reduzido, que cobrem o busto e a parte inferior do tronco. Seu nome se deriva do atol de Bikini, um atol do Pacífico onde se deu, em julho de 1946, um explosão atômica experimental. Assim, pretendia-se propor que a mulher de biquíni provocava, na época, o efeito de uma "bomba atômica". Na França, o termo é marca registrada.

A criação do biquini é disputada por dois estilistas franceses: primeiro, Jacques Heim apresentou o "atome" como "o menor maiô do mundo"; em seguida, Louis Réard mostrou o "bikini, menor que o menor maiô do mundo" e ficou com a fama do criador da peça.
O medo aqui é como uma saia curta que esconde, entre as pernas, uma alma ansiosa. A banalidade da nudez contemporânea é a prova cabal contra o discurso dos afetos bem resolvidos. Neste sentido, os medievais, aliás, como numa série de outras coisas sabiam mais do que nós, bobos da razão.
Biquíni, moda conhecida como quatro triângulos de nada
Desafiando preconceitos .

Mas no início mulheres não estavam preparadas para usar peças de vestuário tão reduzidas, que mostravam o umbigo e foi proibido em vários países incluindo Portugal. No entanto actrizes como Ava Gardner, Ursula Andress e Brigitte Bardot foram contra todos os preconceitos da época aderindo ao biquíni, como instrumento de sedução em filmes e em fotos.
• Os mais antigos precursores dos biquínis de que se tem notícia foram mostrados num mosaico romano do século IV em que várias mulheres, de saiote e bustiê exíguos, praticam esportes.
• A atriz americana Jayne Mansfield foi a pioneira em usar um modelo cuja peça inferior avançava um pequeno centímetro até mostrar o umbigo, motivo de escândalo em Hollywood, no início da década de 60.
Anos 50
Estilo duas-peças, de tamanho grande e as cavas da calça são bem baixas. Foi considerado ousado, mas hoje é tido como um tamanho grande.
Em geral com calcinha lisa e sutiã estampadão. Era ousado porque o ideal seria ter o conjunto. A tanga foi uma atitude tipicamente carioca. A atriz americana Jayne Mansfield foi a pioneira em usar um modelo cuja peça inferior avançava um pequeno centímetro até mostrar o umbigo, motivo de escândalo em Hollywood, no início da década de 60. [editar] Anos 60
Ousado por deixar o umbigo bem à mostra, com cava maior que a dos 50.
História
Invenção francesa, o biquíni nasceu em 1946, pelas mãos do designer Louis Réard, que pretendia criar o menor maiô do mundo, e realmente o fez.
Criou o ‘Bikini’, que recebeu esse nome em alusão à explosão atômica experimental no Atol de Bikini, no Pacífico.
O nome pretendia propor que a mulher usando um buquíni causava o efeito de uma bomba atômica.
Logo após a criação, e segundo as regras de comportamento da época, não era adequado a uma mulher usar algo tão curto, mesmo que fosse para tomar sol e se refrescar na água.
Somente 10 anos depois, em 1956, a utilização foi iniciada no cinema, e ainda assim, por mulheres à frente de seu tempo, como Brigitte Bardot e Ava Gardner. Nos anos 60, o biquíni atingiu o auge de popularidade, mas ainda havia um certo receio de usar algo tão mínimo.
Então o sucesso continuou no cinema. No Brasil, ele começou a ser utilizado no final da década de 50 pelas vedetes, que reuniam multidões nas areias da praia de Copacabana no Rio, e tornou-se um símbolo pop, sobretudo no final da década de 70 e 80, com os famosos biquínis "fio dental".
“Na década de 50, as atrizes de cinema e as pin-ups americanas foram as maiores divulgadoras do biquíni.”
Evolução
Do maiô ao biquíni existe muita história. Após a bombástica criação das duas peças separadas, demorou um pouco para que as mulheres se acostumassem à idéia de usá-las separadas. Conheça a trajetória dessa peça indispensável ao seu guarda-roupa.
Anos 60: Nessa época, o biquíni já existia, mas era restrito às meninas mais ousadas. Com a criação da pílula anticoncepcional, da minissaia e da maior discussão sobre liberdade sexual, o maiô então começou a sofrer mudanças e a primeira alteração foi retirar a parte de trás, criando o modelo engana-mamãe, que era maiô na parte da frente, mas era aberto na parte de trás, como um biquíni. Anos 70: Quando o biquíni já estava firmado como parte do guarda-roupa feminino e seu uso não era mais tão criticado, nasceu um biquíni de tricô que ficava torto quando saía da água. Para resolver esse problema, as mulheres enrolavam as alças da calcinha, criando assim o modelo Tanga, que não tinha alças, apenas cordões. A tanga foi também uma ferramenta de protesto contra a situação política e econômica que o país atravessava.
11/02/1934 Nascimento de Mary Quant (estilista inglesa - 'inventora' da ... 05/07/1946 O designer francês Louis Réard apresenta a sua criação, o biquini. ...

- Hein? Não entendi.
- As praias brasileiras são feitas de acumulo delas, todas justapostas ao sol, sensíveis e felizes no exercício da sua fotossíntese sensual, todo mundo vê e aplaude, pois são muitas, brancas, outras de cores ainda não registradas na palheta dos homens. Em praias pernambucanas Gilberto Freyre tentou explicar a “bunda ostensiva” da brasileira pela miscigenação. Drummond, aparentemente entretido apenas com o balanço das palavras, para traduzir os espantos escondidos, gritou, só que de outro jeito, com dimensão poética: um dia publicou “La vai sorrindo a bunda/Vai feliz na carícia de ser e balançar/Esferas harmoniosas sobre o caos”.
- É.
- À interjeição com a percussão bilabial explosiva sonora a brasileira agradece. Elegante, na frente da onda, ele agradece as interjeições de apreço. E, antes que seja mal compreendida em sua alegria, sai de banda.
- O menor que é mais. E bota mais nisso.
- Sem falar das aparecidas, quase in-natura, a desfilar de peito aberto por todo canto da cidade.
É. Em defesa delas, Freud já dizia que o sonho de estar nu em público é comum às pessoas, apesar da ligação estreita com vergonha e fragilidade.
- Freud!... Isso é papo de doido.
- Ora, Suzana, ao longo da história, em diferentes contextos, o corpo despido também expressou orgulho, desafio ou liberdade. Basta ver o nu artístico inspirando as artes plásticas desde a antiguidade. De qualquer forma... o nu é bom, uns implicam, mas todo mundo gosta: só não precisa radicalizar.
- Também acho.
- Muito bem, já leu o conto?
- Ainda não.
- Leia. Fernando prende o leitor, grande livro. Leitura ligeirinha, de cabo a rabo.
- OK.
- Bom ler antes de assistir a fita e observar a transposição das palavras para a tela.
- Então me fala um pouco do filme.
- Comédia interessantíssima. Realismo, magia e a arte da adaptação de texto vertido em filme.
- Vou, sim. Mas, conta mais...
- Bom. Narra as confusões causadas por um professor de música que fica acidentalmente nu, trancado pelo lado de fora do apartamento de uma amiga.
Suzana não contém o riso.
- Nossa!... E aí?
- Recomendo ler o conto, no mínimo, é uma leitura deliciosa. E assim vai conferir duas vezes Sabino.
- Pleeeease. Só mais um pouquinho, vai.
- A partir daí, o homem - do jeito como veio ao mundo - passa por uma série de situações inusitadas. Foge de um lado p’ro outro tentando se proteger de uma população escandalizada. Bode danado!... Dá p’ra rolar de rir. Chega, senão perde a graça.
- Não perco por nada.
- Sabino é um ficcionista tipicamente urbano. É cem.
. Muito bem, leia o livro antes, viu? Não é mais um besteirol.
nessa geléia geral.
- Sim, professor. E você, Math, vai muito ao cinema?
- Sempre.
- Posso jurar que não perde as adas.
- Não é meu gênero, prefiro a criatividade de Godard e ou de outros gênios da sétima arte; filmes mais intelectuais, mais quentes.

Os primeiros filmes da Nouvelle Vague francesa, com o Viver na Vida, de Godard, ou Cléo das 5 à 7, de Agnes Varda, tinham identidade sonora: todos traziam trilhas assinadas pelo maestro e piannista francês Mechel Legrandla hist´roia, Godard conseguiu um rompimento de tabus antes invioláveis. Ele desautorizou a obritoriedade dos cortes lineares, diretor Celebreou a homenageada dese ano, atriz francese e musa da Nouvelle Vague, Jeanne Moreau.


Acossado –e são o casa apaixonado do antitriller ACOSSADO”( àbout de souffle)
Jubileu da revolução estética que fez de Jean-Luc Godard uma grife – estandarte da Novelle Vague –
Onde foi rodado?
Esse antitriller narra o amor entre Patrícia Franchini(Jean Seberg), vendedora do The New York Herald Tribune nos Champs-Elysées, e um marginal com artes de Humphery Bogard, Michel Poiccard (Jean-Paul Belmondo).
Godard me ajudou a entender o valor da força da liberdade de expressão. O movimento modernizou o cinma entre os franceses, intelectualizando-o e engajando-o em debates comportamentais e políticos.
Sou um fruto da geração que cresceu com a Noveu

alentar
Em 24 de junho de 1959 começou a produção longa-metragem deflagrador de uma revolução estética que, ao lado de Os Incompreendidos, lançado por François Truffaut no mesmo ano, renovaria a maneira de se fazer cinema na França.

Quando sai do cinema Palladium, após ver o Acossado, em duas sessesões seguidas, lembro-me de ter falado com um amigo: Esse cara, esse tal Jean-Luc Godard, vai desbancar
A importância do olhar poético que Godard despertou em 1959.
No cinema, o conceito de liberdade é inventado por Godard, misturando literatura, citações filosóficas, cultura pop. O componente poético filmítico nasce com o Acossado e decola com Pierrot Le fou, dirigido por ele em 1965.


- Ã-hã.
- Não nego que o gênero comédia de costumes tem uma tradição de sucesso no Brasil, humor escachado até o que transgride. Mas, para rir nada melhor do que um filme nacional popularesco como a adas, comédia pastelão que vive inventando atmosferas, cenas, climas, modas, bordões, tipos e por ai vai. ada Zé Trindade, Ankito, Grande Otelo, Oscarito, sempre atrapalhados com as mulheres, por trás do humor sem papas na língua – eles são doidos e engraçados demais. Nem sempre, mas às vezes produzem comédias com toques absurdos ou comédias românticas que fazem alusão ao sexo, mas nunca o mostra de fato. De qualquer forma é o filme que atrai mais gente, o brasileiro é gente que gosta mesmo de dar risadas, a sala fica lotada. Mas Godard, hoje em dia, enche mais.
Os filmes de ada eram na verdade um grande rádio-teatro, ou mesmo um espetáculo circense, filmado, e bem distribuído pelo Brasil
ada vem do espanhol o, que quer dizer porcaria, lixo. Isso todo mundo sabe. E essa mesma besteirada cinematográfica, surgida nos anos 30, e que se impôs até os anos 50, era um grande sucesso de público nos países latinos, como o México, Argentina, e o Brasil. Eram paródias de histórias da época, ou mesmo de filmes americanos de sucesso, recheadas de música, música popular mesmo. E naqueles dias nada mais popular do que o carnaval.

Os filmes de ada eram na verdade um grande rádio-teatro, ou mesmo um espetáculo circense, filmado, e bem distribuído pelo Brasil. Através deles lançava-se músicas, além de registrar os sucessos fonográficos da época. Era um veículo também usado pelo presidente Getúlio, onde tudo se amenizava, os problemas sócio-econômicos se diluíam, enfim, uma festa. Era a mídia poderosa de então, como fosse hoje a Rede Globo.

- Sabe que poucas vezes assisti uma comédia brasileira, mas sei que comédia atrai popularidade e anestesia o povão contra a situação político de nosso povo. Acho que não deveríamos ver comédia como gênero menor, vivemos nossas situações trágicas mas somos um povo alegre, solar que adora assistir as trapalhadas de Dercy Gonçalves, Oscarito, Anquito, Grande Otelo, Zé Trindade...
- Tem razão. Uma receita, apesar de espalhafatosa, é bastante simples. Em primeiro lugar cria-se uma maneira de assegurar que o Brasil é uma maravilha, pelo contraste com regimes rígidos de outras culturas, mesmo que para isso seja preciso forçar a barra. E depois, revela notáveis atores burlescos da comédia fílmica brasileira.
- Não existe nada mais chato que o culto às celebridades vazias - eles preferem as loiras. Falsas alegrias imprimem o destino de seduzir todos os homens, qual na verdade eram quase sempre objetos descartáveis.
- É. Pensando por aí...
- E de Glauber Rocha? – pergunta Suzana.
- Deus e o Diabo na Terra do Sol, um dos filmes–chave do cineastra. Estreou em 1964 em meio à luta dos filmes autorais por espaço nas telas. Vive o muito em constituição ao mesmo tempo realista e fantástico da vida no agreste baiano.
- Chatura. Ah, Math, não faz meu gênero, prefiro filmes românticos, leves. São filmes para cinéfilos.

- De crítica social, sedento por sague e transgressão; começa promissor, mas logo tromba nos cacoetes. Senti essa força ao ver os novos filmes brasileiros. Me fascina pelo fato de que a situação e o desdobramento da ação dos personagens é uma poderosa alegoria da enfermidade que acomete o mundo, um tipo de asfixia, tanto metafórica, quanto literalmente.

- Não gosto.
- O Cinema Novo é um movimento que tenta traduzir a condição política e social do nosso país como se fosse um gesto revolucionário. É o que me interessa ver: filmes que busquem operar uma transformação no ser humano.Que gera mais interesse pelo registro documental da miséria e a falta de perspectivas do que, como literatura, capaz de satisfazer expectativas criadas pelo ponto de partida.
- Complicado para meu entendimento.
- Bem, não deixa de ser uma loucura que ainda mexe com a cinematologia brasileira, impondo-se como movimento de cinema "novo’. Gravações sem cortes ou correção das cenas, a composição dos personagens, figurantes locais, a paisagem dos sets para filmagem, ambientação, figurino, além de reinventar-se as maneiras de musicar e dialogar sobre as gravações: todo o roteiro - as conversas, pensamentos e letras melódicas vêm do genial meio instinto meia consciência glauberiana, num trabalho didático de formação de uma platéia mais politizada. Não é teatro de mentirinha não.
- Não e não gostei.
- Quê isso, Suzana! Conferi o longa Terra em Transe em pré-estreia realizada no Rio, consolidando a carreira de Glauber. Política na tela.
Fita política descamba para a violência mostrando o perigoso estado das coisas.

Durante toda a exibição, não faltaram gritos e suspiros em alto e bom som na plateia cada vez que o público especializado se deliciou com as cenas colocadas na tela pelo diretor Glauber Rocha - um círculo complexo das figuras humanas e ideológicas, um convite do cineasta baiano para dar pegada mais contundente aos versos que falam da cruel desigualdade social brasileira. Mostra ecos da cultura dos coronéis, também intrigante


- Ou a vivência me deixou burra, muito burra demais, e não entendi nada de nada, ou a obra de Glauber é obra apenas pretenciosa que mira na telematurgia e no reality Show, mas não é nem uma coisa nem outra.
- Todo o filme é um delírio de um poeta que se rebela contra a situação e vai morrer por isso. Então tudo é permitido e justifica as ousadias narrativas, mesmo assim mostra um pouco a rotina de quem mora no interior nordestino. Muito confuso para inglês ver, minha nota é sete. O novo longa evidenca o salto de Glauber, que altera um pouco o tom e enquadra ai um discurso denuncia contra a repressão e chega para mudar radicalmente os rumos do nosso cinema. O filme, de olhos abertos para o cinema que transforma, balança os franceses e não deu outra: arrebatou o prêmio em Cannes, em 1967. O filme oncorrendo espaço nas telas estrangeiras.

- Do ponto de vista pessoal não me agrada. No entanto, de um tempo para cá, algo vem me inquietando com essa febre de filmes na linha do gênero que curte paixão pelo mal focalizando um mundo de pobreza extrema em todos os sentidos.
- Sério?
- É o que penso. No lado artístico não tenho competência para julgar sua qualidade. Não sei avaliar isso.

- Minha primeira impressão foi ruim. E ficou. Essa historia de "estética da fome" não me amima nada, me dá indigestão. Filmofobia pura. Nos filmes desse gente os porcos e seres humanos se equivalem; focalizam frontral que a miséria deixa no Brasil

- Esse é um filme para ser mastigado e degustado. Polêmico, contraditório, extremo.

- Pode ser, mas não faz meu estilo.
- É assim que pensa?
- Um diretor sem preocupação com estilo. Representa o cinema do absurdo social, em que humanos e a miséria convivem de forma muito cruel, bruta. Filmes feitos por um diretor descolado e com dinheiro e tempo de menos. Para muito é a terceira via do cinema brasileiro, alienado por falta de afeto, em tempo de denuncias. O horror mostrado nos filmes de Glauber é quase irracional, mas muito realista, considerados o mata-mata das telenonas.
- É. O foco é na miséria, apesar de ser ficção, a fita tem um tom documental. É brutal na forma que retrata as famílias que passam fome regularmente. É isso que os diretores do Cinema Novo querem: tornar pessoal, para quem não é faminto, o problema de não ter o que comer.
- Vero.
- Olhando por esse lado, tai um retrato vivo do Brasil,
Recriando o triste mundo do sertão brasileiro. Na verdade, uma safra de longas-metragens realizado no país está mostrando diversidade de temas e estilos.
- É preciso ter coragem e decência para admitir que a fome no Brasil tem rosto. E o rosto dela, quase sempre, é preto.
- Pior que é. Mas, acho que são filmes que não ameaçam tanto. Cada fita desse gênero é mais uma ressaca dos filmes da chamada geração Cinema Marginal.
- Ah, precisa de tanto?
- Cinema Marginal; tipo de cinema-olho que finge não ser cinema, tentando convencer a platéia de que aquilo é a própria realidade. O sucesso se explica numa só palavra: liberdade.
Um inovador, sem dúvida.
- Não gosto, definitivamente... Eu... eu troco por um Jerry Lewis, quase morro de rir com seus filmes. Gosto de filmes leves, poéticos, sensíveis... filmes que, mesmo sem grandes recursos, são feitos com a alma. Assistir e me emocionar
- É. Cinema Novo com suas idiossincrasias, sua visão pessoal do mundo, sua maneira de achar que uma câmara na mão era um fuzil que, em vez de mandar balas, recolhe imagens do país numa ingênua exposição de verdades e injustiças sociais, escancarando seu problema crônico: a fome, acreditando na força do cinema. Espaço de resistência.


- Neorrealismo?
- Sim, porque não taxar assim. Cinema novo é para quem a estrutura dos filmes era uma forma narrativa tão importante quanto as política social da política social do Brasil.

Abaixo o realismo no Cinema. Território independente
Assistir personalidade histórica como Niet e outros como personagens de uma obra de ficção é extremamente interessante.
Hellman, nascido em 1931, fez uns 10 filmes, se tanto. Começou trabalhando Roger Coman, certamento o maior formador de talentos que o cinema americano já conheceu.

Uma parcela (pequena, mas significativa) da juventude brasileira descobre este novo cinema, comprometido com a transformação do país. Em 1963, o movimento é deflagrado por 3 filmes: ", de Ruy Guerra; "Deus e o diabo na terra do sol", de Glauber Rocha; e "Vidas secas", de Nelson Pereira dos Santos. Em todos eles, é mostrado um Brasil desconhecido, com muitos conflitos políticos e sociais. Uma mistura original de Neo-realismo (por seus temas e forma de produção) com Nouvelle vague (por suas rupturas de linguagem). É Glauber quem define os instrumentos do cinema novo: "uma câmara na mão e uma idéia na cabeça"; e também o seu objetivo: a construção de uma "estética da fome".
Após o golpe militar de 31 de março de 1964, consagrando a volta dos que foram e dos que não foram, os cineastas (e o país) se interrogam sobre o futuro e sobre as suas próprias atitudes de classe. Os filmes marcantes desse segundo momento do Cinema Novo são "O Desafio" (1965), de Paulo César Saraceni; "Terra em transe" (1967), de Glauber Rocha; e "O Bravo guerreiro" (1968), de Gustavo Dahl.
Enquanto isso, longe do Cinema novo, Domingos de Oliveira redescobre a comédia carioca com "Todas as mulheres do mundo" (1967) e "Edu coração de ouro" (1968).
Com o AI-5 (13 de dezembro de 1968), pondo o fim de ano na crista da onda do antisocial, a ditadura militar fecha o Congresso e os partidos políticos existentes e censura a mídia e as diversões públicas; o Brasil entra num período mais tenebroso de sua história. A perseguição às oposições, a restrição da atividade sindical e a prática de tortura nas prisões criam um clima de medo que se reflete em toda a cultura do país. Neste terceiro momento, o Cinema Novo volta-se para o passado, para a História, ou para projeções alegóricas do país real: "
- É. Não. Sim. Seu filme anterior, Deus e o Diabo na Terra do Sol, filmado em 63, Glauber realizou um precioso retrato da cultura brasileira, o faroeste do terceiro mundo - miséria e violência, ingredientes comuns ao cinema novo. A seca, o cangaço, a opressão dos coronéis, o beatismo, o repente, a literatura de Cordel. Com apenas 24 anos o cineasta foi buscar inspirações nas referências estéticas do Encouraçado Potemkin, de Sergei Eisenstein; na peça teatral O Diabo e o bom Deus, de Jean-Paul Sartre, e nos westerns norte-americanos.
- Não sabia.
- Em Terra em Transe a conversa agora é outra, já nasceu com selo de exportação. O filme é contado quase todo num imenso flash-back, onde Glauber explora como tema a fictícia República de Eldorado, onde um jornalista e poeta luta para mudar a situação de miséria, corrupção e injustiça que assola o país. Tudo isso em meio a um triângulo amoroso entre Martins, a ativista Sara e a meretriz Sílvia. No elenco Glauce Rocha e Jardel Filho. Nota nove.
- Oh!... Fita "datada"?
- Facilmente percebível. As semelhanças com a ditadura militar do Brasil, naturalmente, são intencionais. E isso o torna mais significativo.
- Então gostou mesmo da fita?
- Não nego. Mas, na verdade o que também me distrai são as chanchadas do jeito que o povo gosta, sessão pipoca. O “bom humor” e a “alegria”, como características nacionais, ganharam espaço no cinema produzido no Brasil desde meados da década de 30. Formato batido para muito gente, mas permanente nos cinemas, acerta quanto tem um personagem vivaz, tipo Ze Trindade.
O “bom humor” e a “alegria”, como características nacionais, ganharam

- Povão, ‘né?
- Ir ao cinema é um programa popular no Brasil, há salas em cerca de 20% das cidades brasileiras vendendo dezenas de milhões de ingressos vendidos por ano.
- Como o circo, o cinema chega a lugares em que não há televisão.
- Cinema e o desafio da classe C que precisa desse circo cada dia mais.
- Também gosto do seu humor malicioso.
- Filmes chanchadas são fracos. Humor barato, mas é entrenimento. O pessoal continua quente, deixando o cinema de arte à deriva, mas ainda provoca muitas gargalhadas e traz boas lembranças de uma época de ouro do teatro de revista em revista. Tipo de cinema que está desgastado, mas responde sempe com dedos médios em riste à crítica. Como atividade divertida que se tem entre os intervalos de realizações de ocupações sérias. Os atores se dizem felizes como pássaro e divertidos como carnaval.

- Das vedetes, ‘né?
- Sim. Elas são simplesmentes lindas, absolutas e com muito PhD
- It girls do Rio.
- São mal vistas, mas gente da melhor qualidade.
- Cadê elas?
- Peças cada dia mais raras. Nem no teatro a gente vê.
- Sinto muito.
- Ultimamente ser vedete está fora da moda. Pobres meninas!... Viviam o sonho do estrelato, quase sempre frustrado pela realidade. O símbolo sexual tem outro nome, chama-se modelo, que se dizem as novas garotas do pedaço. Mulheres magras, sempre com a cara fechada, sem talento nenhum; burrinhas. Basta olhar as manecas do Denner. Vazias, selvagens. Exibidas... e chatas.
- Sexuality!... Beldades do Denner! Tem razão. Ele é um asco de tão esnobe e elas, coitados, mais parecem pavões empertigados que levantam a nuca como radiografando o figurino alheio na passarela.
- Tem razão, elas não estão ali para mostrar conhecimento mas, sim, para desfilar suas beleza animal. As vedetes eram o oposto: mulheres ou muito bonitas ou muito engraçadas, mas com veia artística e henna nas sobrancelhas, feito Marilyn Monroe; todas iguais, por mais distantes no tempo e nas geografias. Ex-sensuais e para sempre vedetes.

- Sinto muito.
- Você acredita que ainda consegui assistir o filme “As Libertinas”, com Neuza Rocha, recentemente censurado pelo AI-5?
- Valeu?
- De certa forma, sim. Mesmo não sendo um filme importante, tenta quebrar uma série de preconceitos estéticos e morais vigentes no país, como faz o tropicalismo, na música, e o Teatro Oficina, na dramaturgia. É um filme profundamente debochado, mostrando uma geração que troca a subversão pela transgressão.
- Então valeu?
- Sim. Gosto tanto de cinema que, na minha adolescência, vi e revi filmes bíblicos como os “Dez Mandamentos” e o monumental “Ben-Hur” com sua espetacular corrida de “bigas”. P’ra mim Charlton Heston, não era ator. Era santo.
- Caramba!...
- Sempre quis me cinematelecomunicar. Não nego que meu sonho é ver, um dia, meus trabalhos em cena. Cinema faz ponte.

- Vai conseguir rodar seu primeiro filme, tenho certeza.
- Sonho alto, gostaria de conceber, roteirizar, filmar e dirigir um filme com roteiro bem amarrado e bom elenco.

- Hummm!
- Quer saber, repousam dois roteiros na gaveta; fazer cinema bom e barrato, custo mínimo.
- Curta?
- Ou longa, tanto faz.
- Cheio vedetes?
- E por que não? Toda nudez será bem-vinda ao cinema. Vai depender de muita coisa... O Brasil interfere demais no cinema, nenhum pais tem tantas regras sobre o setor.
- Chato!
- Ainda estou em cãmara lenta. Um dia, quem sabe, saio dessa maré.

- Então, não deve perder os debates sobre cinema promovidos pelo Centro de Estudos Cinematográficos?
- Claro. Tudo sobre cultura me interessa. Às quartas, não perco as reuniões do grêmio literário do Minas Tênis Clube. No sábado, nada é mais sagrado p’ra mim do que participar da reunião da Academia Municipalista de Letras.
- Muito bem. Bom saber que, no seu tempo livre, não vive só correndo atrás de um rabo de saia.
- Óbvio que não.
- Me conta, quando foi que a sétima arte passou a lhe interessar?
- Sempre gostei de cinema. Em Passos tinha ótimas salas de cinema, nas quais, desde menino, assistia os seriados de Tarzan, Zorro, filmes como Sissi, a Imperatriz, Marcelino Pão e Vinho e outros. Nessa época, bem antes da TV, eram mais para crianças do que para gente grande; iam criando fidelidade à telona. A gente tinha que voltar para ver o próximo capítulo.
- Curte saudades?
- Dá sim, para ter saudades. Ali compartilhava as pipocas, os dropes, as jujubas e o prazer enorme de viver momentos de alegrias, tristezas e medo num ambiente de grandes dimensões para grandes emoções.

- Era assim mesmo. Também adorava as matinês.
- Muito bem, com pouco mais de vinte anos, assisti “Cidade dos Desiludidos”, de John Houseman, com Kirk Douglas. Amei. O filme enfoca e fortalece a estética realista ao mostrar os bastidores de Hollywood. Pode até fingir que fala do passado, mas trata de questionamentos do presente. Genial.
Com a chegada do cinemascospe revolucionou minha vida. Até então as trilhas eram feitas com músicas já compostas. A partir daí, elas passaram a ser feitas especialmente para o filme, de acordo com a temática. É isso, muito melhor. Travei uma relação de tal modo umbelical à cidade em que fui criado que precisei sair dali para enxergá-la direito.

Suzana, depois de uma risadinha divertida:
- É. Pelo que vejo sonha mesmo estrear seus textos no cinema.
- Espero.
- Tenho certeza.
- Eu também.
- Sei que há muito folclore em torno dos escritores, mas me conta uma coisa: toda essa vida agitada que você leva ajuda a compor seus textos, seus personagens?
- Ah, sim. Muito. Vejo com estímulo novo. É uma necessidade minha, que abre brechas no imaginário.
- Parece que busca a síntese, a medida exata do sentimento que cabe justo em palavras escolhidas a dedo, de forma contundente.
- Esforço o máximo para isso.
- Personagens inspirados em alguém conhecido?
- Quase sempre. Sim, em mim também;
tudo sou eu. Busco algo que mova emocionalmente o jogo intelectual.
- Autoficão. Está na onda do chamado gênero?
- Não rechaço, até porque não sou muito de inventar histórias, conto mais o que vivi. A parte ficcional só aparece quando conto minhas fantasias.
- Exemplo?
- Detalhes de minhas relações intimas. Os personagemns amadurecem ao longo da história.
Numconto, numa crônica, num romance, numa poesia sua vida é contada a partir de sua obra, evidente. É sempre assim. A vida está sempre impressa em seu trabalho.
- Olha.
- Gosto dessa idéia de que a realidade é feita de ficção que alimenta ela mesmo uma ficção que depois vira realidade, é bastante tocante.Não nego que gosto que, às vezes, a vida vai se embrenhando por meus ensaios. Mas isso não quer dizer que eu faça confidências sobre minha vida. Ou, vice e versa, mesclando experiências pessoais e imaginação. Mas, procuro fazer muita mágica com meus personagens, desenvolvendo tudo graças às artificialidade artística que coloco em cena. Depois de escrever, você não a mesma pessoa. Há uma relação dialética entre a vida e a obra.

- Muito legal, porque insuflar vida aos seus personagens, a maioria deles pessoas comuns que passariam despercebidos se o autor não jogasse sobre elas o foco de sua luz, o foco da criação literária. Pararabéns, uma galeria de múltiplos retratos.
- Às vezes, minhas crônicas são meio ácidas, reconheço.
- Não se preocupe, é o olhar de cronista para a realidade brasileira.
Eu não nasci de óculos.
Mas, enquanto estou vivo o conhecimento do ofício me excita. O mundo anda e você não pode achar que é uma obra acabada. É uma obra em aberto.
Não provoco nem aterrizo as pessoas – esclarec ele, alegremente acrescentando: – não sou cruel, só escrevo como se fosse.

- Isso só vem confirmar que os escritores flagram urbano e o humano da – Isso. Nossa grande missão na vida é ver o que outros não veem. Tipo: o melhor eu escondo, o pior exponho. É uma tarefa.
Suzana, com um sorriso de empatia:
- Talvez usar mais humor para aliviar temas pesados
- Não sei, é? Mas sei que o bom cronista flagra o urbano e o humano da vida.
- Isso mesmo. Por sorte, a crônica consegue reunir algumas igualdades errantes. Mas não são rígidas. Pelo que leio, seguem na linha de atuação, tratando de assuntos do dia a dia, relações familiares e questões sociais.


- Disso não abro mão. Os acontecimento ocorrem, mas tem sempre um caminho em que eles se tocam. É minha menria de fazer crônica. O que escrevo são focos, alguns episódios da vida. É como se pudesse iluminar um certo ponto e depois outro. Muitas vezes escrevo com o proposito de contribuir para a luta política do que para fazer crônica.
- Coisa nenhuma. Faz reflexões tão próprias sobre a subjetividade do tempo e do espaço. A lei de causa e efeito, ou de ação e reação é inoxorável.
- Penso assim. É meu trabalho, faço isso quase todo dia.

- Traz um jovem agressivo e rapidíssimo. Tem seu lado bom e provoca reações apaixonadas. Crônica é emoção, é vida. Tem ainda que ter conhecimento das técnicas e coração de poeta, porque só assim haverá inspiração para criar boas crônicas. É isso mesmo.


- E faço tudo para que meus personagens não fiquem num beco sem saída, porque estou naquela linha de que a escrita, com todos os seus poderes está e estará sempre entre nós estimulando o brasileiro a buscar a utopia possível para nosso tempo de explicita peseguição e violência política.

- Genial. A arte tem que emocionar, caso contrário não é ar¬te.
- Só. Me permito improvisar.

- Você mostra experiência com a palavra escrita. O público espera que traga continuamente novos estímulos nessa tempestade de idéias.
- Sei.
- Gosto de trabalhar bem cada ensaio, mesmo que seja puramente uma matéria de jornal. Como são vocês, meus leitores, que mantém a coluna viva, capricho.
- Está no caminho. Pode se considerar um cara bom de texto.
- Acho que tenho potencial, sim. Se estudar posso chegar lá. Inspirado numa declaração de Clarice Linspector:... há mil Rubens em Rubem Braga, assim com há mil Clarices em mim que falam das paixões pela escrita e pelo Brasil. É o que penso.
- Exatamente.
- Mamãe disse que eu posso escrever o que eu quero, se aprimorar sem fugir da essência. Apesar do sucesso da aceitação, estou longe de se dar por satisfeito, mesmo com as correspondências amontoadas nos variados cantos do casa - recebo livros também.


Risos. Mathier ainda tenta fazer uma brincadeira:
- Para dizer a verdade, gostou ou não da crônica? Comenta, fala alguma coisa. Não estou cobrando e não custa nada, mas por favor, não venha escrever merda. Se você me causar repulsa, seu comentário vai ser tratado com indiferença.Adoro receber cartas de leitor para comentar, falar alguma coisa: agradecer, passar cantadas, descer a ripa, puxar o saco só criticar, ou até enviar um folheto de mala-direta para tentar me vender alguma porcaria. Mas, se o leitor quiser me xingar ou tentar me humilhar, identifique-se. Odeio e Justifico: isso é como chutar uma bola no gogó da ema. Ahhh, faça-me o favor.
Correspondeia é isso amontoados

- Você é engraçado, espirituoso. Voltando, cada história tem seu ritmo, é preciso reconhecer. Tem texto direto, povoado por seres humanos simples. Isso aproxima à arte de ser bem entendido.
- Ai é que está, escrever é sempre questionar, não importa se estou historiando uma crônica, um poema, um artigo. Escrevo coisas com palavras de todo dia... Faço aventuras literárias, sempre expandindo o conteúdo e dialogo com o publico leitor. Nessa forma cotidiana de falar, de vez em quando, me permito produzir um texto centrado no insignificante, no banal, no não interessante, jogando com as palavras, já que posso discutir tudo com todo mundo sob vários ângulos e pontos de vista, teoricamente falando, claro.
- Percebo, principalmente quando se usa a primeira pessoa.
- Às vezes, escrevo assim. De certo modo, os relatos em primeira pessoa tem tom de veracidade, e aproxima leitores; uma forma natural de dizer as coisas que são universais. Por isso, ao criar um texto tomo o cuidado de imprimir na escrita algo diferente do que já tenha feito antes.
- Claro. Claro. Não de ser outra forma de propor reflexão sobre o cotidiano reunindo relatos reais em tom literário. Isso é ótimo. Nenhuma obra literária é suficientemente objetiva, a ponto de permitir olvidar que, no fundo, ela está falando de uma lufada interior do autor.
- Sim. Escrever não é uma experiência puramente de prazer, de dor também. Nunca pensei outra coisa que não fosse ser um jornalista, um escritor. Um sonho de criança. Lá em Passos.
- E inspiração – completa a moça.
- Na minha cabeça a crônica é uma boa maneira para fazer um ensaio sociológico sobre o comportamento do ser humano. Um dia li Alberto Lobado dizendo que o ato de escrever crônicas se assemelha a um tratamento psiquiátrico. O cronista desabafa , fala de si próprio, sem ser interrompido. O leitor faz papel de ouvinte, sem dar palpite. o que mais sei fazer e gosto.

- A luz de seus sonhos. Das suas eu curto muito. Mas, sou suspeita para falar, porque adoro tudo que você escreve. Tem muita imaginação.
- Obrigado. Sou benquisto, graças a Deus.

- E a você. Acho seu texto leve e, por cima, conduz bem os personagens. Aliás, você não cria personagens cria seres humanos; falam algo que podemos reconhecer como fala.
- Ouvir isso da sua boca me estimula mais ainda a correr atrás do sonho de se tornar um bom escritor.
- Está no caminho. Está no caminho.
- Olha, posso garantir que boa parte do meu elenco é personagem vivente com suas memórias, experiências, afetos e tudo mais. Procuro fazer uma literatura que brota da vida.
- Melhor assim. Me perdoe pela imagem recorrente, mas sem querer encher sua bola, acho que algumas de suas crônicas são dignas de serem emolduradas e penduradas na parede da sala. E as poesias para tocar no rádio.


- Não sei nem o que dizer. Mas, digo que o prazer da gente é ver alguém ler, ficar contente e indicar a leitura para os outros. Por isso, estou muito agradecido.
- Não precisa agradecer não. Isso prova que você sempre soube de cor seu papel.
- Sim. Ainda me sinto pequeno, mas um aprendiz com um coração grande, metaforicamente falando.
- É isso. Leciono literatura para turma do Clássico. Leio por prazer, mas também para enriquecer minhas aulas e mostrar aos meus alunos que a miséria social é fruto da miséria cultural. Só com o conhecimento podemos fazer a diferença.
- Sem dúvida, a serviço do saber. Este país só vai ser futuro através da educação. Parabéns.
- Bato naquela tecla que não basta saber, é preciso saber transmitir o saber. Educação e saúde – é disto, apenas disso que o povo brasileiro precisa para vencer as barreiras de uma nação possível.
- Por isso que estou sendo cada dia mais cuidadoso. Ainda bem que me preocupo em ser bastante criterioso, cercando-me de todos os cuidados - com o tempo, a gente fica mais exigente. Antes de dar por acabado, faço uma boa lipoaspiração no texto, colocando em prática ensinamento de Drummond, quando ele disse que “escrever é cortar, economizar palavras’. Não sou de inventar muito. Interesso-me pelo que a língua pode fazer por mim e passo muitas horas por dia procurando garantir o máximo de simplicidade à minha prosa. Essas coisas.
- Literatura é desafio. E espero que consiga tudo que sonhou. Parabéns.
- As escolas, para muitos é vista apenas como lugar para se aprender matemática. Mas, ela tem um papel fundamental na integração de todos esses jovens na sociedade. Mas acho que lá que elas deveriam ser preparadas para se tornarem cidadãos. E cultura é a base de tudo.
- Você é o máximo, Suzana! Você é demais!
- Acha?
- Posso dizer uma coisa?
- Claro que pode.
- Foge completamente do estereótipo de uma professora. Tem charme e acaba a toda frase com um belo sorriso. E deve achar piegas dar suas aulas mal vestida, usa mini-saia em sala de aula?
- Espera aí, nem tanto. Nunca.
- Bem, pode não ser. De calças justas eu aposto. Em síntese, cultiva uma boa aparência mesmo usando roupas mais comportadas na escola.
- Faz bem a todos um mulher bem trajada.
- Vaidosa.
- Venho de uma família muito católica, mas não tenho receio em manifestar que me curva diante de um dos pecados capitais: a vaidade. Vaidade tambem é coisa de professor. E como!
- Assino embaixo. Muito bem, Versos e contos publico no Suplemento Literário do jornal Minas Gerais. Sempre que possível o Murilo Rubião abre espaço para os aspirantes: quase todo santo dia os grupos de vanguarda se reúnem em torno dele em busca de uma colher de chá.
- Bom, hein?
- E não é iniciativa de porta de café ou do Bar do Lucas, não. É por mérito mesmo do autor, sabendo que para uma pessoa que leva a sério o oficio de escrever o pior castigo é o anonimato. Examina com seu olhar crítico a consistência de quem tem estilo, separando-os dos aspirantes fajutos a escritor, senão, dizia ele, o idioma em movimento escorrega nos clichês. Nas conversas, evita citar contemporâneos, mas afirmava estar cercado de livros de 'pessoas tremendamente talentosas'.

- Sábio o Murilo. Sem medo de patrulhas, o Suplemento exibe charme todo sábado. Isso é ótimo.

- Dizia sempre que achava ótimo ter a companhia de tanta gente nova e talentosa, sabendo-se que hoje o jovem escritor lê Proust; é a literatura verdadeiramente em festa. Destesta esses autores que escrevem para si memso e para um ínfimo público letrado, baseando as narrativa em jogos de liguagem que tem como objetivo demonstrar uma suposta genialidade pessoal, acreditando que são a reencarnação de James Joyce e fazem parte de uma equipe iluminada. Isso com o Murilo não cola.

- Genial.
- Por isso, caminhamos com essa noção da importância de um veiculo de comunicação desse porte em Minas, dirigido por um intelectual de idéias avançadas, com o Murilo.

- Parabéns. Acho muito importantes essas parcerias. Devo confessar que aprecio o ambiente poético dos novos escritores mineiros que publicam no Suplemento. Ali assinam nomes de autores como Paschoal Motta, Adão Ventura, Geraldo Reis, Henry Correia de Araújo, que considero um dos maiores poetas brasileiros da atualidade.
- Também. Eu acho o Henry um dos melhores poetas da poesia contemporânea brasileira, se não o melhor, altamente competente e é original na criação; talento das categorias de base da poética, dos muitos jovens da literatura nacional.
- Impressionam-me os contos de Luis Vilela, Roberto Drummond, Wander Pirolli e tantos outros que divulgam seus trabalhos no Suplemento que está craque em revelar grandes talentos da literatura.
- Não só mineira, claro.
- O leque de sensações que tenho em relação ao trabalho desse grupo é muito vasto.
E esbanjando delicadeza, ela confessa:
- Li e amei seu poema ilustrado pelo Chanina na edição de sábado passado.
- Chanina é o nosso poeta da cor. Guacha belezas. Aquarela em tom vibrante.
- Poesia para os olhos. Fiquei boquiaberta, pois nunca tinha visto coisa tão bonita.
- Os versos ou a ilustração?
- O conjunto.
- A página ficou bonita, bem paginada, não ficou?
- Sem dúvida. Tem que ter um certo ouvido para escrever poesia, tem que escandir o verso, falar em voz alta, pensar na sonoridade. Em especial quando se fala de amor.
- Meu fraco: entre a tradição e a modernidade, a poesia.
- Seu forte, cara. Seus poemas fazem bem para alma de qualquer um, falam ao coração com conteúdo, vestindo as palavras de sons. Transita com desenvoltura entre a prosa engajada e uma empreitada de risco que é a poesia num dia a dia tão tumultuado por que passamos atualmente.
- Porque eu é um outro, dizia Rimbaud. Ele afirmava que o poeta se faz vidente por meio de um longo, imenso e racional desregramento de todos os sentido. Todas as formas de amor, de sofrimento, de loucura, de buscar a si, esgotar em si mesmo.
- Para a qual se necessita toda a fé, toda a força sobre-humana, e pela qual o poesta se torna o grande enfermo, o grande criminoso, o grande maldito, e o sabedor suprema – completa a moça.


- Estamos acostumados também a ensinar filosfia a àqueles que não sabem ler. É o maior barato quando a gente vê o outro refletindo sobre o que você escreve.
- Sei como é.
- Bom ouvir isso. Pode ser lugar comum, mas não canso de dizer que a poesia é a fala amorosa pela qual o poeta tece o amor entre todos os “eus” possíveis para tocar o coração das pessoas, sobre o qual gira o universo literário mais abrangente. Certo ou errado?
- Certíssimo. É também o tema mais explorado na literatura consumida pelas mulheres.
- Suzana, posso dizer que você é a mais graciosa das minhas leitoras.
- Graciosa?
- E não é?
- Bobo. Sabe de uma coisa, um dia gostaria de ler uma poesia sua antes de ser publicada.
- Por quê?
- Nada. Esquece.
- Fala.
- Queria ser a primeira leitora a sentir seus versos.
- Interessante.
- Posso ou não posso?
- Claro.
- Por que não publica um livro?
- Acho que ainda é cedo para procurar uma boa editora.
- Medo da rejeição?
- É. Sei que a publicação de um livro por uma editora respeitável é difícil. Os editores se emocionam com a poesia. A gente manda os originais. Passa o tempo e nada acontece. Dizem que poesia não vende livros. Mas, acredito que se for bem lançado, dá sim.
- Também acho.
- As pessoas não compram o seu talento, compram e contratam o seu sucesso no momento. Por isso, para os aspirantes a escritor, a resposta é sempre a mesma: não. Conheço tantos com investidas infrutíferas para publicar seu primeiro livro.
- Ouço dizer que manuscrito rejeitado dói tanto quanto amor não correspondido, verdade?
- Eu não sei.
- Ora, Math, se não tentar... E depois, você tem bom acervo de publicações literárias em jornais.
- É diferente. Em coisas de literatura muito mais rigor na arte.
- É.
- A idade me leva a ser mais cuidadoso, cada dia mais. O escritor francês Raymonde Queneau, autor de “Exercices de Style”, narra a história de dezenas de modos diferentes de cartas de recusa da editoras, enfadonhas, padronização e nada pessoal. É incrível!
- Dose
- Ninguém lê coisa nenhuma. Conheço autor que, a fim de testar as editoras, enviou originais com folhas coladas. Sabe o que aconteceu?... Retornaram do mesmo jeito.

- Nossa!... É preciso saber que a pessoa colocou muito tempo, paixão e talento, mesmo quando se trata de um texto considerado de baixa qualidade.
- Põe mais nisso. Madruadas insones com café, cobertor nos ombros, um monte de ponta de cigarro no cinzediro, para que um editor pudesse um dia ler o nosso original por vinte minutos. Literatura é um vestibular que não tem lista de classificados no jornal. Nem de suplentes. Talz seja por isso que Drummond disse “os acontecimentos me chateiam”.
Quais os efeitos desse intervenção numa relação já normalmente marcada por amor e ódio, respeito e desprezo?

- Só de curiosidade: sabe qual o autor que mais vende livros nesse país.
- Jorge Amado?
- Tem outro que ganha dele, recebendo uma fortuna de direitos autorais por ano.
- Quem? Fala logo.
- Chico Xavier. O maior fenômeno de vendas de livros no Brasil.
- Deve ser mesmo. Ele tem centenas de livros publicados no Brasil e no exterior.
- São psicografados. Mas, o que recebe vai direto para suas obras de caridade.
- Gosto dele, me conforta ouvir o que diz.
- Pois é, tudo que conquistei até agora, foi na batalha, mas quanto a editar um livro eu continuo à deriva, sem editor.
- Vai acontecer, calma. Sem pessimismo.
- Se alguém me diz que sou pessimista sabe qual a resposta.
- Nem imagino.
- Respondo como José de Saramago: eu sou realista, mas a realidade é que está pessimista.
- É o cara.
- Permanece na sua que um dia os editores vão bater à sua porta e preencher esse hiato entre o desejo e a realização.
- Um dia... Muito bem, muito bem, comprei um mimeógrafo e vou aderir à geração marginal que vem publicando edições independentes para contar melhor a gênese da poesia contemporânea brasileira, sem medo da gozação.
- Rebeldia exposta?
- Esforços de poeta, vínculo de alma. Fiquei possuido por esse espírito e acho que não vou errar de todo, até porque não trabalho para ser um grande vendendor de livros. O que pretendo, verdadeiramente, é fazer bem à alma das pessoas.

Poesias para todos os corações. Há anos dizem que sou promessa, portanto. Agora, estou disposto a correr atrás de qualquer coisa, com as armas que tenho, a conquistar um lugar entre os que tem livros rodando de mão em mão.

- Yes, we Mathier! Para você curtir e tirar seus sonhos do papel
Risos. E Suzana.
- Brincadeira à parte, acho uma idéia genial, dou a maior força. Criar não basta, pois o produto artístico tem que chegar ao público porque a Literatura aproxima as pessoas.


Escritores precisam de projetos. Contudo jamais irão cumpri-los.
Risos.
- Você é novo ainda. Tem uma carreira inteira pela frente

- O poeta endoideceu. Minha idéia é rodar, em letras azuis e cheiro de álcool, alguma peça literarária para circular de mão em mão entre amigos. Estou numa fase boa, tenho que aproveitar.
- Novela, romance?

- Não. Não cabe, penso em lançar em um livro com tratamento gráfico sem luxo, meio artesanal, sabe como é, tipo romance barato, Como em um folhetim. Vou reunir alguns poemas.
- Ótima idéia. Sua estréia como editor-livreiro, parabéns. Um dia será grande, uma voz da literatura brasileira ganhando o mundo.
- Otimista, hein.
- Nome.
- Uni-verso. Eu submisso.
- Bom. Você tem o dom.
- Ex-concretista. Nele deixo a imagem de um Mathier poeta da vanguarda com matriz arcaica.
- Prefiro. Não passaria vergonha em qualquer academia do mundo.

- Veja bem, vou entrar para a turma dos sofridos com produção doméstica.
- Não importa, pelo menos o livro estará em movimento.
- É. Quer saber, não vivo como se estivesse voando por aí. Mas, eu sonho. Sonho com os pés no chão.
- Consciente.
- Mas, tudo bem. Chegou minha vez. Nada foi feito pensando em agradar os críticos literários. Não foco poesia para críticos. Em 1885, o sergipano Sílvio Romero, um dos principais críticos de seu tempo, resolveu desancar um autor. Afiou as garras e atacou para valer. Chamou-o de frívolo, caquético, opilado, sem idéias, um simples “burilador de frases banais”. Para concluir, sentenciou: ele não tinha um romance que marcasse época.
- E quem era a vítima.?
- Nada menos, nada mais do que Machado de Assis. Sim, ele mesmo, que hoje ocupa a posição mais alta na literatura brasileira. Surpresa? Nem tanto. Todo escritor, não importa quão grande ele seja, já teve de agüentar pancadas.
- Sei disso. Mesmo os maiores autores já levaram pancadas. E até os melhores críticos já disseram asneira através de resenhas podres.

- Você acha que não?
- Cada dia eu acho que tem um esgotamento da critica. Os criticos só leem os críticos, não leem mais as obras. Não vejo o dia em que alguém encontre plaquinhas de argila nas quais um resenhador sumério destroça a epopéia Gilgamesh, mais antiga obra literária conhecida. Tem idiossincrático. Aquele que se enquanta na categoria de quem não gosta de nada. É o juiz que expulsou Pelé. Temos alguns, ainda.

- Nem tanto. São importantes, sim?
- Bem, vamos ao que interessa. Não quer me dar uma forcinha na revisão dos originais?
- Pode trazer, sou boa nisso.
- Não se incomoda?
- Claro que não, me emociona. É algo que vai me dar prazer, mesmo sabendo que o que eu faço é um gota no oceano, mas sem ela o oceano seria menor.
- Com certeza.
- Seu livro, para muitas, será uma espécie de refúgio onde as pessoas farão um passeio completo pelo universo criativo da poesia.
- Manera, cara. Caso contrario, posso acreditar.
- Não é um Carlos Heitor Cony, mas posso apostar que vem ganhando nome em Beagá.
- Legal. Math, um rapaz de literatua, um futuro que promete

- O suporte é o que menos importa quando o autor tem o que dizer. E sabe como fazê-lo. Se tiver conteúdo, não vai ser esquecido, lembrando que todo escritor escreve para a posteridade.
- Pode crer... A literatura é uma luta contra a morte, não faria sentido se não de outro jeito. Também nunca é demias lembrar que a determinados gêneros literários esfriam em determinadas épocas, mas a poesia nunca acabou, nunca sumiu. Vez ou outra fica um pouco esquecida, longe do grande público até que volta com força total. Em tempos de repressão política, a poesia fica em voga outra vez e vive grande momento, principalmente na música popular brasileira.
- Claro... Claro...
- Livro curtinho, menos de cem páginas. Artesanal, mas vai provar que também sei ser poeta.

- Não entendi.
- Toda vez que falo que sou poeta, até então desconhecido recebo um olhar de descrença ou gozação.
- Também precisa de tempo para sua boemia ‘né, seu malandrinho?
- Mas só por algumas horas por dia. Por 24 horas não dá?
- Talvez. Melhor, não mais estou no bloco do eu sozinho.
Construímos mais maquinas para armazenar maisinformações, produzir mais cópias do que nunca, mas nos comunicamos cada vez menos.
- Se você não faz parte da grande indústria, o que é o meu caso, é preciso ser original, gostar de estar à margem. Eu me sinto livre para fazer com que meus livros encontrem as pessoas os autores-livreiros, com seus livrinhos mimeografados circulando pelos bares e pontos de encontrados da moçada espalhados pela cidade.
- Olha!...
- A gente sabe do que é capaz, mas precisa de mais oportunidades para mostrar. Não é assim?
- Claro. Claro. Grande passo rumo ao topo colhen do os frutos de quem tem arte nas veias.
- Eu no meu astral preciso dar um melhorada na minha maneira de divulgar meus trabalhos.

-













9.até pag 185

A moça, alimentando expectativas:
- Math, eu tenho uma coisa para lhe contar.
- O que é? – pergunta o rapaz, curiosamente.
- A idéia de trabalhar num jornal me atrai muito.
- Então mudou, não quer ser mais secretária?
- Não é isso... Imagino que emprego de secretária é mais fácil de arrumar. E depois, não dá para ficar esperando uma oportunidade de surgir um emprego assim.
- É... Pode ser. Se quiser, falo de você ao José Otávio.
- Quem?
- Editor no Diário da Tarde. Gente fina. Formou-se em direito, mas nunca exerceu a profissão. Guardou o diploma na fundo da gaveta e foi fazer o que gosta, jornalismo.
- Legal.

- Pode começar fazendo revisão, é o vestibular para quem quer seguir a carreira jornalística.
Suzana sorri, agradecendo com a cabeça.
- Ai, nem acredito. Consegue isso para mim?

- Posso empenhar.
- Que boa notícia!... Adoro ler o Diário da Tarde.
- Bom gosto. O jornal tem marca forte, circula bem. Costumo dizer que ele é igual minissaia, tem tamanho suficiente para cobrir o assunto e curto o bastante para despertar o interresse do leitor, claro.
Risos.
- Ia adorar. Sempre gostei de competir, aceitar desafios. Está mesmo na hora de mudar de vida.
- Então...
- Proposta tentadora. Acha que tem vaga?
- Posso sondar. E vamos ver o que a gente pode conseguir.

- Adoraria. Penso me especializar em entrevistas culturais, como a Clarice Lispector.
- Vai nessa. É um mulher surpreendente. Muito à frente do seu tempo, é claro.
Suzana revela com ênfase:
- Leio tudo escreve na revista Manchete. Me fascina.
- Grande cronista. O notável nas crônicas claricianas é a segurança subjetiva da narrativa. Existe certeza, com efeito, de estar puxando o leitor pelo nariz.
- Também sinto.
- Sem dúvida, estamos diante de alguém plenamente consciente de onde quer chegar, e tranqüila quanto ao jeito de que iremos ler o romance até o fim.
- Isso.
- Clarice é uma cronista tarimbada e conhece como poucos a literatura contemporânea – segura de si, compenetrada, combina refinamento literário com a facilidade de comunicação. Não está sempre certa e, como os críticos destacam, ela não está acima da prerrogativa da nova mídia de recorrer aos arquivos para transformar criticas em elogios. Entetanto, o público de leitores relativamente pequeno que a acompanha inclui quasto todo mundo relevante do Brasil.

- E como jornalista?
- Papa do jornalismo também; entrevista qualquer um que seja sem pauta definida, abolindo os medievais: o quê? Como? Quem? Onde? Repórter dotada de astúcia incrível e consciência de que não se forma leitores críticos com base em fofocas e textos banais, tem presença siolenciosa na média nacional, mas marcante. Encontrou no jornalismo um canal adequado para tanta explosão de vida e curiosidade. Nas mãos um bloquinho de jornalista. No olhar um brilho que demonstra o interesse vivo de uma escritora que investiga a vida assim como ela é. Como no jornalismo nada pode ser desprezado, vez ou outra ele entrevista até personagens desprezíveis.
- Notável.
- Quem colhe planta, escrever é preciso para interpretar a nossa própria existência, é uma terapia de vida, dizia Clarice. Num tête-à-tête, domina facilmente o feeling do entrevistador, tentando transformar o produto final de uma reflexão mais profunda em algo acessível ao público. A beleza absoluta também tem nome e rosto: Clarice.
- Qual o macete?
- Isso é meio intuitivo, mas existem as regrinhas que ajudam.
- Por exemplo?
- Saber o máximo sobre a pessoa antes da primeira conversa. E adotar sempre o silêncio como maneira de forçar o entrevistado a falar.
- Terceira regra?
- Fazer perguntas mais descontraídas possíveis; tudo em ritmo de bate-papo para afastar aquele ar blasé entre o entrevistado e o entrevistador, sem esquecer que a verdade é a essência do jornalismo e tudo sai da intencional frieza de um relato jornalístico.
- Ah!...
- Tem umas perguntas filosóficas que nunca funcionam. Clarice é craque, a melhor do jornalismo. Uma das mentes mais inventivas e podutivas do meio, foi um dos desbravadores do new jornalism no País. Procura fazer perguntas que são específicas em relação a determinada pessoa e nunca perguntas que sempre se repetem.
- Como assim?
- Não-ficção apresentada com vestimenta literária.

- Legal.
- E com muita competência.
- Que mais?
- Basicamente isso, sabendo-se que o mundo está cheio de coisas interessantes. Basta ser criativo para encontrá-las e disseminá-las de modo original. Sair bem com o entrevistado, sem agredir ninguém ou falar mal dos outros.
- Óbvio.
- A grande entrevista tem dois lados: entrevistador e entrevistado. Entre eles, o mundo. Pois em um mundo em que o talk é cada vez mais show, é rato encontrar um acordo, equilibrado, cumplicidade, entre quem pergunta e quem responde.
- Concordo.
- O new journalism tentou fazer isso, captar no papel o que está acontecendo, as impressões que tenho daquela situação: com imagem, a expressão do não-verbal é enorme. Não há duas pessoas iguais, é uma das maiores graças da vida. Como entrevistador, me coloco num lugar receptivo, aceitando a pessoa como ela for. Assim, aos poucos ela começa a ficar à vontade e perder o medo de você. Eu sou fulana, a repórter, a entrevista está começando.
Que ótimo!...
- Por isso, eu digo, uma coisa é certa, a qualidade da entrevista depende muito do entrevistado. Tem entrevistado que é fogo. Provocamos e, no entanto, responde um “sim” ou “não”. Deixa a gente doido. Se começar a encher o saco é melhor encerrar.
Seu ser é revelado de forma doce, suave, engraçada, amorosa ou mais contida e interiozida.

- Claro. E ela, como escritora?
- Envolta em muitos clichês. Para alguns críticos é um pessoa completamente alienada. Pelo interesse que teve a vida toda pelo jornalismo, entendeu-se que ele desejava se comunicar com os leitores de uma forma distinta, não só a dos romances.
- Alienada! Você acha isso?
- Não, mas quem sou eu para dar uma opinião desta. Desde o momento em que ouvi falar de Clarice intui que aquele nome falava de forma diferente e tinha intenções diferentes. Mas esse não é o pensamento geral. Clarice é vista, sim, como uma escritora menor. Se você pedir para os grandes críticos brasileiros um ranking dos escritores nacionais Machado vai encabeçar. E o Guimarães, virá atrás. Tudo bem, mas o escritor maior para eles é o Machado de Assis com sua erudição e temas para sempre atuais.

- Como era quando entrevistada?
- Vive dizendo que não gosta de dar entrevistas. Alimenta mitos sobre si mesma para confundir os jornalistas e por pura diversão. Ela sempre esteve comprometida com a realidade brasileira e se identifica com aquilo que costuma chamar de povo latino-americano - o que também pode soar ingênuo.

- No duro?
- Nem precisa se esforçar muito para ver que ela não é fã dessas entrevistas bajuladoras e também não gosta de perguntas diretas. Em parte porque é sempre difícil responder a essas perguntas, mas também porque é uma mulher complexa que não gosta de dar respostas simples. Mas quando permite e descobre uma química entre ela e a outra pessoa é quase despudorada ao falar de si mesma; meio sem papas na língua. Mas já li entrevista dela em que seu ser é revelado de forma doce, suave, engraçada, amorosa ou mais contida e interiozida, depende muito da empatia dela com o entrevistador, isso dosa sua humor. Isso é Clarice.

- E você?
- Eu o quê?
- Gosta de dar entrevista.
- Nada contra.
- Excelente. Tive uma idéia.
- Diga.
- Quero dar uma de Clarice, posso?
- Heim?...
- Isso mesmo, gostaria de fazer uma entrevista com você para testar minha vocação.
- Brincadeira?
- Falo sério.
- Assim, na tora. Um bate-bola?
- Pode ser. Sonhar não custa nada.
- Desse modo... Então, lápis e papel na mão.
- Espere, me fale um pouco do fotojornalismo.
- Tai, importantíssimo na produção da imprensa! Nosso repórter fotográfico, Evandro Santiago, é quem diga. O cara lê na cartilha do fotógrafo francês, pai do fotojornalismo moderno e criador do termo “o momento decisivo”, Henri Cartier-Breesson, que revolucionou a abordagem jornalística com o uso da câmaras 35 mm. Suas foto são recheadas de ousadia, controvérsia e provocações. A do Evandro também, sou admirador dele.
- Legal. Do Cartier-Breesson a famosa foto do Beijo de Paris?
- Não. Aquela é de Robert Donineau.
- Divina. Apesar de preto e branco levou cores e vida para afastar a dor da guerra.
- Só para se ter idéia, acredita-se que, até hoje, inspirou mais casais do que qualquer música de amor, mesmo nos tempos de Edith Piaf, Charles Azsnavour e outros cantores românticos.
- Pô, você sabe das coisas.
- Me informo de tudo, sempre.
Suzana estica o braço direito, pega na estante um bloco de papel almaço e uma caneta. E com os olhos iluminados por um brilho quente, faz sinal com o polegar da mão esquerda.
- Pronto. Posso começar?
- Pode.
- Hiiii! Essa esferográfica está bichada.
- Estragou?
- Pronto, já peguei outra.
- Isso, menina!... No jornalismo o mais importante não é o bloco para anotações, e sim a caneta. Já escrevi uma crônica inteira em folhas secas que apanhei no chão da Praça da Savassi.
- Mesmo?
- Mesmo.
- OK. Farei perguntas bem pontuais.
- Massa. Vamos lá.
- 1, 2, 3 ... gravando.
E com a voz mais empostada, ela:
- Sua vocação sempre foi escrever?
- Sempre. Escrever é minha vida. Tudo que faço é por amor à literatura e por respeito aos meus sentimentos, por meus sonhos, meus leitores. Na verdade, não sei viver sem meus personagens proseando na minha cabeça.
- Quando e como começou sua história com a literatura?
- Nasci alimentando com letrinhas de macarrão. Mas, voltando às origens, costumo dizer que meu envolvimento com a literatura começou quando ainda estava no colo embalado pela voz de minha mãe, dona Filhinha, pois ela nunca deixou de contar historinhas para mim, desde pequeno adormecia ouvindo isso, foi ela que deixou um cheque em branco para mim. Na verdaeMinha sopa predileta era a de macarrão em forma de letrinhas, que gosto até hoje. Memória de afetos. Daí, agarrei os livros e me pus a ler – as obras infantis tem importância significativa no processo de aprendizado e de desenvolvimento das crianças e de adolescentes. Na adolescência, já vivia com um bloquinho e caneta no bolso, em garranchos já rabiscava meus primeiros poemas. Aquilo ficou na minha cabeça desde então, que imaginava trabalhar com as palavras. Só faltava saber como começar. Foi então que decidi conhecer Belo Horizonte e procurei a redação de um jornal. Lá estava o mestre Pedro Agnaldo Fulgêncio que me estendeu a mão. Daí iniciei a vida lidando com as palavras.
E depois de um fôlego prolongado:
- E aí, ao contrário da grande maioria das pessoas, nunca parei de escrever nem deixei de ler os grandes mestres da literatura universal, nem de me entrosar com pessoas do meio cultural, selando um compromisso com o futuro. Sou novo no ofício mas, a partir daí, comecei a construir meu trajeto e, aos vinte e poucos anos, sinto que já estou a caminho de um estilo, coisa que me deixa muito feliz, construindo minha própria estrada sem medo da exposição. Mas, chegar nesse estágio, foi muita luta, até porque não tenho vocação literária impressa nas genes. Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo – ensinou-me uma mensagem que não me lembro o autor.
- Seus textos literários, principalmente poesias, surgem de forma espontânea?
- Acontece. Quando alguém decide ser escritor, qualquer coisa pode servir de inspiração para começar uma estória. Depois da inspiração, de um modo geral, ainda rumino uma idéia por bom tempo. Só depois, começo a desenvolver o tema unindo coisas que aconteceram em lugares e tempos diferentes – transpiração pura.
- Planeja o que vai escrever?
- Para mim tudo pode começar com a imaginação de uma cena, de um lugar, de um caso. Provido de tudo que me instiga, então, começo a produzir minha narrativa – há um momento que tudo vem por si só, principalmente as palavras. Depois, a lapidagem: reescrevo, corto, acrescento palavras, desenvolvo algumas cenas.
- Como escolhe os temas?
- Tanto na prosa como nos versos gosto de me aprofundar em temas da família, da memória, dos encontros e desencontros - evidentemente eu falo do que me interessa, do que me toca, sem nunca esquecer que a ficção é o reino do faz-de-conta... é imaginação. Todo material garimpado processo e repasso a vários caderninhos. A ponta e a cores dos lápis, a caneta esferográfica e a máquina de escrever são imprescindíveis no ritual de escrita. Sempre trago à mão uma caderneta e lápis para as anotações.
- Onde busca inspirações?
- Sou especialista em desvendar a natureza humana. Gosto de bater pernas pela cidade, andar pelas ruas e praças da cidade para falar com as pessoas - viajar nos sons, nas palavras, nas imagens tipo fotografar reações expontâneas de gente anônima - e tirar de cada uma a história que tem para contar; pessoas simples, mas de grande riqueza de pensamentos, que reconhecem o sagrado em cada ser e em cada momento, que pisa o chão com grande respeito. Como bom mineiro, observo as pessoas e tomo nota para criar personagens. Acho que a cidade e seus arredores povoam a memória dos moradores – histórias não faltam à vida desse povo – lembrando Boal: todo ser humano é teatro. As histórias dessa gente são também o que vivemos, no dia a dia e nem sempre nos damos conta. Nesse exercício é que a gente aprimora a capacidade de narrar as próprias histórias como se fossem dos outros e contar as dos outros como se fossem suas. Somos todos um só no lugar nos quais vivo.
- E como é a experiência de escrever uma obra literária ambientada na cidade em que você mora?
- Não sei bem. Sei que essa identificação com ambientes que conheço, favorece a ambientação literária. Nesse sentido, Beagá passa a ser tão universal quanto qualquer cidade norte-americana ou européia que estamos acostumados a ver nos filmes, nos livros ou nas revistas.
- Entre o processo de criação do poeta e do prosador, o que há de diferente?
- Disse-me uma amiga escritora que escrevo poemas em prosa e narrativa com poesia. Na verdade, a partir do momento em que você decide escrever o que conta é ter um bom material literário na mão e talento para enxergar além da superfície das coisas. A poesia surge de forma espontânea, vem quando quer. Com prosa a coisa é diferente. É preciso mais disciplina e paciência, pois é um trabalho de meses ou anos. Penso que escrever se justifica desde que o texto tenha alma e substância que consiga comover um leitor – nem que seja um só.
- Como compõe seus personagens?
- Através da observação de pessoas do povo e da imaginação, sabendo que um personagem tem que ter e respirar vida, ou não é nada. Vivo com um pedaço de papel na mão anotando frases, idéias, pensamentos e até relatos que ouço da boca das pessoas.
- Ainda da identidade dos seus personagens, quanto do autor entra numa obra literária?
- Eu poderia dizer que boa parte é autobiografado, mas não necessariamente na ordem dos eventos reais. É assim, boa parte do que eu escrevo, de uma certa forma eu vivi ou vivo; uma experiência muito rica.
- Qual a importância da literatura na sociedade?
- Lembrando Monteiro Lobato que dizia: “Quem não lê, mal fala, mal ouve, mal vê”. É tudo. O livro é, sem dúvida, um poderoso agente de transformação social. Lamento que o Brasil tenha uma das menores taxas de leitura do mundo, prova disso é a baixa tiragem dos principais jornais do país – em cada mil cidadãos, apenas 45 compram um jornal diariamente. Por isso, crendo que a arte é o motor da vida, sempre que posso, participo de projetos culturais para estimular o acesso aos livros, o prazer de ler e a formação do conhecimento, principalmente às crianças para crescerem cultivando a arte e a liberdade, já são campeãs de leitura. Respirar cultura é essencial porque a arte que tem o compromisso com a mudança do mundo e das pessoas; só a cultura pode transformar a realidade. Diante disso, quero ajudar com minha experiência porque a vida exige conhecimento. É disso, educação, apenas disso que o povo brasileiro precisa para vencer, porque, acredito na vitória do conhecimento sobre a ignorância, a única maneira de promover a inclusão e abolir a segregação – é com base na cultura que se deve plantar a semente da mudança. Sou um utopista que acredita que a arte pode mudar o mundo. Tanto é que, nos meus planos, quando aposentar pretendo sair Brasil afora viajando numa Kombi a promover livros numa verdadeira festa literária para o publico leitor, principalmente criança com pai e mãe que não leram, formando uma massa nova. E estimular o trabalho em salas de aula valorizando o esforço de professores trabalhando em surdina prara cem, duzentos leitores. Tudo isso, confiando que assim a vida de todos seja melhor. A desigualdade social. Já fiz trabalho em salas de aula, estimulando aqueles professores que trabalham na surdina, clamando por mais bibliotecas públicas, acreditando que os livros são instrumentos eficazes para inclusão social. Além disso, os livros estimulam o sonho, a imaginação, a fantasia. Não faço mais por falta de tempo. Não gosto de ver ninguém tratando os outros como inferiores.
- A arte pode mudar a realidade social?
- Não posso dissociar a política da cultura de uma sociedade. A arte toca as pessoas para que elas possam refletir. Tem uma frase de Picasso que diz: ...”A arte é uma grande mentira para chegar mais perto das grandes verdades”. Acredito. Por isso, quero que meus leitores, de qualquer idade e classe social, se emocionem com meu trabalho, imaginando que, no final da leitura de cada peça literária, ele possa dizer: valeu a pena, porque os livros tornam a humanidade melhor, favorecendo ao indivíduo novas habilidades. No fim das contas o livro é muito poderoso.

- Pensa tornar-se escritor tempo integral, um dia viver só de literatura?
- Nunca imaginei que poderia viver de escrever literatura. Mas sei que é isso que todo escritor gostaria de fazer: apenas se sentar diante de uma máquina e escrever, pensar e dar vida numa história. Aqui, no Brasil, uma utopia; pelo menos para 99% dos aspirantes a homens de letras. Portanto, acho difícil fazer disso meu ganha-pão, porque é uma questão muito complicada em nosso país, deixar de ter um salário fixo para passasr a sobreviver somente de free-lancer. E vai por aí. Como literatura não me dá retorno financeiro, tenho que me virar trabalhando como repórter. Por isso, nunca vou deixar de ter outro modo de ganhar a vida para produzir literatura e não depender dela para sobreviver - tenho percepção de que realmente terei uma velhice com algum dinheiro guardado para cumprir essa finalidade - , porque, o que vale mesmo é saber que seu texto foi capaz de atingir um indivíduo do mesmo jeito que o texto de outro me tocou um dia; não deixa de ser uma forte motivação para viver? Por isso mesmo luto a cada dia para ficar mais sóbrio. Meu desejo é simplesmente o de fazer literatura, e só.
.

- Ser jornalista ajuda ou atrapalha o escritor?
- Não creio. A menos que o escritor se deixe sufocar pelo afã opressor do ofício de jornalista. A concisão e a prosa fluída, por exemplo, são exigências do jornalismo, não há um só assunto que não caiba, em sua essência, em uma lauda. Escrever é cortar, e cortar e cortar, isto é ter um domínio absoluto da arte de tesourar e ser tesourado farpas em estado bruto, sem medo da navalha. Não é a palavra que um editor usas, mesmo que a evite a todo custo. Com o tempo ele acababa virando um estilista da recusa: “essa virgula está mal colocada”, este parágrafo pode ser melhorado”, “aqui há uma barriga na narrativa”, este título é impreciso”, por que esconder isso do leitor? Até o drástico “vamos trocar o final pelo começo? Até ponde pode e deve ir a interferência de um editor ao texto de um escritor? Certa vez Ernest Hemingway disse que o jornalismo pode ajudar muito o autor, desde que o autor sabia saltar fora a tempo. Não há como discordar. Mas, não penso romper com o jornalismo tão cedo e me dedicar apenas à literatura, mas sou um desses jornalistas cujo objetivo imediato e urgente é transformar-se em escritor. Ser leitor compulsivo e a lida diária com a palavra favorece o desenvolvimento literário. É muita história.
Eu deixei o jornalismo investigativo lá atrás, mas, pelo jeito, ele não saiu de mim até hoje.


- Como é o ofício numa redação de jornal?
- Numa redação de jornal a gente tem que escrever na correria, no esforço. Ossos do ofício. No dia seguinte, o leitor exigente compra o diário para ler as notícias bem redigidas, sem ter uma palavra fora do lugar ou um termo mal empregado, porque o jornalismo é compromisso com a verdade, ainda que acertar no alvo seja meio utópico, são muitos os interesses, lobbys e mais lobbys, indiscriminadamente. Mesmo assim e apesar do sufoco, fazemos tudo com uma força e uma paixão que só se vê numa redação jornalística.

E depois de uma pequena pausa:
- A vantagem do texto jornalístico é a responsabilidade dividida com vários profissionais, o revisor, o copidesque, o editor. Posso correr com o texto sabendo que qualquer atropelo tem outro profissional para corrigir. Isso não quer dizer que redator pode perder o eixo da matéria que escreve. Nada disso. Ele tem que dar tudo de si no trabalho, porque jornalismo feito sem alma não pode ser bem sucedido.
- Não imagina escrever só para a editoria de cultura?
- Lógico. Cada vez mais me incomoda produzir reportagens, é um esforço de cão e me parece que não compensa; pouca grana. Minha meta é sair da Geral. Mas, por enquanto não posso limitar o que devo fazer. Quero publicar vários livros e artigos e contribuições em coletâneas, no Brasil e no exterior. Esse lado mais intelectual do meu trabalho é o que me dá mais prazer na minha profissão.


- Então, no momento, é estimulado a escrever contos, crônicas e poesias pela paixão pela literatura?
- Sim, poesia me dá muita emoção. Crônicas me dão prazeres, alegrias e parte do meu sustento, mas elas tem fronteiras demarcadas. Contos, ah, é neles que exercito a liberdade de pensar e produzir.
- O que significa o gênero conto para você?
- O conto é uma história contada num espaço menor, que se limita em si e gira ao redor de um só eixo, uns voltados para o entretenimento e outros querem dizer alguma coisa... Gosto de escrever contos que sejam afetuosos, onde os personagens existem e as pessoas possam se identificar e identificar os outros. Nos contos dou mais valor à importância da metáfora como uma figura que possibilita várias leituras e diferentes interpretações. Isso é gratificante.
- Escrever um bom conto é mais difícil que escrever um bom romance?
- Não, não é por aí. A literatura é corrida de longa distância. Sobre o romance Cortázar disse que é uma luta que você pode ganhar por pontos. O conto, não: você só vence por nocaute. O conto salta diretamente na jugular do leitor, como se fosse literatura marginal. De qualquer forma devemos pensar que o texto de ficção é um animal vivo, é preciso encontrar sua respiração, sua consistência, sua pele, sua temperatura – eu não sou capaz de escrever uma estória se nela não existir ao menos um personagem pelo qual não sinta atração física. A composição de uma obra literária pode durar muitos anos de trabalho. O autor passa semanas em busca de uma palavra perfeita, das frases harmoniosas, da estrutura equilibrada. Enfim, deve ser como numa música, com ritmo, harmonia, contraponto, melodia... Escrever é preciso. Em qualquer gênero literário, o que me interessa é a essência da emoção humana, portanto, o modo como se movimenta no jogo, com graça e leveza , mesmo se o tema abordado seja peso mais pesado.
- Tem planos para lançar um romance?
- Um dia, sim. Quem sabe chego lá. O que não se pode é não cair em tentação de um estilo formatado, com receita fácil, intriga leve e sentimentlismo. Com resportagens, crônicas, artigos e contos publicados, espero que, daqui alguns anos, tenha uma maturação em minha escrito para dar inicio ao meu primeiro romance, e ser reconhecido como escritor de fato.
- Quando?
- Um dia. Mas posso garantir que escrevo mentalmente um argumento de romance, cruza de Eça de Queiroz e Machado de Assis. Brincadeira à parte, acredito que é o caminho natural de todo escritor. O conto é um bom trampolim. Se conseguir produzir um bom romance, uma ficção com um certo grau de complexidade, ela pode oferecer vários tipos de leitura. O problema é você classificar. A classificação na literatura é morte. Literatura tem de ser isso, se não for isso não me interessa.
- Prepara-se para ser um vanguadista?
- Eu não acredito mais em vanguada, em romance de vanguarda, o último foi “Grande Sertões, Veredas”, uma verdadeira arqueologia da criação . Não adianta pegar o ideário estético de outro tempo e implantar a fórceps no século XX.
- Com a trama também envolvida em sexo?
- Qualquer boa literatura romântica medieval sabe que amor e sexo estão intimamente ligados ao inferno nas paixões. Claro. Noutro especial interesse por tudo que envolve as relações amorosas, consciente de que o conflito provocado por um homem e uma mulher pode dar uma boa história, A literatura tem de trabalhar nessa corrente de não ter lugar no mundo, o senso de inedaquação é a alma da linguagem literária. Mesmo na Bíblia, no Cântico dos Cânticos, aquele livro considerado pela tradição judaica como o mais sagrado dos livros sagrados, encontramos a advertência da amada, a heroína da narrativa: "filhas de Jerusalém não despertem o amor de seu sono... a paixão é um inferno". Ninguém ama no paraíso, argumento final contra a salvação. Conclusão: todo romance precisa ter, no mínimo, uma fagulha de sexo; senão não é romance - o corpo humano vem em primeiro lugar na existência. Imagina relatar a vida de uma família em que uma nobre senhora é constantemente traída pelo marido... Aí, pode-se imaginar o recheio: intrigas familiares e muito mais: Decarmerão, de Giovanni Bocaccio é uma historia de cornos, de “a” que deu para “b”, que deu par “c”. Mathier acha graça e faz uma lista de outras historias de cornos: Dom Casmurro, Tristão e Isolda, Madame Bobvary, entre outros. E completa, rindo. Suzana, essa de corno não existe, é só uma coisa que botaram na sua cabeça. Mas, sem apelar, deixando as marcas de uma boa narrativa construindo diálogo um amoroso que sacie a alma e o corpo, sem diálogos rebuscados. Despojados sem abrir mão da poesia. É preciso contar o que os outros querem ler.

- Quais são suas influencias como escritor?

- Falar de influência é um pouco complexo. Espelhar em quem? Nos melhores, é evidente, que são Eça de Queiroz, Machado de Assis, João Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, Chekov e outros, muitos outros me influenciaram - Rosa e Euclydes da Cunha, os dois, formam grandes aventuras na minha vida de leitor, como Perceval, Lancelot e outras narrativa medievais, como se fossem histórias de Carlos Magno e dos 'Doze Pares de França' ou do rei Artur e a 'Demanda do Santo Graal'". O ponto de vista mítico mostra as conflagrações locais entre bandos de jagunços a serviço de coronéis, tratadas como novelas de cavalaria. Constróem uma literatua onde os homens que nela não se reconhecem terão oportunidade preciosa de se conhecerem finalmente.

- E na poesia?
- A mesma coisa, depois fui achando meu estilo. A lista é longa, inclui autores brasileiros, latinos, russos, franceses, ingleses... todos com obras de linguagem palpitante, texto denso numa narrativa inteligente e de rápida absorção pelo leitor interessado no palco iluminado da literatura. Ao londo séculos nos inspiraram; essa é a grandeza da arte, dos grandes artistas e das grandes obras. Nunca me furtei reconhecer que extraia inspiração e referências de obras desses escritores. O que você lê na boa literatura, tudo que vê no cinema, tudo que ouvimos; tudo influencia. E muito. Como qualquer adolescente intelectual e pretensioso, tive meus momentos de ler as obras de José de Alencar, tão feitas de combate, repetição e romances movimentados, e depois rabiscava qualquer coisa em imitação amadora. Por exemplo, depois de ler Iracema, escrevi Yara.
- Que legal. E por que esse nome?
- Tem uma historia muito boa sobre história de nomes, quer saber?
- Claro.
- Manuel Bandeira passava em frente a um hotel no Rio que se chamava Península Fernandes. Um dia, entrou e perguntou ao dono o porquê do nome. Sem titubiar o cara disse: Fernandes porque é meu nomem, peninusulo porque é bonito. Yara, primeiro porque é bonito. Segundo, porque estabelec uma afinidade com o romantismo de José de Alencar.
- Ah.
- Influencia a parte, fato mesmo é que desde garoto, na vida real, gostava muito de ler. Iracema, para mim, é um dos três mais lindos romances do romantismo brasileiro, os outros são O Guarany e A Moreninha, de Joaquim Manoel de Macedo. Um detalhe importante: houve no romantismo uma literatura a serviço da literatura genuinamente nacional, que deixou marcas até hoje. José de Alencar foi isso. O romantismo no Brasil começou com ele. Machado, Aloísio de Azevedo e outros foram a contra-corrente. Você vê hoje um renascimento da prosa romanesca, uma linguagem capaz de se apropiar de todas as linguagens e ser um ponto de reflexão.
- Tem outro.
- Tem vários. Mas...
- Aquele romancista mineiro, Bernardo Guimarães.
- Sim, de Ouro Preto.
- Pois é, A Escrava Isaura é um também um grande romance que teve sua primeira edição publicada em 1875. Com o romance, Bernardo Guimarães obteve fama, sendo reconhecido até pelo Imperador do Brasil, Dom Pedro II.
- Bem lembrado. Ele escreveu também O Garimpeiro e O Seminarista.
- Deixa eu dar uma de professora de letras, posso?
- O que vai falar, fessora?
Suzana com um sorriso contido no rosto:
- Bernardo formou-se na Faculdade de Direito de São Paulo, em 1847. Lá, com os poetas Álvares de Azevedo, Aureliano Lessa fundaram a Sociedade Epicuréia.
- Sim. Mas não gosto muito desse norme como movimento literário.
- Deixa de ser bobo. Pois foi aí, nessa época em que Bernardo Guimarães introduziu no Brasil o pantagruélico, melhor dizendo o bestialógico, que se tratava de poesia cujos versos não tinham nenhum sentido, embora bem metrificados.
- Isso mesmo, e sei que a maioria dessa poesia não foi publicada porque era considerada pornográfica.
- Depois de deles, para onde ir?
- Difícil responder. Você pode contar uma história de mil maneiras diferenrtes.Você pode jogar com essas estruturas, com o tempo, como modo de narrar, aí é que está algum tipo de renovação, quebrar modelo. Não na linguagem. Isso tem uma força tremenda. A linguagem nunca é desvinculada de nada, ela é tudo: sociologia, política, filososfia, está tudo ali.
- Qual o melhor dia para escrever literatura?
- O dia que estou bem comigo mesmo. Quando estou de baixo astral nem adianta tentar.
- O que precisamos e o que podemos fazer para avançar decididamente rumo à construção de uma sociedade igualitária?
Precisamos de recursos materiais e humanos, pessoas conscientes, comprometidas e capazes para mudar as atuais estruturas de poder entre os homens e as mulheres nos mais diversos âmbitos: devemos conciliar o trabalho com a família e a vida pessoal - e transformar, com um enfoque em gênero, a economia, a sociedade, as famílias, as empresas, a política e as relações interpessoais.
- Motivo de arrependimento?
-Eu me arrependo de coisas que não fiz. Felizmente não me arrependo de coisas que não fiz. Passou na minha frente, pulo e vou ver. Isso já me levou a fazer mais coisas que eu queria ou a lugares que não eram exatamente onde eu queria ir.
- Religião?
- Não tenho nada muito definido. Sou um ateu místico.
- Devoto do ateísmo? Que isso?
- Religiosidade faz bem. A ciência hoje reconhece que Deus pode modificar seu cérebro, não importa se você é cristão ou judeu, muçulmano ou hindu, agnóstico ou ateu. Se você considerá-lo por um tempo suficiente, algo surpreendente ocorre e o seu funcionamento neurológico começa a se modificar. Para nós, neurocientistas, essa pode ser uma das mais fascinantes experiências humanas a ser explorada – afirmam os cientistas.
- Acredita ou não?
- Se a crença em Deus lhe proporciona um sentido de conforto e segurança, então Deus irá melhorar a sua vida. Já se vê Deus como uma deidade negativa, tal convicção irá lhe fazer mal, levando-a agir de maneira socialmente destrutiva - completa.
- Livro?
- Idade de Razão, de Sartre. Entre outros: O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde. Ah, são tantos. Tantos. Todos, de uma forma ou outra, comungam com Descartes. Quando ele falou: penso, logo êxito, estava querendo dizer: penso, logo penso que existo. É isso.

- Música?
- Sou bom ouvinte. Ouço tudo, desde os clássicos. Só não gosto muito de gafieira.
- O que emociona?
- O amor. O amor próprio, ao próximo e até a falta de amor. É algo capaz de mudar o mundo. Adoro escrever sobre o assunto completamente a favor do amor, da liberdade e da existência de uma geração politicamente sacrificada. Precisamos de mais pessoas que querem mudar o mundo, que se dêem as mãos, que querem ter autonomia de pensamento. Que, diante do mendigo na rua, perceba que políticos roubando não é legal. Minha geração é inteligente, rápida, faz e pensa rapidamente.
- Cinema?
- Aaiaiai... Bom, Bom... acho que o mais importante, entre tantas boas fitas, “E o vento levou” criou o modelo dos épicos que mesclam grandes painéis históricos com narrativas assumidamente românticas.
Seu personagem histórico preferido
- Santos-Dumont. O mineiro Alberto Santos-Dumont.
- O que você detesta acima de tudo?
- O esnobismo do dinheiro.
- Seu ideal de felicidade terrestre?
- Dormir com as mulheres que eu admiro. Felicidade faz bem, a criança vibra.
- Velhice?
- Penso construir um presente interessando que me permita revivê-lo quando for mais velho.
- Morte?
- Encanta-me não pensar. Mas, se me for presenteado com um mal subido, digo que quero me enrodilhar num canto qualquer do mundo e morrer sem consquencia, ir para a morte como quem vai para uma festa ao por do sol. Ou melhor, eu quero morrer como o velho Zorba, o grego, na janela, em pé olhando a iluminada paisagem, dando um grito de despedida. Portanto, principalmente se estiver velho, arranquem-me do hospital, tirem tubos e toda a parafernália tecnológica, porque quero ter o direito de morrer em paz.
- Pensa assim mesmo?
- Comungo com Rubem Alves que diz assim no seu conto: um velhinho querido, de 92 anos, cego, surdo, todas as esfincteres sem controle, numa cama – de repente, um acontecimento feliz! Seu coração parou. Ah, com certeza fora o seu anjo da guarda que assim punha um fim à sua miséria. CTIs para pessoas idosas nada mais é do que CENTRO DE TRISTEZA INDIZIVEIS.



- História da Imprensa no Brasil?
- Tem seu início em 1808 com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, até então era proibida toda e qualquer atividade de imprensa — fosse a publicação de jornais, livros ou panfletos. A imprensa brasileira nasceu oficialmente no Rio de Janeiro em 13 de maio de 1808, com a criação da Impressão Régia, hoje Imprensa Nacional, pelo príncipe-regente dom João VI. A Gazeta do Rio de Janeiro, o primeiro jornal publicado em território nacional, começa a circular em 10 de setembro de 1808, impressa em máquinas trazidas da Inglaterra. Órgão oficial do governo português, que se tinha refugiado na colônia americana, evidentemente o jornal só publicava notícias favoráveis ao governo. Porém, no mesmo ano, pouco antes, o exilado Hipólito José da Costa lançara, de Londres, o Correio Brasiliense, o primeiro jornal brasileiro — ainda que editado fora do Brasil. Foi o chute inicial que rolou Brasil afora de forma surpreendente, apesar de todas as dificuldades. Bastava "um encontro de dois ou três idealistas num café, praça ou mercado onde se trocavam idéias e informação" para que surgisse uma nova publicação na cidade. Os custos se restringiam ao papel e à tipografia, já que os redatores e colaboradores eram arranjados gratuitamente e, em geral, recrutados entre os intelectuais festejados da localidade". Para muitos, escrever em um jornal era "a oportunidade, tão sonhada, de ver publicados em letra de forma os seus ensaios literários". Entre tantas iniciativas em Minas, merece registro especial, foi a iniciativa da senhora Adelina Corroti que produzia quinzenalmente o seu jornal: O Poste. Não dispondo de dinheiro para pagar a impressão, ela escrevia os textos à mão "em uma folha de papel almaço e o afixava nos pontos mais movimentados da cidade". Outros, circulava nos dias de boa maré dos anúncios.
- Liberade de Imprensa?
- Não há nada mais nocivo que um Estado tentar controlar a opinião e o pensamento de seu povo. O jornalismo e a liberdade de expressão não podem ser pensados e tratados de forma separada, isso é uma garantia constitucional; imprensa é a maior inimiga da corrupção. Enfim, sancionada pelo Presidente Marechal Humberto Castello Branco veio para amordaçar a imprensa controlando o acesso às redações de repórteres, editores e fotógrafos - nosso ofício era um fuzil que, em vez de mandar balas, recolhia imagens do país consideradas ameaçadores aos generais, sabendo-se que a imprensa livre abre as portas do mndo para todo mundo, derruba barreiras e democratiza as informações. Em meio à crise, ouve-se explicação atrás de explicação, mas nenhuma convence. Sarna para se coçar, salve, Castello! Um ato que, certamente,
levou à consciência internacional a fratura que atacou o Estado de Direito, a democracia e direitos humanos no Brasil.. Essa barbárie tem que acabar um dia e ser banida do planeta, pois ha 74 anos anos o Jornal do Brasil foi impedido de cirular de 1º de outrubo de 1893 a 14 de novemtro de 1894, período final do governo de Floriano Peixoto. Pior, vejo que única coisa que acontece é que não nada para mudar esse momento. Devemos pensar mais. É preciso ser cauteloso para não estabelecer políticas baseadas apenas em emoções a curto prazo. Devemos refletir o tipo de sociedade que queremos e pensar muito sobre a maneira como pretendemos resolver nossos problemas. - Isso fere o direito da sociedade se manifestar, se defender. Isso é controlar a mídia. Democracia não existe sem liberdade de imprensa.

O que voz falei ao pé do ouvido, publicai-o de cima dos telhados – Mateus






- Drogas?
- Sou a favor da legalização das drogas, mesmo sabendo que pode não ser a solução, mas é questão de saúde pública, não de segurança. Tem que discutir, e muito, envolver a sociedade como um todo. Acho grave não debater um assunto social por uma questão moral. E, evidente, se não tivesse consumo, não teria venda de drogas. Tem que dar opções; se tivesse emprego, cultura, saúde e dignidades, a juventude não iria para o tráfico.
- Alma.
- Vivo pondo em dúvida a existência de alma, chegando mesmo a lembrar que, em certa época remota, os gregos a designavam pela palavra pneuma, que significa ar, sopro, ou seja respiração de quem está vivo. Eisntein também pensa por aí, uma energia. Bem, sempre digo que sou filho da terra e do céu estrelado. O corpo vem da terra e a alma, do céu.
- Lugar preferido.
- Parque Municipal. Ali que faço meu desbloqueamento emocional alternativo, principalmente quando os problemas me afligem de forma mais agressiva. Semple que as duvidas me sobressaltam no meio da madrugada, eu de manhã caminho até o Municipal e peço lincença ao verde para fazer uma visita ao universo mais puro da cidade, local onde mora o sossego. Há os que se postam curvados em direção à Meca e oram. Há o que sobrem os 300 degraus de joelhos da Penha e pedem graça. Há ainda os que colocam mensagens no Muro da Lamentações e esperam. Eu , quando o mundo me condena e de mim ninguém lembra, vou ao Parque Municipal do velho sossego sarar meus perrenques. Peço inspiração, luz para as virgulas ou pasto para que os assuntos se criem.

- Discriminação.
- Não vejo com bons olhos nada que discrimine o ser humano, pela cor, pela raça, pela grana. Ainda ontem, estava lá na sala de Telex com o operador Meira e comentamos muito sobre uma noticia que tinha acabado de chegar pela France Press com o seguinte título: “Escola na África protege albinos de serem mortos e vendidos por até quatro mil dólares. De estarrecer. Na cidade de Mwanza, na Tanzânia, há uma escola Internado chamada Mitinho, que recebia apenas crianças cegas e agora passou a receber albinas. Para segurança delas, a escola teve que ser cercada por arame farpado e vigiada dia e noite. Parece brincadeira, as lá, sangue, pés, mãos, cabelos e genitais de albino são usados em poções mágicas que trazem sorte, reza uma crença antiga. É que, no pais, o cadáver de um albino é cotado em moeda americana.
- Ditadura.
- Voltou. E pior. O ex-presidente golpista que censurou a imprensa de forma sitematicia e mandou aniquliar e torturar os opsitores através do DIP departamento de Imprensa e Propaganda, o que Getulio Vargas tem em comum, além dos bustos estampadas em paredes de Chuí ao Oiapoque. A crônica não diz. Fica como dever de casa aos estudantes simpáticos amotnados nesses grupos revolucinaram que querem tirar uma ditadura e colocar outra. Essa gente não larga o osso. Eles odeiam a democracia e se conseram os agentes heróicos da história.



- O Brasil de hoje no plano político?
- Vivemos hoje o pecado da ditadura. Mal. Muito mal. Uma diarréia mental. Estamos num mundo de silêncios. A ditadura quer a todo custo calar seus opositores e transformar o Brasil submisso ao poder das forças armadas, empurrando a democracia ladeira abaixo. Desde o golpe de Estado de 1964, quando os militares tomaram o poder e implantaram outra ditadura no Brasil, tendo como fio condutor o processo político. Hoje no poder Costa e Silva, um bronco que padece de uma “insuficiência intelectual profunda” nos mostra o que vem por ai como o AI-5, anunciada pelo locutor Alberto Cury e o ministro Gama e Silva nas últimas horas do dia 13 de dezembro, colocando a nação de cabelo em pé com o polêmico ato marcando o recrudescimento do Governo Militar. Repugna-me ver essa ditadura militar, cercada pelas caras raspadas da boçal sabedoria de generais de ultra-direita,empurrando goela abaixo dos brasileiros um Brasil totalmente sem liberdade de expressão.Nada mais é do que um poder regressista nos jogando de marcha-ré para os anos 30, fazendo-nos engolir a herança maldita do autoritário e corporativista de Estado que vigorou 8 anos sem interrupção desde 1937, o Estado Novo. Agora, com a bala no tambor, o dedo no gatilho e o poder concentrado nas mãos do batalhão da linha dura, pondo o Brasil de pernas para o ar. Impacto em toda a nação, um golpe dentro do golpe. São as as máscaras da Ditadura. Um dos primeiros a ser caçado e preso foi o deputado e ex-presidente Juscelino Kubitschek, Presidente bossa nova dos anos dourados. Pasmem, senhores, enquento o cidadão se apaga, literalmente, aquela gente verde-oliva cresce em tamanho e influência.
- Quem mais?
- Carlos Lacerda e muitos outros – o governo quer silenciar o que não pode ser silenciado em nome da liberdade democrática. E joga os holofrotes para a frivolidade e o confronto entre o que é democrático e conservadorismo extremo. Sinal que a barra pesou mesmo: se alguém sair da linha, vai preso. Na imprensa, a tensão é maior, porque, a censura é brava. Ainda bem que, contra essa asfixia democrática, o povo brasileiro tem reagido de forma heróica, debatendo a ditadura e pedindo a volta da liberdade política. Anseio popular, aumentando manifestações de rua, mesmo violentamente reprimidas com bombas de gás lacrimogênico. Não viu a passeata dos “Cem Mil”, no Rio? Imagens que escondem mil palavras, o povo resolveu botar para quebrar.
Não é figura de linguaem e muito menos coincidência; foi a tentativa do Rio Center que incendiou o povão. O tom político marcou a passeata dominada não só por militantes da esquerda, mas por dezenas de milhares de brasileiros provando que o Brasil é mais do que o pais do futebol, do samba e do carnaval. Ali tinha grupos de defesa do meio ambiente, das centrais sindicais e representantes de vários setores da sociedade, mostrando que o brasileiro precisa de união em tempos como esses. Tanto que marcharam em silêncio, numa barricada de resistência de esquerda aos anos de chumbo no Brasil. Em suma, persiste o obscurantismo que tenta a todo custo impedir qualquer manifestação contra o regime. Mesmo assim, o povo lotou as ruas e não se curvou ao autoritarismo. Anote, não será um capítulo perdido, mesmo sabendo que o futuro pode não ser mais como era antigamente. Não se iluda, não acabou a sessão de caça, ainda tem poeira baixando.
E depois de um suspiro nervoso:
- O que me irrita, como bípede racional, é ver a polícia infiltrada no meio dessa gente descendo o pau em todo mundo na rua; muitos mal sabem o que está acontecendo direito, provocando estilhaços em todo mundo. O povo pena. Falta estrutura, sobra violência. Isso coloca o Brasil na vanguarda das ditaduras mais violentas comandada pelo furacão Costa e Silva, o General de Ferro que faz o que bem entende no poder. No fundo acredita na bondade de um regime que mente à sua própria população. Nós, os humanos tupiniquis que apertemos o cinto, a liberdade encolheu e, pelo visto cada dia encolhe mais. E muito. Bola mucha, fim da picada! O Brasil é feito para matar. Mas, pode acreditar, querendo ou não, esse disco vai virar porque o Brasil tem um futuro inteiro pela frente, nós ainda vamos chegar à modernidade de um Brasil com base sólida que vai nos dar muito orgulho. A década que não acabou. Pode crer.
- Essa busca por justiça socialdeve ser feito dentro de um sistema democrático.
Claro, a democracia é a coisa fundamental. O grande problema do socialismo é que ele não é democrático. Temos que lutar por um sociedade mais justa, mas sem a ilusão de um solução imediata. Kafta dizi que o homem perdeu o paraíso por impaciência. Precisamos ter sabedoria de entender que as soluções são complexas e demoradas

- Muito bem, para terminar, o marxismo, como disse Sartre, é “pensamento insuperável de nosso tempo”. Concorda?
- Sem dúvida nenhuma. Com a queda dessas ditaduras militares, em minha opinião, vai surgir o capitalismo contemporâneo, reatualizando a necessidade do marxismo como instrumento para digerir e interpretar seu funcionamento e ajudar a tecer os instrumentos de sua própria superação. Nesse sentido, o marxismo como método dialético, segue sendo insuperável. Bola cheia.
- Ótimo, mocinho, ótimo – aplaude Suzana de pé.
E, com os olhos mergulhados numa afetuosa e curiosa expressão, ela quis saber:
- Saí bem, Math? Saí?
- Muito. Melhor, impossível. – responde o amigo abrindo mais o sorriso.
- Jura?
- Tem traquejo, garota. Mergulhou nos assuntos. De inicio, o papo abordou a literatura. Mas a entrevista cobriu vários terrenos. Tem determinação, isso é bom.
- Tentei.
- Possui os atributos indispensáveis para exercer o jornalismo. Você mostrou cultura, noções de arte, intuição, persistência. O resto é contar com um pouco de sorte e muito suor.

- Obrigado, querido.
- Munida desses pré-requisitos é capaz de vencer as agruras do dia-a-dia da profissão de repórter. Portanto, se depender de mim, está contratada.
- Não seja tão bonzinho que posso acreditar.
- E deve.
- Tudo bem. Tudo bem. Tomara que dar certo.Vou redigir a matéria e depois lhe mostro.
- Jóia. Foi muito legal ter sido entrevistado por uma ‘foca imbuída de tanta curiosidade. E com estilo de sobra. Tem inclinação para isso

Mordendo a ponta da caneta, Suzana:
- Foca!... Como assim?
- Nome que se dá a quem inicia seu trabalho numa redação de jornal.
- Ah, sim.
- Quem sabe é a chance de você entrar no universo do jornalismo e mudar sua narrativa de vida e resgatar a sua historia?
- Posso exercer sem ter o curso de jornalismo?
- Ainda pode. Não é uma atividade regulamentada. Para muitos não é profissão, é bico.
- Mas, já tem escolas.
- Aqui e em várias universidades do Brasil. Só para você ter uma idéia, a Gasper Líbero, em São Paulo, criou seu curso em 1947, mesmo sem exigência de diploma.
- É. Se é assim.
- Jornalismo não só técnica. O que interessa para a socieade é um jornalista crítico e transformador e que saiba transmitir bem a notícia.
- Ai, nem acredito!...
- Antes de tudo, digo: não se assombre. Fique na sua, principalmente se sua praia for literatura.
Risos. Mathier, ainda surpreso com desempenho da amiga:
- Vida de repórter é desgastante, mas dá muito prazer nessa luta de busca pela verdade.
- Ah!... Tenho comigo que é a melhor profissão do mundo, sempre apostando em boas histórias.
- Pode não ser, mas dá grande oportunidade para a gente crescer. É uma escola.
- Claro. E eu quero ser você quando crescer. Existir e produzir coisas.

Depois de um riso sonoro, Mathier:
- Considero-me o cara mais sortudo do mundo, posso dizer que tive a sorte grande, venci duas vezes; imagina quantas pessoas mereciam sonhar trabalhando num bom jornal diário e fazendo crônicas. Temos desafio a todo momento, muita ralação. Mas gostamos disso. É o que mais gosto de fazer. Um longo caminho, um longo desafio.
- E como chegou lá.
- Rapazinho do interior, gostava de folhear jornais, admirar o livro como objeto e cultivar um bate-papo focado em cultura. Aqui chegando, com a idéia fixa de trabalhar em um jornal, procurei o diretor Pedro Agnaldo Fulgêncio, mostrei uns poemas e ele me ofereceu um estagio. Assim que tudo aconteceu. Comecei a fazer jornalismo por uma grande vontade de mudar o mundo. Não mudei de idéia. A palavra tem o poder de incomodar. É um instrumento poderoso para pensar o mundo hoje. E o que mais a imaginação mandar.


- Eu só falo o que penso, mas prometo dividir com você a idéias. E ai vamos juntos.

- Fico honrado. Dizem os analistas que cada um de nós tem uma singularidade, uma espécie de gênio que pede para ser vivido. Segundo eles, a vida nos faz constantes chamadas até que esse gênio possa expressar-se. Mas ele pode ser adiado, evitado, não ouvido.
Tenta esconder as lágimas mas a alegria não deixa
- Meu geniozinho, quanto mais a gente conversa mais eu admiro você. Fique sabendo que, lá no infinito de meu campo de desejos, tem algo me dizendo que seria muito bom trabalhar com você.
- É muito bom trabalhar com as pessoas queridas.
- Que bom que estou entre elas.
- Na ponta.
- Vou adorar... Imagino que você trabalha de forma muito doce e tranqüilizadora, nós nos entendemos perfeitamente – conta a moça.
- Se é assim, vamos fazer um brinde ao que está por vir para mim.
Mathier levanta o copo na ponta dos dedos.
- Tim-tim ao seu sucesso.
- Tim-tim.
- Eu também. Assim, perto de você, posso ver seu desempenho. Mas, cá com meus botões, volto a pensar no que José Renato pode pensar vendo você trabalhar em lugar que atrai a atenção dos homens.


- De maneira alguma. Ele precisa reciclar, nem sua mulher entende mais.
- Pode ser.
- Já disse, estou noutra. Deixe o carinha para lá – pede Suzana.
E cheia de alegria, deslumbrada.
- Então?
- No fundo admiro sua persistência, determinação. Então é transformar o pensamento em ações. Seguindo o rumo da literatura é que estou aqui trabalhando numa redação de jornal. E posso dizer que ralei muito para chegar onde estou, a prática ainda é importante.
- Só é! Vou agarrar a oportunidade com as duas mãos e entender os desafios de ser uma dona de casa dedicada e boa profissional ao mesmo tempo.

- Minha futura jornalista, acho incrível essa conjugação de esforços para vencer na vida de forma independente. Essa é o retrato da mulher possível no futuro, pode crer.
Suzana faz sim balançando varias vezes a cabeça. Mathier pergunta.
- Viu nas bancas o lançamento de uma nova revista literária?
- Não. Como se chama?
- “Inéditos”.
- Gostei do nome. Bom para que fica de fora do Suplemento.
- Não exite um lada de fora, o que ocorre é que mais espaços vão sendo criados.
- Tem razão.

- Muito boa e já estreou com um corpo editorial antológico.
Pela revista circulam os mais diversos autores e tendências.
- Essa é a linha?
- Sim. A revista, segundo seu editor, nasceu com a proposta de não privilegiar um grupo, um estilo, muito menos um conceito de arte ou de uma geração.
- Maravilha!...
- Ela veio para ser um sinônimo de literatura brasileira e revelar novos talentos.
- Vou comprar.
- Não precisa. O editor é o Vladimir, meu amigo. Trago uma revista de cortesia para você.
- Você é mesmo um anjo.
- Toda história, já dizia Einstein, não tem futuro, presente, nem passado. Ela acontece sempre. E é agora.Tudo passa.










10.

Mathier, depois de espetar uma azeitona:
- Quem mais gosta ler?
- Hummmm... são tantos! Embora seja muito difícil escolher um livro preferido sendo professora e pesquisadora de literatura, o meu clássico é, presenteado por um irmão de sangue, o livro “Fernando Pessoas – Obra Poética”, exemplar que há anos me acompanha em casa, no Estadual Central onde leciono, nas viagens e até no bonde.
- Parabéns. O que alimenta a alma mesmo é ler uma boa poesia.
- Também leio Fernando como quem busca um ombro, a obra desse poeta é uma grande lente afetiva.

- Máximo de experiencia estética e de construção da linguagem. É um autor, poeta e prosador, que nos facilita a entender o homem como invenção, a linguagem como criação e a matéria vida, como cenário transitório da existência.
- E em prosa?

- Sem dúvida, meu livro de cabeceira é Grande Sertões Veredas, de Guimarães Rosa. Gosto de paixão. Ele fez do realismo mágico algo mais importante e reconhecível só que jamais havia sido, embora elemento de realismo mágico sempre tenham existido na história da literatura.



- Boas escolhas. A poesia de Fernando permanece moderna, não envelhece. Pessoa amava a poesia como quem amava uma mulher.
- Como um monge calmo a Virgem Maria... completa Suzana lembrando um verso do poeta português.
- Belíssimo.
- Há um livro dele ao qual sempre volto quando busco inspiração: O Livro do Desassossego”. O impressionante é que é uma obra tão particular e tão universal
- O máximo. Na verdade, os textos do poeta português oferecem uma viagem de fuga, mas um encontro quase mágico que nos permite conhecer esse poeta, que descreve sentimentos como quem descreve o mar.
-.

Obra de Guimarães Rosa é exemplo de inteligência e erudição sem perder a capacidade de emocionar. É um clássico escritor latino-americano que mostra extraordinário otimimo sobre o continente, o que cria um contraste interssante. Volume Grandes sertões revela a alma pensadora.


Após 100 anosk, a obra de Guimarães Rosa permancerá atual. Profundidade do pensamento e domínio da forma literária marcam produção do mineiro autor Grandes Sertões Veredas. Os outros autores do boom estavam interessados em fantasia e na mitologia do continente, mas não conseguiram conjugá-los como Rosa fez em Grandes Sertões, Veredas. Mais que um autor latino-americano, ele acabou se tornando o arquétipo do escritor terceiro-mundista, com se diz.


ILUSTRADA 50 ANOS: 1967 - Guimarães Rosa morre após entrar na ABL
A capa da Ilustrada de 21 de novembro de 1967 estampava o título "Guimarães Rosa previu a própria morte". O autor de "Grande Sertão: Veredas" havia morrido dois dias antes, em decorrência de um infarto.
Nogueira Moutinho explica que o escritor nascido em Cordisburgo, Minas Gerais, era bastante supersticioso e que era tomado por um sentimento de urgência quando começava um novo livro.
Guimarães Rosa temia morrer antes de completar o trabalho.
Rosa também receava assumir a cadeira na Academia Brasileira de Letras.
Adiou a posse em quatro anos, porque não lhe parecia de "bom agouro" o ingresso à imortalidade. Três dias depois de entrar para a ABL, seu coração falhou.
O autor do texto ainda compara o trabalho de Rosa ao de um outro imortal, Machado de Assis, tanto no uso da linguagem, quanto no papel central desempenhado na literatura brasileira.

João Guimarães Rosa

"Quando escrevo, repito o que já vivi antes.
E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente.
Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo
vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser
um crocodilo porque amo os grandes rios,
pois são profundos como a alma de um homem.
Na superfície são muito vivazes e claros,
mas nas profundezas são tranqüilos e escuros
como o sofrimento dos homens."



- Agora, Guimarães...
- Amava o sertão mineiro como se ele fosse do tamanho do mundo.
- Mais do que tudo.
- Penso que esse é o principal interesse da obra do Guimarães Rosa, que se centra em torno desse sertão. Visto de três perspectivas diferentes, mas três perspectivas que se entrelaçam na tecitura da obra, e que só nos permite fazer esta distinção para efeitos de análise", declara a professora.
- Maravilha.
- Esse, Math, eu leio com atenção especial, com o coração. Me indica as origens; sou de Cordisburgo.
- São parentes?
- Distantes.
- Esperta, hein! Como escolheu essa cidade para nascer?
- Uai.
- Poderia ter nascido em Curvelo, sei lá.
- Mas nasci, como Rosa, em Cordisburgo. Só que ele é um filho da terra que nasceu com alguma alteração genética que o fez transceder e derrotar, década após década, o desafio de permanecer contemporâneo e, ao seu modo, revolucionário. Ali ele conheceu seus persongens.
- Um deles eu conheci. O Juca Bananeira.
- Vive lá. Hoje se dedica a ser um bom jardineiro. O extraordinário sobre Rosa é que, se você conhece as pessoas com quem ele conviveu, vai encontrá-las em cada página de seus livros. Mas, por outro lado, isso é trabalhar por uma imaginação incrível, uma necessidade de transformar tudo em históri e dramatizar os outros e a si mesmo.
- Ah, sim. Meu Deus, que entusiasmo para falar do conterrâneo!
- Rosa derrotou o tempo, era isso visival no rosto dele. A vida aparelhou esse homem com amor, inteligência, disceninmento, talento e coragem. E ela devolveu isso para a vida, através da mesmo coisa que o libertou e alimentava – a arte. Rosa descobriu no ofico de sua profissão o segredo da vida. E ensino isso para que quer aprender.
Mathier ri. E cheio de certeza:
- Parabéns. Guimarães Rosa e Fernando Pessoa são autores que você lê duas, três paginas e tem no que pensar durante um mês ou mais. Concorda?
- Totalmente. Rosa é completo, deixou um legado extraordinário. Do tamanho de sua vontade.

- Duas décadas é pouco para avaliar o legado de um autor. Que, no caso dos maiores, costuma ser medido em séculos
- Os cinco livros que publicou em vida formam uma obra desigual, mais são suficientes para afirmá-lo como um dos mais vigorosos escritores em língua portuguesa do século XX.
- Não discuto o mérito. Nem nego sua coragem, paixão e fúria em reescrever o sertão mineiro com tanta imaginação, transitando com facilidade entre o universo popular e erudito, mesmo sem ter freqüentado escola para isso. A paixão pelo conhecimento levou o escritor ao eximinio coletor de dados - tudo anotadinho em vários cadernos. Nada do que via ou ouvia escapava de seus registros: geografia, botânica, zoologia, numismática, versões sobre doutrinas esperituais, causos, quadrinhas, provérbios e, sobretudo, expressões populares. Assinalava todas as coisas, ou fatos, ou sentimentos com capricho e gosto, principalmente e apenas homens primitivos.
- Capricho e gosto!...
- Era vaidoso até nisso. Não escondia de ninguém que a ponta e a cores dos lápis, a caneta tinteiro e a máquina de escrever eram imprescindíveis no seu ritual de escrita.
- Conhece mesmo a vida de Rosa!
- Esqueceu, tenho o sangue dele nas veias. Em novembro, completou um ano de sua morte, ou melhor de seu encantamento. Sentimos muito. A afinidade dele com a família era muito grande.
- Eu também. Sem dúvida, foi um homem de uma cultura inigualável, de finos tratos, além de tudo, era uma pessoa simples e avesso a badalações.
- Grande Sertão: Veredas, com todo seu malabarismo verbal, foi escrito em Paris, sabia?
- Sei. Para ele o sertão era metafísico.
- Tem gente que detestou o livro. Entre eles, o poeta Ferreira Gular que não agradou nem um pouco de Grande Sertões. Achou tudo muito chato e caipira.
- O que ele disse?
Mathier repete, condoído:
- Li setenta páginas do Grande Sertão Veredas. Não pude ir adiante. A essa altura, o livro começou a me parecer uma história de cangaço contada para linguistas.
- Disse bobagens, asneiras. Muitos escrevem sobre Guimarães Rosa, mas poucos leram suas obras, o caso da Gular – aponta Suzana.
- Sim, claro. Falar de Rosa é fácil, tem uma biografia interessante, exótico e está fazendo o maior sucesso lá fora. Grande Sertões Veredas, lançado em 66, os críticos já o reconhecem como uma obra prima.

- Digo sempre aos meus alunos que Guimarães Rosa deve ser lido sem pressa, curtindo cada palavra para buscar inflexões e sentidos não percebíveis à primeira vista, concorda comigo, Math?
- Ah, sim. Ler as obras desse autor é mergulhar em quase outros dialetos e descobrir um mundo de magia e encantamento do vasto universo Brasil sertanejo.
- Um detalhe. Peço sempre aos estudantes que, se possível, iniciem a leitura de Guimarães Rosa começando pelo sonoro conto A Hora e a Vez de Augusto Matraga, última estória de Sagarana; verdadeira partitura poética. Só segui-lo, é um exato close reading. Por isso mesmo, esse clássico vai ficar para sempre na memória da gente.
- Traduz.
- Close reading é uma expressão que pode ser traduzida como leitura atenta ou leitura densa.
- Esnobe. Precisa inglesar?
- Não, não precisa. Desculpe-me. Enfim, é o mesmo que o professor Moacyr Laterza, em suas aulas de filosofia, chamava de leitura estática, em oposição à moda da leitura dinâmica.
- Está desculpada. Guimarães Rosa vive surpreendendo a gente mesmo. Tempos atrás, lendo seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, em 1963, ao ocupar a cadeira de Coelho Neto, revelou ter afinadade estilística com seu antessessor.
- Mesmo?
- Lógico que fui conferir. Vi, que de fato, Guimarães foi fundo na obra de Coelho Neto.
- Prometo ler o autor maranhense e recomendar aos meus alunos.
- Em novembro, precisamente dia 19, comemaramos dois anos que ele se encantou. Dois dias depois a Folha trouxe na capa da Ilustrada uma matéria muito boa e curiosa sob o título "Guimarães Rosa previu a própria morte". E no lead: “A literatura da língua portuguesa perdeu, anteontem, o seu maior escritor deste meio-seculo: João Guimarães Rosa”.
- Morreu novo, tinha apenas 59 anos e faleceu em decorrencia de um infarto.
- Sem Rosa. Morreram Guimarães Rosa, João encantou-se.
- São vários numa só pessoa, ‘né? Por mais incrível que pareça, Rosa receava assumir a cadeira na Academia Brasileira de Letras. Adiou a posse em quatro anos, porque não lhe parecia de "bom agouro" o ingresso à imortalidade. Três dias depois de entrar para a ABL, seu coração falhou.
- Sabia que toda vez que começa um livro era tomado por um sentimento de urgência?
- Sim. Era bastante supercioso. Guimarães Rosa temia morrer antes de completar o trabalho.
- Parabéns. E hoje, menina, o que está lendo?
- O Primo Basílio.
- Eça!... – surpreende-se Mathier.
- Sim, Eça de Queiroz com a singularidade legitimamente portuguesa, com certeza.
- Sou uma espécie de prima de Luisa, só que um pouco mais autoconsciente, posso garantir.
- Pelo jeito devorou o livro.
- Amei. Li várias vezes e vou permanecer com ele na cabeceira.
- Muito bem. Muito bem.
- Não foi o Eça que disse que se lê para viver?
- Foi?
- Gosto da ficção portuguesa, mas a francesa também me fascina – suspira Suzana.
Mathier com entusiasmo:
- Zola... Balsac... Flaubert... Victor Hugo... Prevert... Sartre... De fato, são muitos. Muitos.
- Também li e continuo lendo a literatura pós-romântica russa.
- Boa pedida, muito, muito boa mesmo. O século 19 na cultura russa foi surpeendente pelas grandes obras literárias e musicais que produziu. Época de ouro. A intentsa renovação que ocorre desde o início do século passado nasce a crença na modernidade, artística e social, nas suas capacidades de transformadoras. Além de alguma coisa que não se explica: um sopro coletivo de gênio. Basta ler as obras de Pushkin, Dosoyevsky, Tolstoy, Turgenev, Chekhov, Gogol, entre outros que, cada a seu jeito, tem o país como sua grande tela.

- Tolstói!... o gigante russo da obra Guerra e Paz. O livro Ana Karenina então é absolutamente atual, um narrativa de muitas faces. Fico impressionada em ver como é presente, extraordinário. Uma das obras mais impressionantes produzidas no século XIX, pois suas análises críticas, micrológicas, dos mais diversos aspectos da experiência contemporânea se conjugam com um estilo filosófico dificilmente encontrável em livros de literatura; quase poderia dizer que esse é o meu livro de cabeceira. Luxo russo. Para mim, é a maior obra literária já produzida em toda a história da literatura universal, que continuam a vender milhões de cópias por todo o mundo. Enfim, lemos um clássico para saber quem somos.
- É o que penso
- Sabia que, aos 50 anos de idade passou por uma crise espiritual profunda, definindo seus romances de tolices e surpreendeu o mundo ao doar seu patrimônio aos filhos e se dedicar para o resto da vida aos estudos filosóficos e religiosos.
- Não, não sabia. Excentricidade é mesmo coisa de gênio!
- Será?

- Dizem. Tolstói e Shakespeare são melhores do que quase tudo o que a humanidade produziu em literatura.
- Não sei se concordo, mas... E, de nossa terra tupiniquim,
o ponto mais alto e mais equilibrado da prosa brasileira acha-se na ficção de Machado de Assis, inquestionavelmente, todos bebemos nessa herança de gigante. Concorda?
- Concordo, sim. Machado deixou um legadoliterário extraordinário e uma história de vida feita de superação.
Há uma violência ali, enorme, mas há também um mergulho na subjetividade, uma vontade de estilo. - Nos contos Machado é um gênio. Aí, de fato, ele não deve nada a qualquer contista do mundo, falo sempre isso aos meus alunos. Que a obra de Machado ainda encontre admiradores é sinal duplo de pertinência: as páginas são um convinte à beleza literária e são necessárias.
- Claro. Claro. Os estudiosos da obra machadiana tem revelado nos últimos anos que, não só como ele explorou as contradições do Brasil, mas outros temas, com a loucura, uma coisa nova naquela época.


- O cara era mesmo incrível; uma forte inspiração para todos nós. Facil perceber que, em cada um de nós brasileiros, habita um dandy de Machado de Assis e o jagunço de Guimarães Rosa. Bentino e Riobaldo. Criaturas de Deus e do Diabo que, nafantástica confusão das identidades, ainda permanecem e para sempre inconfundíveis.

- Sem dúvida, Math. Ele, embora faça uma busca de identidade brasileira, como a do José de Alencar, virou um retrato do Brasil e tornou-se universal, como bandeira da Literatura, sem forçar um trocadilho aí.

- Percebi, cara. O importante é que segue vivo na sua mais completa tradução; seu legado viverá para sempre em nossa cultura como uma constelação para nos orientar a vida inteira. Machado de Assis, sem dúvida, é o maior. Passei a gostar de escrever lendo o Machado também.

- Repito isso aos meus alunos, sempre. Mostrando a eles que proeminentes escritores contemporâneos, como o próprio Guimarães Rosa, discute sua influência na literatura brasileira, afirmando que com o legado deixado pelo autor de Helena, sem dúvida nenhuma, é o escritor-pai e mestre de todos nós.
- A obra do escritor abrange, praticamente, todos os gêneros literários. Na poesia, inicia com o Romantismo de Crisálidas (1864), Falenas (1870) e, mais tarde, em 1901, Poesias completas. O poeta Machado também passou pelo Indianismo em Americanas (1875), e o Parnasianismo em Ocidentais (1897-1880). Paralelamente, apareciam as coletâneas de Contos fluminenses (1870) e Histórias da meia-noite (1873) Papéis avulsos (1882); Histórias sem data (1884); Várias histórias (1896); Páginas recolhidas, contos, ensaios e teatro (1899) e Relíquias da casa velha, contos, crítica, teatro (1906). Paralelamente, Machado de Assis entrou na grande fase das obras-primas, que fogem a qualquer denominação de escola literária e que o tornaram o escritor maior das letras brasileiras e um dos maiores autores da literatura de língua portuguesa, publicando romances como Ressurreição (1872), A mão e a luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878), considerados como pertencentes ao seu período romântico, além de Iaiá Garcia, (1878); Memórias póstumas de Brás Cubas (1881); Quincas Borba (1891); Dom Casmurro (1899); Esaú e Jacó, romance (1904); Memorial de Aires (1908).
- Bravo. Conhece bem a obra do cara.
- Nem tanto, admiro muito. Perdoe-me, esqueci de citar Outras Relíquias e a comédia Tu, só tu, puro amor, comédia, de 1881.
- Pelo jeito é um especialista da obra de Machado.
- Não chego a tanto. A modernidade de Machado me surpreende muito. Tanto que acho que deve ser revista a forma como o escritor é apresentado em algumas escolas.
- Que tem de contra?
- Sei não, mas pelo que vi quando cursava o ginásio e mesmo no clássico, o escritor sempre foi.— Machado de Assis vive sendo empurrado goela abaixo dos jovens, e essa obrigatoriedade gera leitura burocrática. Bolas tem que desencaretar esse processo.
- Tem razão. De minha parte prometo mudar o angulo dessa visão.
- Parabéns, Suzana. Vai ter muita surpresa e seus alunos vão adorar.
- Deve considerar ou não a velha dúvida: Capitu traio bentinho ou não na sua opinião?
- Tai, essa dúvida é um elemento de extrema modernidade na literatura. A história se passa no Rio de Janeiro do Segundo Império e, naquela época, a sociedade brasileira era cheia de moralismos e preconceitos, por isso, ele cria uma narrativa na qual a dúvida é mais importante que simplesmente “sim” ou “não”; Machado conta a trajetória de Bentinho e Capitu numa proposta de interatividade já naquela época.
- Você acha?
- Claro. Machado joga com as emoções do espectador, chama para decidir e deixa em aberto. Tirar tudo isso seria reduzir essa modernidade. É um romance psicológico, narrado em primeira pessoa por Bentinho, o que permite manter questões sem elucidação até o final, já que a história conta apenas com a perspectiva subjetiva de Bentinho. Capitu, a mais enigmática personagem da nossa literatura, a mulher de “olhos de ressaca” cujo grande segredo reside em sua suposta traição ao marido, o protagonista Bentinho. Mas sobre um ponto não há dúvida nenhuma: ouve desejo, e muito desejo.
- Meu Deus!...
- O romance Dom Casmurro, além de estar entre as grandes obras da Literatura Brasileira, é considerado como a obra-prima de Machado de Assis - afirma.
- Bela aula sobre Machado. E você, Math, o que tem na cabeceira?
- Não tenho livros de cabeceira. Só meu travesseiro. Quando deito eu durmo. Mas esses livros todos que já li me ensinaram muito a viver. São livros que me influenciaram no envolvimento com a literatura. Deram uma visão do mundo.

E hoje, o que está lendo? Machado de Assis?
- Não. Pela segunda vez, o Encontro Marcado, de Fernando Sabino.
- Bom.
- Durante um tempo fiquei meio de saco cheio de ler sobre o Sabino, de ouvir opiniões sobre ele.
- Mas ele é muito bom. Penser l’homme.
- Sim. E lá se vão alguns anos que li Encontro Marcado, trabalho de escola. Meio sacal. Agora, confesso que gosto mais ainda de Fernando Sabino. Quanto mais o leio mais valorizo suas virtudes, mais descubro suas falhas. É do jogo. Uma subtração que, às vezes, valoriza, sobretudo no dominio da reflexão, do concimento filosófico e até científico.
- Respeito. Principalmente nesse romance, o autor nos brinda com um texto saboroso que resgata o clima das descobertas da adolescência nos anos 40 numa descrição aberta e realista dos perrengues que os jovens entram desde moleques, alguns personagens extremamente loquazes. Fernando Sabino costura tramas de romances com habilidades, tem momentos comoventes.
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- Gosto muito dessas releituras. Quando a mente evolui, a gente observa pormenores qua antes não percebia. Encontro Marcado tem passagem interessantes que eu não me lembrava. Li esse livro na adolescência.
- Verdade.
- Gosto do Fernando porque ele é um escritor referencia da nossa cultura, do nosso momento; sempre é uma pessoa que se diz muito claramente no que faz.

- Senhor romancista, retrata a experiência de uma juventude no início do século 20. O livro não é sobre Ferando Sabino, é sobre ele e os outros. Nas primeiras páginas, o autor vira o espelho ao contrário, para mostrar os outros: os amigos, a família, pessoas que conheci. Sei como é. This is it
- A questão central desse livro é a de todos nós; verdadeiras forças confluentes em cena. Leva para dentro de parte da historia a vida dos estudantes em Beagá na década de 40. Narra o outro e a si mesmo, mas podemos avaliar, atemporalmente falando, que as tramas se passam em tempo e espaço indefinidos. Diálogo divertido e cheio de referencias de uma juventude de uma época muito rica para Minas, literariamente falando.
- Ficção e realidade na literatura imaginada de Fernando Sabino?
- Pouco importa. A ficção não tem de ser engajada. O escritor, sim, tem o dever ético de se compremeter com a defesa dos direitos humanos. Por isso, classifico a obra como um autorretrato de uma geração que promete interação total com os leitores. Universal. O que mais fascina é a possibilidade de, lendo-o, não se deixar de envolver com os seus personagens, cada um com sua história, lembranças e sonhos no eterno despertar de uma geração. Encontro Marcado está entre os livros que moldam a vida de qualquer jovem de nossa época também - o tempo está marcado pelo figurino, pela linguagem. Mas as angustias e as dúvidas são as mesmas. O escritor mineiro sabe ser diferente sempre igual, “leve” – a “a leveza’ é a primeira das qualidades recomendadas para a sobrevivência da literatura no próximo milênio.
- Love this Guy!
- Traduz.
- Em português corrente quer dizer: adoro esse cara.
E com um toque de humor:
- Permanece em busca do lugar do encontro?
- Ainda faço minhas conjecturas. A obra tem um final alternativo, mas tem de reler, reler... para entender melhor. Gosto dos livros que revelam situações conflituosas com o mundo, com o pensamento ou com uma ordem. São obras que sobrevivem à passagem do tempo.
- Que bom que você valoriza a literatura nacional.
- Posso dizer que o romance Encontro Marcado é uma das obras mais afortunadas da moderna literatura brasileira. A arrancada de texto promete, em liguagem correta e limpa.
- E nos apresenta alugns personagens, alguns adolescentes que vivem numa cidade provinciana, mesmo sendo uma capital.
- Isso mesmo. Ao mesmo tempo em que faz passar diante de nossos olhos uma outra Minas, de um passado tão longe e tão perto. É instigante.
- Sei, uma história e tanto. Atualíssima.
- Um livro de perguntas com Deus, com o mundo, com a literatura, com as memórias e consigo mesmo, além de dissecar a alma do homem contemporâneo; gotas de humor permeiam a narrativa o tempo todo. Esse é o método de Sabino com seu jeito mineiro de ser, deliciando-me com o banquete de palavras, metáforas e ironias.
- Penso da mesma forma. Belo “romance de geração” amado por jovens de todas as épocas, de jovens como você que ainda segue marcando encontro com o destino. É a prova que a arte pode até fingir que fala do passado, mas mostra questionamento do presente.
- Pô, isso mesmo. Acho que Sabino é como se um Eça de Queiroz , também um pouco brasileiro, tivesse uma cópia no Brasil, escrevendo. Ele também gosta de tratar de assuntos quentes.
- É?
- Você tem razão, tem toda razão. Como professora de literatura, luto para legitimar e inscrever Guimarães Rosa e Fernando Sabino na história dos grandes, dos maiores e dos mais importantes escritores das Américas. Ambos cultivam a mineridade nas veias.

- Legal. Conte comigo.
- Bom saber. Pelo que vejo é um leitor habitual.
- Sou um leitor axilar.
- Que isso?
Mathier solta uma pequena gargalhada:
-Vivo com um livro debaixo de o sovaco para ler quando possível. Minha obsessão é achar tempo para ler.
- Ah! E, de todos os livros que já leu, qual o pior que achou?
- O declínio das Grandes Raças, editado pela primeira vez em 1916, do norte-americano de Madison Grant.
- Tudo ruim, tema, tradução pior ainda. Ele teoriza sobre como a chegada dos judeus levaria à decadência dos EUA.
- E por que pegou para ler?
- Estava com uma matéria sobre a segunda guerra para escrever.
- E, nem quero ler.
- Se pudesse, leria o tempo todo. Lá no pensionato, nos fins de semana, eu costumo fingir que estou doente para não jogar baralho como os colegas e ficar lendo.
- Sempre encontra bons livros para ler?
- Certa vez, o professor Aires me disse que cada livro tem seu charme, estilo e vocação, enquanto você o lê, o livro lê você.. E por isso mesmo, o bom leitor dá sempre um jeito de conseguir bons livros p’ra ler. É com esse espírito que tornamos leitores. E os bons livros sabem esperar por ele,
- Aires da Mata Machado?
- O próprio. Conspícuo professor e autoridade no que diz respeito à Lingüística e ao ensino de Português e sábio representante da nossa nacionalidade na filologia, no jornalismo, no folclore e na escrita. Maestro da tranformação na UFMG e na Universidade Católica de Minas Gerais, doutor em Filologia românica. Diamantinense puro sangue.
- Foi meu professor. Aprendi ler Camões com ele, através de seu livro Camões Épico, da coleção Nossos Clássicos. Há tempos não o vejo.
- Muy malo. - Quando se perde de vista um velho professor, perde uma biblioteca inteira. Eles já passaram por esse trecho da estrada que estamos atravessando.
- Está certo.
Mathier recita:
- Ó Aires dos ares bons/ Aires da mata/da linguagem.
- Ele é um enorme contraponto de tudo que se vê por ai. Tanto que Drummond num poema traça-lhe o perfil intelectual e humano com muita sabedoria. Tem intelecutal que não consegue rir, de jeito nenhum. O Aires vive rindo.
- Ó, boas lembranças!...
- Sabe que, de vez em quando, vou até sua casa fazer leitura para ele?
- É mesmo? É mesmo, fiquei até com saudades dele agora. Quero conversar com ele, um dia vou com você, posso?
- Vamos lá. Gosto de fazer isso, ficar perto dele, tocar as mãos dele. É o próprio exemplo de que a maturidade é uma dádiva que só é dada a quem viveu a vida com curiosidade para parender e humildade para partilhar.
- Afianço. É o caso de Aires.
- Desde quando ele é cego.
- Ha sido sempre cego. Tornamos os olhos do grande literato a quem transmitia todo o seu saber

- Não importa. Sólo conozco el mundo por mi imaginacion, por mis manos e por las coisas que escuto. Y sé que los ojos de los demás no son como los mios. Sé que los ojos de los demais. Sei que por si mesmos conhecem as coisas. Poder ver me parece algo maravilhoso, tant maravilhoso que en realidade no consigo entender qué siente la gente que vê.


O professor Aires é a melhor criatura do mundo - conclui Suzana.
- Conheci poucas pessoas na vida com tal nível de conhecimento, tão benquisto e tão bem relacionado no mundo das artes. Figura execepcional por qualquer angulo que se olhasse. Envelhecer leva urgência, despede sempre com essas palavras.

- Saudades dele! – exalta-se Suzana.
E olhando as horas no relógio de pulso:
- Shiiii!... quase meia-noite!
- De olho no relógio. Sono?
- Ah, menino, coversando com você perco a noção de tempo – diz a moça -. Tenho que ir.


-
- O relógio biológico também está aí, ‘né?
- Bem capaz. Tic Tac – brinca a moça.
- Ainda é cedo. Cansada?
- Não. Não. Passei o dia à toa, à toa...
- Então?
- Escute, tenho que dormir.Amanhã tem que sair da cama com disposição. Levanto cedo, apesar de domingo. Normalmente, assisto missa pela manhã na Boa Viagem.
- Eu acredito. Eu acredito.
- Até amanhã, meu rei.
- Para acabar, queria contar mais algumas coisas.
- O quê?
Em tragadas dispersas do cigarro, Mathier pede:

- Por que não abre a saideira?
- Mais uma?
- Se tiver a fim.
- Bem...
- Desculpe, não queria te atrapalhar
- Não. Não atrapalha. Só não podemos ficar aqui até o dia clarear.
- Ok.
- Saideira! Vamos lá. Merece uma recompensa pelo bom comportamento.

- Obrigado, minha flor de lótus.
Suzana desliza delicadamente as duas mãos nas faces, em dúvida:
- Bem... Bem...
- Prometo não sufocar seus ouvidos com mais divagações libertárias. Converso de mais.


Suzana esvazia seu copo de um gole, e tornou a levantar, olhando para Matiheir com ternura.
- Não, não é isso. Jovial e ativo, o que faz de você uma ótima companhia para qualquer hora, digo que foi uma noite especial.
- Agradeço.
- Tudo bem, tudo bem: a “saideira”.
- Enquanto isso vou ao banheiro, para me aliviar.
- É ali, vai.
- Bom. Eu já volto.

A moça deixa a poltrona e traz outra garrafa de cerveja. Serve os copos e torna a sentar-se na mesma poltrona. Ao cruzar as pernas, o rapaz, olhando de viés, pôde ver as rendas peroladas da calcinha rosa que usava, mas foi só tempo em que ela se ajeitava no assento antes de esticar a saia e acender mais um cigarro. Mathier serve os dois copos e logo toma uma gole elogiando:
- Deliciosa!
- Gostou?
- Maravilhosa, a cerveja, claro.
- Heim?
Abrindo um sorriso malicioso de quem sabe que falou uma frase de efeito, Mathier corrige:
- A loira gelada. Geladinha, no ponto.
- Assim que é bom, mas dizem os cervejólogos que a cerveja muito gelada anestesia as pupilas gustativas e não deixa o bebum sentir nuances da bebida.
- Tem a ver, sim. Na Europa tomam cerveja à temperatura ambiente, algumas marcas belgas, por exemplo, vão ficando mais ricas à medida que esquentam", explica Suzana.
- Aqui é pais tropical – rebate Mathier.
- É.
Suzana cruza as pernas, dizendo em tom macio.
- Deliciosamente apetitosa, é?
- Humhum....
- Prefiro cerveja a qualquer outra bebida, mesmo sabendo do risco de acumular gordura abdominal – despista o rapaz.
- Barriga de cerveja. Já tem a sua, ‘né?
- É calo.
- Você é fogo, hein!... Abre seu olho, a ciencia já fala que a cerveja contribui para o aumento da gordur localizada

Mathier abranda o sorriso e justifica:
- Descupe-me. Sempre fui muito brincalhão e meu defeito é que não consigo falar sério, vivo rindo. Eu sou mais para over e tem pessoas que acabam confundindo isso com o ser falso e ridículo. Lembro que era assim desde a infância, professores, implicavam com meu sorriso e até me taxavam de cínico, pode?
- Besteira.
- É. Besteira mesm. Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro, aconselha Clarice Lispector.


- Mas, hoje, quando vou tratar de um assunto sério, por exemplo, não conto piada. Aprede que é melhor ser neutro.
E tomando a garrafa de cerveja numa das mãos, Mathier pergunta.
- Conhece a história dessa bebida dos frades, cuja receita atravessou séculos para chegar até nós?
- Pouco.
- Por que em priscas eras, inspirada pela tradição e pelo cuidado artesanal das abadias medievais, essa bebida dourada, tipo Bhama, é feita com maltes especiais, lúpulos florais e condimentados, o frutado típico das leveduras belgas. Encorpada assim essa, de espuma cremosa e aroma agradável é porque reúne diferentes leveduras em uma combinação que só poderia mesmo ser inspirada pelos céus. Depois que a cerveja entrou no cotidiano dos brasileiross, muitos ademanes, como se diza antigamente, prosperam

- Pelo jeito é um bebum que conhece bem a história do que saboreia.
- Mais ou menos.
Mathier cerra os punhos e os estende para cima, espreguiça-se, boceja e diz:
- Cansei sua beleza com tanta conversa fiada, falo adoidado, ‘né?
- Amei!... Papo divertido, culto.
- Prometo ser mais ponderado da próxima vez, até porque tenho que dar oportunidade a você de falar de você.
- Não se preocupe.
Suzana fecha os olhos, reclina a cabeça de lado da poltrona e fica ali, imóvel e calada, perdida em seus pensamentos, a conversa ia morrendo. Na rua, o silêncio era
completo. Leva a mão aos cabelos, apanha um chumaço deles, passa a enrolá-los nos dedos formando um pequeno anel e começa a brincar. Assim, desarmados, os dois permanecem mudos por um tempo, apenas bebendo e fumando, vagando em seus pensamentos. No mundo da lua. Voando. Mas logo os olhos da moça se acendem com as badaladas do relógio da Igreja da Boa Viagem.
- Que foi? – pergunta o rapaz vivamente.
- Nada – diz ela, com certo desencanto –. Sonhava.
- Que bom. Sonhar faz bem.
- Descupe-me. Estava distraída.

- Que foi? – repete Matheir.
- Como assim?
- Parece longe, sonhando acordada.
- Eu?... Longe?
- Algum pensamento como uma mosquinha na sua cabeça, rondando.
- Não foi nada. Apenas organizando os pensamentos.
- Por isso que você está tão melancólica?
- Passou.
- Você está com uma coisa diferente que não sei. Daria um doce pelos seus pensamentos.
- Essa chave está na sua cabeça.
- Evite preocupações, angustias e pensamentos sobre seu futuro. Nada de ruim vai acontecer depois da separar.
- Muita coisa passa pela cabeça da gente, ‘né?
- Tudo bem?
- Sim. Tudo. No mais... legal!
- Decifra-me ou devoro-lhe?
Suzana caçoa numa tentativa de confundir o nervosismo:
- Bobeira, estava psicanalisando você, tentando fazer uma correlação entre a personalidade e a pessoa Mathier. Ou seja, em silêncio pensamos tudo, até as coisas mais doidas.
- Conta ai.
– Curioso!...
- Não mereço?
- Ah, isso vai longe. Meia-noite... Não estou mais a fim, tenho que ir. Por hoje é o que temos, vamos.
- Eu também estou com sono – diz o rapaz espreguiçando-se.
- Você dorme naquele quarto, o cenário já está pronto; a Terezinha já deixou a cama arrumada. Toalha, sabonete, tem tudo lá. O banheiro fica em frente.

- Por onde ela anda?
- Quem?
- A Terezinha.
- Passa os dias de folga com a família, em Brumadinho.
- Certo.
- Agora, está feliz?
- Muito.
- Eu também.
- Você apareceu na minha vida na hora certa. Bom, adorei esse encontro.
- Eu também, bastante apetitoso.
- Apetitoso?
- Maneira de falar, agradável e com uma boa troca de conhecimentos.
Suzana deixa escapar um sorriso malicioso.
- Então fique à bvontade. Fecha a porta e apaga as luzes. Depois a gente se fala. Boa noite, adeuzinho.
- Axé. A gente se encontra no zoo ou em qualquer lugar. The End.
- Durma com os anjos. Até logo, senhor Matheir.

E com ar de chacota:
- Com a luz apagada, dormir.
- Amém nós dois. Repetindo, está bonita, hoje.
- Que isso, forte abraço.
- Linda.
- Agora, procure descansar. Boa
E sorrindo graciosamente ela estende a mão, que ele prende entre as suas; a moça lança seu olhar meigo sobre Mathier:
- Você também, garotão.
- Descansa e amanhã vair ver que tudo vai dar certo.
- Deus te ouça. Um beijo.
- Outro.
Suzana deixa o copo de cerveja pelo meio, apaga o cigarro e despede com beijinhos no rosto do rapaz: três para casar, diz sorrindo. Em seguida, enfia-se pelo corredor adentro, entra apressada nos seus aposentos e mantem a porta fechada, pensando tomar um banho, por uma roupa mais à vontade.

A NOITE DENTRO DA NOITE

Depois do banho, enrolada na toalha e o tempo grávido de esperas, retira do armário e veste um conjunto de lingerie de renda francesa matizado com tule; em tons dourados, super sexy: para a gente mergulhar na noite sentindo poderosa – pensa enquanto se cobria com um roupão aveludado de cetim pós-banho. Mais relaxada diante do espelho, solta o cabelo atrás ainda úmidos, deixando o penteado um pouco desmanchado sobre as costas. Retoca levemente maquilagem e pulveriza no pescoço a colônia predileta, o suave perfume francês Heure Intime. Em seguida, deixa o cômodo de banho, vai direto ao quarto do filho e fica mais tranqüila ao vê-lo em sono profundo. Beija a testa do garoto e retorna ao corredor passando a chave na porta pelo lado de fora.
- Desse modo é melhor - pondera de si para si. Minha aliança. A aliança – surpreendida com o descuido, volta rapadamente ao seu quarto e guarda o pequeno objeto.

Mesmo com um friozinho subindo e descendo pelas pernas e o coração
pulsando inquieto, feito menina de jeitinho timido-pretencioso, ela abre a porta do quarto de hóspede e, por uns segundos. Levanta o braço e fica na ponta dos pés. E, com
os olhos ganaciosos e um sorriso cheio de cobiça no rosto permanece ali observando o rapaz adormecido, ou fingindo que dormia - só de short estendido sobre o lençol. O torso combinava beleza refrescante de rapazinho com jeitão viril desfilando sexualidade adulta. És belo, és forte... Animale. Daqui a pouco nos mediremos, alto a baixo, ações e reações - balbucia ela entre os dentes! Respira fundo e tenta pensar nele com suas namoradas, como ele seria naquela hora, na cama, tudo - seus olhos abertos não vêem nada além das cenas que passavam rápidas pelo pensamento. E, com a graça de uma bailarina, fecha atrás de si a porta, e na ponta dos pés, caminha até o rapaz e, sutilmente , ajoelhou-se ao lado da cama. E, tomada por uma voluptuosidade desmedida, respira novamente e começa a alisar os ombros de Mathier e a roçar a face nas faces dele de forma serena e sensual.
- Cheiro bom – sussurava louca para amar, desfrutar o ardor do afago masculino na nuca, nos ombros, em toda a carne.
O rapaz, ao sentir dela a respiração e o toque mágico das mãos, não resiste, abre os olhos e retribui o gesto. Sem dizer uma só palavra, atirou-lhe os braços no pescoço e aperta com força o corpinho flexível e bem desenhado no seu e a beija ardentemente nos lábios e em todo o seu rosto.
E então, tomados por um desejo incontrolável que se espalha pelos corpos como um rastilho de pólvora, atacaram-se com apetide voraz. Rolam na cama aos abraços e beijos por longos minutos, até que, Suzana, cada vez mais excitada e inspirada pelos anseios mais ardentes, afasta a boca da boca do homem e, com delicadeza psicológica, balbucia-lhe um pedido ao ouvido.
Mathier sorri maliciosamente e parte para estágios mais avançados de caricias, sem recato. Tira o resto de roupa da mulher e, cheio de manha, desliza a ponta do nariz pela cútis delicada de sua nuca, mordisca-lhe os seios e passeia-lhe a língua pelo ventre sólido e quente. E, com a mesma sensualidade, sopra lentamente os pêlos entre suas coxas que, sem receios, abrem-se à lasciva cobiça marcada por outros longos minutos e segundos. E assim, seduzida pelo toque úmido e voraz do mancebo, Suzana se deixa aos devaneios nunca antes vistos pelo seu corpo nem por sua alma.
- Oh, Math!... Oh!...

Logo, remexendo os cabelos e revirando os desconcertantes olhos, Suzana se queda na cama mirando o rapaz com surpresa. E pede:
- Me abraça, vem cá, vem... juntinho é melhor. Me beija...
E diz em voz baixa:
- Vem... Castigue meu corpo, vai!

- Humhum.
O rapaz, ainda com os lábios sedados pelo sabor de líquidos misturados, rodeia e abarca o dorso de Suzana com as mãos, enfia suas pernas entre as dela e se juntam sedentos de beber na mesma taça, diante de algo assim tão aparentado ao sagrado. Ela estava nua, penetrada daquele aroma, daquele calor de carne de mulher, alvoraçado por aquele beijo sedutor que lhe deixava na boca um gosto de febre e lágrimas; um querendo descobrir o outro eles se entregam à sensualidade do amor, envolvidos numa áurea de magia, cada qual desejando ter, através do outro, a maior soma imaginável de prazer até a exaustão total: assim, assim, isso.
Eu nunca havia me sentindo tão bem assim, Essa seria uma área que, quanto estimulada, traria prazer para a mulher e teria ligação com o orgasmo mais profundo e intenso.
Chegou o tempo de acontecer. Atração fatal.


De repente, ainda enroscada nele, Suzana ergue a cabeça e cora. Um pouco sem jeito exclama:
- Ó meu Deus! Ó meu Deus!
- Arrependida?
- ImaginA. Fui esperta e deixei de ser comportatinha: provei e gostei. Essa foi a hora extra da felicidade de estar com você.

Então, que foi?

- Ih, acho que exagerei na dose, passei da conta.
- Não entendi.
- Loucura!... Como fui louca assim? Estou tonta, ainda não caiu direito a ficha.
- O que foi, menina?
- Estou boba!...
- Que foi, diz logo?
- Deve estar rindo de mim. Perdi o juízo.
- Explica.
A moça responde com um sorriso envergonhado:
- Estranho, agora, olhar para você.
- Como assim?
- O que condenei ainda há pouco, acabei fizendo.
- Não estou entendendo bulufas.
- Bateu uma insegurança. Acho que ficou mexido com o que aconteceu.
- Hum? Pode explicar melhor, não estou conseguindo entender.

Numa quase charada, Suzana:
- Mesa posta. Arrastei você para cama.
- Me arrastou, que isso?
- Fiz uma coisa que não deveria ter feito. Estou meio encabulada, envergonhada até.
- Ó, não!... Ó, não!... Corta essa.

Enquanto dizia, estende-se sobre a cama, cruza os braços sob a cabeça, e afirma:
- Não devia.
- Para, para, para pelo amor do Deus...
- Avancei o sinal. Pior de tudo, na maior intimidade. Pior ainda: com o melhor amigo dele.

- Sem culpa, vai. Sem culpa. Fica fria, gatinha, à noite todos os sentidos ficam mais aguçados. Mulher não trai, se vinga.
- Não é isso.
- Você não queria?
- Não assim. Mas, bateu forte demais.
- Arrependida?
- Aconteceu tudo sem querer, não estava querendo uma aventura.
- Arrependida?
- Não é isso.
- Então segura a onda. Você reconheceu os sinais de seu próprio corpo. Para as mulheres, trair não é uma questão de inteligência, apenas de vontade e oportunidade.
-Tudo depende do quanto se ama. A inteligência ajuda os pareceiros a escapar das consequências da infidelidade. Só isso. De qualquer forma, continuo fora de moda, mas já não creio em almas gêmeas. E sim em compromissos tanscendental de livre escolha. Deve ser o que está pensando de mim.
- Corta. Corta. Corta.
- Tudo bem. Não vou negar que foi um dia especial, noite de festa. Posso jurar que minha primeira traição me deixa plena, feliz e realizada, sem peso na consciência. Passei da página hum e já escrevemo um enrendo de novela.


- Pois é, fez o que o corpo pedia. Assim que tem graça, sensualidade à flor da pele. Por isso que a gente me atrai. Ficam fantasiosas essas coisas

- Não é algo comum. Paguei língua; estava enfeitiçada. Juro.
Mathier rindo e cantarolando numa voz noturna, a voz que se usa nas madrugadas:
- Você é doida demais!
Suzana cora novamente.
- Tanto que tive até ânsia de vômito, tal a anseio que o momento me
proporcionava.
Recohneça os sinais de seu próprio corpo

- Também!...
- Desculpe a ladainha...
- É o prazer em produzir prazer ao homem. Que a cena foi linda, foi. De cinema, não foi?

- Ai, meu Deus! Para com isso, não sou adolescente

- Tudo bem, não está mais aqui quem falou.
- Que maldade, paixão!... Você acredita em mágica, em contos de fantasias?
- Não sei. Acredito?
- Preste atenção: você seduziu-me com mãos tão habilidosas, celebrando a vida, celebrando o amor com o abraço mais que apertado e sentido, soube usar a dor para lapidar o prazer. Parece um sonho. Adorei e quero mais. tudo que é mais sagrado Meu Deus do céu, você é mais do que uma grande mulher, é gente, essencialmente fêmea.

- Não brinca.
- Naquela hora da noite, confesso que você me deu um baita susto ao vê-la ali, bonita como sempre e num sensual e profundo silêncio a me olhar.
- Não esperava?
- Acho que não.

- Não mesmo?
- Bobinha, me pegou pelo desejo, pelo gesto bonito e sensual. Mas logo percebi um clima a gente.

- Você não perde uma.
- Não acha que eu ia fazer isso com você? Perder a oportunidade de ficar mais perto de seu coração batendo forte.
- Uma menina criada no interior como eu pode não esquecer um cara como você. Tanto que desabafei sem cortes. Estender a mão amiga e o braço forte.

- Amor e sexo já são bons separados, imagine juntos. Não foi bom?
E num sorriso livre, Suzana diz em tom mais elevado:
- Sensação indescritível, uma loucura! Caprichou no cardápio!...
- Hummm!...
- Quanta coisa que nunca soube, nunca vivi, estou feliz. Superdiferente.
Uma explosão de formas e sensações.


- Eu também. Voar na alturas

Nesse momento Suzana toma-lhe um pé
entre as mãos e pôs-se respeitosamente a calçar-lhe uma meia de seda azul com desenhos bordados.
- Pronto, tudo em pazSó tire quando acordar, viu?
- Coisa mais sensual!
- Congelo meu cheiro em você. O seu, agora, eu carrego entranhado no meu corpo e na alma também.

- Dentro de mim uma voz dizia que iríamos viver algo brilhante. Não é fundamental, mas é muito bom.
- Principalmente, quando rola uma química boa.
- E rolou.
Suzana e Mathier, evidentemente, tornaram-se amantes.

- Difícil explicar os milagres do amor, não é mesmo? Quando o Zé me chamou, logo lembrei dessa carinha sorridente... eu sabia que tinha uma coisas me chamando para cá.

- Triângulo amoroso, Math?
- Não sei, é?
- Math, ninguém é de ferro, o que a gente quer é viver bem. Deus sabe quanto precisava de um carinho... Mas, cometi uma travessura, uma grande travessura – recrimina-se, meio atrapalhada.
- Segredo que não quis me dizer.
- Talvez. Mãos atadas, desejo livre. Não é assim?
- Sim. No principio não sei se era curiosidade ou desejo camuflado.


Mas, há muito tenho uma queda por você, atração mesmo, mas me sentia encabulada, alimentando esses sonhos. Quando conheci você, minhas pupilas dilateram ao primeiro olhar. Fiquei tão feliz com esse inesperado momento, como se tivesse me levado a outro plano. Viver com paixão é agora ou nunca.
- Bom. Sem culpa, ‘né?
- Nenhum arrependimento. Acho que foi o primeiro passo para buscar um novo começo e mudar minha história de vida.
- Feliz como num conto de fadas?
- Está nos meus olhos o que poderia dizer.
- estão brilhando.
- Sim. Sim, por dentro e por fora. Imagino que nessa noite você me fez sentir viva... me fez descobrir o corpo... me fez descobrir a vida... Juro, desejei você com todas as minhas forças.
- Eu, idem.
- Momentos assim que gostaria de congelar o tempo, porque sinto como se estivesse com 15 anos, na puberdade; nunca vou esquecer.

- Isso que importa.
- É. Aprendi com as primaveras a me deixar cortar para poder voltar inteira.
- Verso de poema seu?
- Não. De Cecília Meirelles.
Depois de um risinho tímido, tapando os lábios com uma das mãos.
- É gozado, nunca vi outro homem pelado em minha vida, nem mesmo em foto, a não ser das estátuas gregas ou romanas.
Risos.
- Você é mesmo surpreendente, menina! Mulher forte e sexy ao mesmo tempo. Éa coisa mais linda, mais cheia de graça, que já vi
- Conta outra. Ou acha que vou acreditar.

- Louquinha. Caso contrário não estaria aqui para contar essa história. Parece um sonho
- Ô, minha...
Suzana toda sorriso, a cabeça ligeiramente pendida para um
lado, faceiramente pergunta:
- Posso de contar um segredo?
- Conta.
- Ao saber que vinha dormir aqui, confesso que alimentei algumas fantasias despertando as tentações e os meus fantasmas interiores, sentia a sensação que tinha alguma coisa a mais. Me balançou toda quando você está do meu lado, atração fatal. Pois bem, relutei. Relutei muito. Balancei, tremi nas bases.Precisei pegar a mais remota onda perdida em minha própria escuridão emocional. Há tanto tempo que te quero, menino sapeca.
- Nem sei o que dizer.
- Você me provoca, você é minha segunda tentação.
- Segunda, tudo bem, vai? E a primeira.
- Desalgemar-me. Quer saber mais?
- Claro.
- A ocasião botou fogo na minha idéia, surgindo dentro de mim como serpente erguendo desse escuro para o jogo erótico. Quando vi já estava tomada por aquele anseio. Atração antiga? Não sei se...
- Não se culpe. Não se culpe.
- Ai, meu Deus, que boca, não devia ter contado isso. Vai achar que estava subindo pelas paredes.
- Devia sim, flor rara... Delicada, macia, perfumada, envolvente... Irresistível! Isso tudo que você é, sabe?
- Huuummmmm!!! De verdade mesmo?
Suzana volta a descontrair-se, mostra a pontinha da língua e beija-lhe de leve na face.
- Sou?
- Sim. Muito, muito mesmo.
- Que bom!... Que bom!... Pense em você. Você tem obrigação de ser feliz.

Vestida por uma alegria nova, a moça se desembaraça dos braços do rapaz, desce da cama e se veste. Pega o lençol no chão, cobre Mathier, veste novamente o roupão e acaricia novamente seus cabelos fartos.
- Onde que você pensa que vai, Suzana?
- Fugir.
- Diga a verdade.
- Fugir... fugir desse lugar, antes que me carregue – cantarola a moça. Ir para a índia numa viagem espiritual

- Não vai não. Se tentar fugir, vou até ao fim do mundo para lhe encontrar.
- Benzadeus! Seu harém como é que fica?
- Bobinha.
- Hein, como é que fica.
- Melhor esquecer essa gente porque elas não existem mais. Não vamos falar do que passou, não tem a menor importância. Estou tão feliz... tão feliz... nunca vou esquecer.
- Então o que quer de mim?
- Beijar, beijar e beijar.
- Não estou chateada. Olhe para mim, estou muito feliz... feliz.... feliz....
- Que bom você gostou.
- Eu amei. Essa atração que um sente pelo outro...
- Eu sei. Mas não pode ser assim.

- Assim é melhor. Deixar de lado esses maus pensamento se não seu coração não vai passar no teste.
- Sei.
- Só mais um cadinho, vem.
- Naninanão. Você é perigoso demais, a gente conversa depois.

- Ô, gatinha!...
E num leve sorriso de intimidade, ela:
- Tenho medo que você faça morada dentro do meu coração.
- Corre esse rico, sim. Farei tudo para ver você feliz
- Ai, Math, nunca me senti tão amada, juro, estou pisando nas nuvens. Foi um Math mais Math do que o outro.
- Que bom.
- Mesmo sem provar outro, sei que você é o homem mais viril do mundo, viu?
- Olha aqui, essa fala é minha
- Mesmo assim faço dela minha nessa hora.

- Tá bom. E você a mulher mais sexy do planeta.
Mais risos. Suzana:
- Foi muito bom, não tenho o que reclamar.
- Não?
- Estou aprendendo com você. Não sei nada de sexo, sempre fui casada. Se pudesse...
- Então?
- Tiauzinho. Tenho que ir, tiau.
- Vem cá. Só mais um cheirinho, vai!
- Você é muito carinhoso, vai achar uma boa namorada e viver um grande amor.
- Quem sabe já arrumei
Oh. Você não brinca comigo. Sou muito romântica!
- Falo sério, mas o certo mesmo seria ficar de joelhos e agradecer seu jeito de me aceitar.



- Para de fazer essa carinha. Agora, ciao, menino.

- Um minutinho só!
- Nãnã. Esfrei de tudo.
- Sei como te esquentar.
- Não. A ficha começa a cair.
- Você está tremendo.
- Estou. A primeira vez.
- Não precisa explicar. Uma perguntinha só. Pode?
- Sim.
- Aventura sexual de uma noite só?
- Depois a gente fala nisso.
- Na horizontal?

- Bobo. O calor está de matar. Quero tomar um banho e relaxar.
- Vou com você.
- Acho um pouco prematuro tomar banho juntos, não?
- Que que tem?
- Piradinho.

Engatar namoro com um rapaz solteiro. E não deixou a coisa esquenta muito. Mas há quem se arrisca.
Santo casamenteiro dos dias de hoje.
Sabia que só ia durar ali, eu não queria me machucar.

- Vem aqui.
- Já disse: nanã. Me deixa sozinha só um pouquinho.
- Como quiser.
- Até mais tarde. Depois do banho terei o resto da madrugada para me curtir dentro de mim mesma. Depois a gente se vê. Durma com os anjos, querido.
- Espera... Espera... tem o roupão também muito lindo, viu menina?
- Adoro quando você fala assim.
- Então vou falar de novo daqui a pouco
- Sim. Posso citar uma frase de meu estilista preferido?
- E deve.
- Sim. Ele diz que, a roupa mais bonita para vestir uma mulher são os braços do homem que ela ama. Para as que não tiveram essa felicidade, eu estou aqui. Assinado: Yves Laurent.
- Eu também assino dizendo que estou aqui.
- Tiau. Boa noite.
- Durma bem para amanhã para acordar com carinha boa.
Virou-se, deu-lhe um ultimo beijo. Ele repete numa voz dengosa:
- Quando a madrugada começa bem o dia fica muito melhor, pode acreditar. A gente se vê amanha?

E com olhar cansado, mas feliz, numa voz charmosa:

- Mocinho, Ainda sinto o gosto de seu beijo na minha boca. Bem cedo vou para a missa e depois vamos ao Zoológico, esqueceu.
- Claro que não. Me dá um beijo.

- Daqui a pouco. Tenho muito que aprender com você, conheci seu fôlego. Agora tenho que ir. Até já.
- Mais um minutinho.
- Sossega.
- Unzinho...
- Não, não... já estou indo embora, beijo.
- Amanhã cedinho?
- não dá. Esqueceu, vou à missa. É o que meu coração pede.
- Quero um beijo. Um beijo só.

- Viva nós... viva... viva...
- Viva.
- Nove horas, pode ser?
- Não, 10,15. Mas, não se esqueça que o Juninho...
- Certo. Certo. Eu espero. Agora, descansa. Dorme e descança. Boa noite.
- Vem cá, dá um abraço.
- Mais tarde.


- Tá bom. Um beijo.


Suzana veste-se. Prende os cabelos com uma presilha e com uma alegria orgânica que lhe preenchia as veias, sai de mansinho com o mesmo balanço do corpo. Saltitando nas pontas dos pés passa rapidamente pelo quarto do filho e, depois, some atrás da porta de seus aposentos.
Na sala, sobre a mesa de centro, ficaram dois copos: um sem nada dentro e outro ainda com um pouco de cerveja e quatro garrafas vazias, além dos pratinhos sujos com palitos, guardanapos de papel embolados, caroços de azeitona e muito toco de cigarro nos cinzeiros.
Fora, começava a clarear. Os dois se tornam amantes? Ou talvez tudo não passe de uma falsa epifania, uma ficção a mais, outra mentira. É possível a gente ser feliz e sofrer ao mesmo tempo? Cada leitor que descubra por si.

Engatar namoro com um rapaz solteiro. E não deixou a coisa esquenta muito. Mas há
Sabia que só ia durar ali, eu não queria me machucar.




- FIM -


* FBN© 2008/O Vôo do Pássaro Dourado/Welington Almeida Pinto/Categoria: Conto/Pocket-Book.


* Obra de ficção: qualquer semelhança com pessoas, fatos ou situações reais terá sido mera coincidência.



Livro disponível na Internet. Rentabilizado pela Google.

www.juventudedescoladade68.blogspot.com
Entre nesta página e veja mais fotos da época
*
www.welingtonpinto.blogspot.com
welingtonpinto@gmail.com - welingtonpinto@yahoo.com.br












Welington Almeida Pinto
O Autor e sua
Mineiro de São Roque. Apaixona-se desde cedo por livros, pela poesia, por personagens históricos e literários. Em 1971, conclui seus estudos em Passos, Minas, e transfere-se para Belo Horizonte, empregando-se no departamento contábil de uma empresa imobiliária, sem abandonar o gosto pela leitura dos grandes clássicos da literatura universal e a prática de Escritor e Jornalista.
Entusiasmado com o movimento cultural da Capital freqüenta as reuniões da Academia Mineira de Letras e outras instituições culturais. Não se basta com as letras. Viaja a muitas terras em busca de gente admirável para aumentar seu universo, visitando cidades da Europa e das Américas. De 1972 a 1976, Estuda no Centro de Pesquisas de Artes Plásticas da ACM, especializa-se em Publicidade e funda sua Agência.


No Teatro, produz A Cela, de sua autoria. Depois adapta e monta Flicts, de Ziraldo, como peça adulta, ambas dirigidas por Luciano Luppi. Participa da equipe de produção do espetáculo A Noite dos Assassinos, de José Triana, dirigida por Paulo César Bicalho. Adapta O Pequeno Príncipe, de Antoine -Exupery, para teatro infanto-juvenil, com trilha sonora de Fernando Boca e direção de Noema Tedesco. Publica Aula-Viva, com 6 scripts sobre assuntos da História do Brasil para aplicação em Sala de Aula.
Eleito para o Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, associa-se também à UBE – União Brasileira dos Escritores/São Paulo,SP, à ABRALE-Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos/São Paulo,SP e à AEI-LEJ - Associação de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil/Rio de Janeiro.
Publicou contos infantis no Gurilândia, do Estado de Minas, Belo Horizonte, Zero Hora Infantil, Porto Alegre e Gazetinha, do Gazeta do Paraná, Curitiba. Como pintor, realizei um pequeno acervo de óleos e desenhos, algumas obras estão publicadas no siteportuguês: www.poemar.com/WelingtonAlmeidaPintoPintura.htm

Livros Publicados

Literatura infantil - Coleção Infantil Vitória Régia/Edita, 1997: A Águia e o Coelho - Clin-Clin, o Beija-Flor Mágico - Tufi, o Elefante Equilibrista – Seu Coelhino, em Viagem ao Sol - O Gato-do-Mato e o Preá e A Caçada e O Ataque do Furadentes

Literatura Infanto/Juvenil/Edições Brasileiras/1998: Malta, o Peixinho-Voador no São Chico - Santos-Dumont, no Coração da Humanidade - A Saga do Pau-Brasil

Literatura Adulta/Helbra/1969: A Cela - Antologia Poética - O Vôo do Pássaro Dourado/2008

Toponímia/Edita, 1987: Dicionário Geográfico e Histórico do Estado de Minas Gerais – Edita, 1986 - Dicionário Geográfico e Histórico do Estado de São Paulo –

Legislação Brasileira/Edições Brasileiras/1993: Condomínio e suas Leis - Licitações e Contratações Administrativas - A Empregada Doméstica e suas Leis - Lei do Inquilinato - Assédio Sexual no Local de Trabalho

Dramaturgia/Edita/1978.: A Cela – peça adulta, adaptação do livro do mesmo nome - Flicts - adaptação do livro “Flicts”, de Ziraldo - Pequeno Príncipe - adaptação do livro “O Pequeno Príncipe”, de Exupéry - História do Brasil, em Aula Viva - adaptação de temas históricos para teatro, aplicados em sala de aula -


Homes na internet: welingtonpinto.blogspot.com – vários livros disponíveis rentabilizados pelo sistema google Ad Sense. Mais: para compra de livros: www.ieditora.com.br – Para consultas: welingtonpinto.kit.net - E-mail: welingtonapinto@gmail.com welingtonapinto@yahoo.com.br -

O autor por ele mesmo:

Quando cheguei ao mundo, no ano de 1949, a 18 de março, a cegonha trouxe junto um anjo. E deixou um recado com a parteira: ... ele vai precisar, sempre. Ao tomar meu primeiro banho, soltei um grito e quase caí das mãos de minha bisavó. Creio que foi um grito e um gesto de alegria aplaudindo a vida.

Aos dez, onze anos descobri a leitura através das obras infanto-juvenis, principalmente Lobato, e me despertei pela letra impressa. Então, comecei a construir meu universo de palavras, letra a letra, pondo em ordem aquele emaranhado de idéias que fervilhavam em minha cabeça. Com a morte de meu pai, em 1958, comecei a trabalhar. Iniciei, sem deixar a escola, uma peregrinação pelas mais diversas ocupações. Fui engraxate, menino de entrega, vendedor de frutas, caçador de pássaros e, mais tarde, auxiliar de contabilidade. Nesta última atividade, dei meu segundo e decisivo passo em direção à consciência humana. Conheci um colega viciado em leitura que me emprestou alguns livros da literatura, foi o estímulo que precisava para lapidar minha vocação literária. Então, viajei com mais interesse pelo mundo do conhecimento e senti que meus horizontes se alargavam a cada obra lida; descobria a mágica da leitura e a certeza de que não podemos deixar de ler. Ler, quase como respirar, é a nossa função essencial - melhor maneira de aprender a pensar e refletir sobre a vida.

Por volta dos anos 70, apaixonado pela cultura, mudei-me para Belo Horizonte, onde imaginava cursar gratuitamente uma universidade. Mas, logo percebi que isso era privilégio para poucos. Acuado pelas dificuldades econômicas, tive que seguir enfrentando o mercado de trabalho. O trabalho e muitas andanças por nações cultas do mundo foram minhas universidades.

Autodidata, mergulhei cedo na literatura e no jornalismo, e depois na publicidade, quando iniciei a publicar meus livros. Na literatura, sempre funcionei por deslocamento, transitando por diferentes formas literárias - nenhuma das minhas obras é semelhante à anterior.

Meu anjo!?... Nem torto nem reto me ensinou a sorver a vida como quem saboreia uma poesia, mesmo que, às vezes, concreta demais. Ainda estou fazendo a transição de menino para gente adulta.


* Encontro na literatura o compromisso de uma obrigação que há anos desejava cumprir. Wel











Fotonotícia: * JORNALISTAS CONCENTRADOS NA CINELÂNDIA EM 1968
"*
Quando as palavras tocam o silêncio, a imagem é capaz de retomar o ímpeto pelo diálogo
"



O jornalismo era uma das maneiras de idealistas lutarem contra a repressão militar.





Fotonotícia: PASSEATA DOS 100 MIL revisado
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Quando as palavras tocam o silêncio, a imagem é capaz de retomar o ímpeto pelo diálogo
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* 26 de junho de 1968. Passeata dos 100 mil, no Rio de Janeiro, nasceu como um ato de estudantes, mas transformou-se numa grande manifestação popular contra o regime militar. Apoiando os estudantes estavam professores, operários, artistas, intelectuais trabalhadores de diferentes ofícios lutando pela democracia. Lá estavam Oscar Niemeyer, Clarice Lispector, Carlos Scliar, Ernanes Fernandes, Elayne Fonseca, Ziraldo, Fernando Gabeira, Milton Nascimento, Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil e tantos outros.
E com uma câmara na mão e uma idéia na cabeça, Glauber Rocha também filmava a manifestação popular. Deixou inacabado um curta, que marcou no mês de junho: a manifestação dos alunos
da UFRJ que, no dia 4, anunciaram uma greve geral; a concentração estudantil na reitoria da
mesma universidade, na Praia Vermelha no dia 20, que culminou com a prisão de 400
estudantes levados para o campo do Botafogo; e, no dia 26, a Passeata dos Cem Mil.


• - *

A MINISSAIA DAVA O TOM NAS PESSEATAS ESTUDANTIS

O ano de 1968 foi marcado pelas transformações, e a moda não poderia ficar de fora. A moda de 1968 foi marcada pela rebeldia da juventude. Refletia o espírito livre da época. Espelhou o desejo de ruptura com tudo o que era tradicional. Os jovens começaram a usar a moda para mostrar a sua ideologia. E todas essas transformações refletem a moda dos dias atuais.

Com os movimentos estudantis, no auge no Brasil e no mundo, a moda ficou marcada como um símbolo para os jovens rebeldes. Eles queriam quebrar todas as barreiras do tradicional.





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RESTAURANTE CALABOUÇO. MORTE DE ÉDSON LUIZ
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Foto: O Globo - 28.03.1968

• RESTAURANTE CALABOUÇO - Estudantes velam o corpo de Edson Luís Lima Souto, morto em confronto com a polícia militar durante uma manifestação contra o fechamento do restaurante Calabouço, em 28 de março de 1968, no Rio de Janeiro.

O enterro de Édson Luis reúne mais de 50 mil pessoas no Rio em um protesto contra o regime militar.

* Trecho de uma crônica de José Carlos de Oliveira - Uma sugestão construtiva – 20-4-1968.

"A carga da cavalaria da PM sobre a multidão encurralada contra a Candelária: quem não viu? A investida dos soldados armados de sabres e cassetetes contra a multidão desorganizada e aterrorizada na avenida; quem esqueceu? (...) Os soldados se excediam, mas não estavam moralmente liquidados, tanto que destruíram máquinas fotográficas e filmes".


MAIO DE 68 - PARIS
.

* PARIS INFLAMADA - Protestos de maio de 68 inauguram uma nova forma de ação política, que tinha como alicerte o desejo individual.


PROTESTOS NA ALEMANHA
.

* Daniel Cohn-Bendit (ao microfone) participando de passeata na Alemanha a favor da liberação do desejo, de sexualidade.


revisado
: ESCOLA DE DIREITO/UFMG - 1968
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* Manifestação dos estudantes mineiros contra a ditadura militar, em frente à Faculdade de Direito da UFMG. Preocupação marca o encontro de jovens em frente a Escola de Direito. Foto: Arquivo Nacional / Correio da Manhã – 01.01.1968
Na América Latina o significado maior de 1968 foi os protestos dos estudantes contra as ditaduras militares; lutavam-se pela democratização do país, das universidades e da vida pública em geral.


MOVIMENTOS DOS ESTUDANTES FRANCESES
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Maio de 1968, França. O movimento dos estudantes franceses, liderados pelos alunos das universidades de Sorbonne e de Nanterre que foram para as ruas de Paris manifestar contra a moral repressora da sociedade e a política reacionária do presidente Charles de Gaulle.

Na França, não era a guerra ou os direitos civis que incomodavam tanto os jovens. Os estudantes protestavam contra a universidade: a instituição era autoritária e hierárquica, onde os alunos eram proibidos até de questionar professores na sala de aula.





PRIMAVERA DE PRAGA REPRIMIDA PELAS TROPAS DE URSS
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A Primavera de Praga, Tchecoslováquia – 22 de agosto de 1968. Experiência de democracia esmagada pelos tanques soviéticos

O lider Alexander Dubcek foi empossado como primeiro-secretário do Partido Comunista da Tchecoslováquia. Ele prega o "Socialismo com Face Humana", em oposição à União Soviética, iniciando a Primavera de Praga.

Dias 20 e 21 de agosto de 1968 mais de 200 mil soldados soviéticos, fortemente armados com cerca de 5 mil tanques invandem o país e põem fim à Primavera de Praga.

Apesar de derrotado, o movimento mostrou e provocou rachaduras no bloco comunista que, anos mais tarde, acabou com a queda do Muro de Berlim.



LUTHER KING
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«It’s not the expression of the bad people that hurts;
It’s the silence of the good » - Martin Luther King “ Não é a expressão da pessoa má que fere; é o silêncio” - de Martin Luther King bom


Ele não se foi nem vai tão cedo

Dia 4 de abril de 1968, o pastor Martin Luther King, lider dos direitos dos negros e da emancipação da mulher, é assassinado em Memphis, nos EUA. Pouco após sua morte, a Suprema Corte declarou que todas as formas de segregação eram contrárias à Constituição dos Estados Unidos da América – Mas não foi a geração de 68 que favoreceu a ascensão de negros a posições de destaque no país. Dez anos antes de 68 os norte-americanos já faziam campanhas pelos direitos civis. Não apenas em relação à segregação racial. Nos USA jovens com menos de 21 anos não podiam votar em ser votados naquela época.





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sugonl
Se o amor é
Mal-amado,
Ele só pode
Viver enclausurado,
Não pode ter ala
Nem lado,
Para não correr
Risco, e ser
Achado.


O amor pode até
Ser potente,
Até que, Contra ele,
Surja-lhe,
Uma corrente,
Para aprisioná-lo,
Mostre os
Seus
Dentes.
Mata-o,
Ou
Fica
Doente.


Sem remédio,
Prefere
O vitupério,
Como o fez
Lutero,
Iscariotes
De Cristo,
O cemitério!


Essa vida é mesmo
Um mistério!


Cristo um dia
Supôs o amor,
Na terra.
Não deu certo,
Logo fugiu (aos 33 anos),
Para sua verdadeira
Terra (final.

Suerly Gonçalves Veloso
sugonl@uol.com.br –
12/07/2009, 02:02h
sugonl
O amor não é alado,
Não voa,
Como disse
O poeta renomado,
Malgrado,
Ele é ocultado,
Fora do alcance
Das pessoas,
Para que não seja
Barrado,
Mal-interpretado,
Da terra exonerada.


O amor é um pobre coitado.
Vive humilhado,


Não é sagrado,
Menos ainda,
Consagrado;
Só injuriado,
E mal interpretado.


Tivesse Judas
Ocultado (Jesus),
Que já tinha tudo
Escrutinado,
Das profecias,
Era sabatinado,
De Deus (planos),
Era encarregado,
Teria passado,
Para a historia,
Como um bom soldado.


O amor tem medo,
De ser julgado,
Pelos homens,
Por isso se
Esconde,
Abre um buraco
Em nossa fronte,
Dos olhos do homem,
Quer
FICAR Longe.


O amor tem de
Ser negado,
Pois é mais
Inteligente
Não ser metralhado,
Nesse sentido,
Três vezes
Cristo foi
Negado.


Iscariotes para sempre,
Renegado,
Por que
Seu
Amor
Foi
Revelado.


O amor
Não é
Sagrado,
Tudo que é
Sagrado,
É respeitado,
Não pode ser tocado.
O amor somente
É

Encurralado!
(parte 3)
12/07/2009, 02:01h
sugonl
A lua quis imitá-lo
Após da terra
Separada,
Tem dia que
Fica prateada,
Para inspirar
A serenata.


Desde criancinha,
A lua era revoltada,
Preferiu separar-se
Da terra,
Para livrar-se
De
Tanta
Emboscada!


A
Deus,
Repete,
Todos os dias,
Sem parar:
Muito obrigada!
Por me haver
Desterrada.


Essa é a visão
De Shakespeare.
Para pensaR,
Um furacão!


Mas,
O amor não é incolor,
Tem tom e tem cor,
Por isso pode ser visto.


O amor tem som,
Barulhada e guinada,
É feminina,
Por isso,
Pode e não pode,
Ser escutada.


O amor perverte,
Mas também inverte,
Às vezes,
Penetra,
Como um canivete.


Deve ser nesse sentido que
O Príncipe,
Que com tudo se diverte,
Disse,
Que o
Amor
Não está no Norte (cabeça)
Mas no Leste (coração).

(parte 2)
12/07/2009, 02:00h
sugonl
O AMOR NÃO VEM COM OS OLHOS, VÊ
COM A MENTE. POR ISSO É ALADO, É CEGO E TÃO POTENTE (William Shakespeare”


TÍTULO: O AMOR É UM PROJETO QUE NÃO DEU CERTO!


O amor é inteligente.
É vidente.
É prudente.


Pode ser serpente,
Veneno, e
Dormente!


As vezes surge
De repente!
Vem também
Com os mais
Experientes!


O amor
É uma forma
De pensar.
É uma forma
De agir!


Nem o amor
Nem a justiça
São cegas.


São passionais.
Unilaterais.


O amor
Está no coração.
Então,
Fora da razão,
Dos cinco sentidos,
Nesses, a visão.


O amor,
Não tem forma
E não pode ser
Comprado.


Sem estampado,
Só o conhecem
Os namorados.

(parte 1)
12/07/2009, 01:59h
sugonl
(final)Que é solto no que uni os versos (universo).
Pode sonhar com o véu (de noiva).
Mas nunca esquecer o véu da noite.

Se há sorte,
Tamboriras o Norte.
Mas qual sorte?
Mas qual Norte?

Você rompe o pacto quase de morte.
Especula a própria sorte.
O testamento proíbe ver a sorte
Pensando que o amor é caos, é desordem.
E Deus, não descoberto, teria sorte,
Da dor não seria consorte.
Seria amado só por gente de boa sorte.

Vai-te Sofhie e boa sorte.
Das hastes do amor que lhe sobrou (amor),
Enfeitas de todos os mesmos dor.
No SESC estás a expor.
Envias sua mensagem a todo vapor.
Duvide do amor,
Duvide da dor, pois todo amor é bandido,
Traz a alegria, mas atrás vem sempre a dor.


Peça ao homem (cientista) uma máquina do amor.
Que o coração não traga sangue e carne.
De lata,
De ferro,
Do Mágico de Oz mais austero.

O homem é fera!
É lobo sempre na estrada, na espera.
Ora faz amor.
E guerra o amor tempera.

Diga ao Autor que ainda o espera!

Suerly Gonçalves Veloso
Sugonl@uol.com.br
12/07/2009, 01:35h
sugonl
Cuide de Você.

Sofhiee Calle,
Não faltou detalhe?

Do que um amor vale?

Lágrimas em vale?

Baile e Vale rimam com amor?
Qual o seu detalhe?

Para acabar, que um dos dois fale.
Há álibi?

O amor não é chamas que arde no coração?
Não vai embora com o vento,
Como se nunca existisse
Essa sorte a vidente não predisse?

O amor na menina não encarna a meninice?
Soprado ao vento, não caímos todos nós na mesmice?

O amor moribundo inspira o defunto.
Morto, é Falando com o Defunto (Badan)?
Qual é o assunto?

Se o soluço do pranto foi o susto desencontro,
A cena do crime ficou em algum recanto?
Ora dor,
Ora defunto.
Ora espanto.
A linguagem do amor nunca será o esperanto.
A crise é de todo canto (da terra).
Posso falá-lo em versos ou em conto.
Mas se é fim, não tem desconto.


Pode ser o encosto.
Pode ser o desgosto.
Pode o pai terminar o namoro enxugando o papel as lágrimas do rosto (édila).
Pois tudo será só desgosto. Gosto. Entreposto.
O amor nunca ocorrerá a nosso gosto (ver Romeu e Julieta)!


Nós não estamos nos céus.
(continua)
12/07/2009, 01


"Amar é admirar com o coração. Admirar é amar com o cérebro."
-- Theophile Gautier


"O amor grava sua tatuagem na carteira de todo amante"
-- Mildred Meiers



A top model Naomi Sims, em editorial de moda publicado em 1968. (Foto: AP)



Maria, Maria
É um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta
Uma mulher que merece
Viver e amar
Como outra qualquer
Do planeta
Maria, Maria
É o som, é a cor, é o suor
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que rí
Quando deve chorar
E não vive, apenas aguenta
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida....
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria...
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida....
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Hei! Hei! Hei! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!...
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria...
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho, sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Hei! Hei! Hei! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!...


COMO ELAS SE COMPORTAM
NO TOILETTE
M U L H E R F I N A: (nada diz)
M U L H E R COMUM: Essa calcinha me incomoda.
M U L H E R VULGAR: Eu odeio calcinha enfiada no rego.
MULHER DEPRAVADA Eu tenho ódio de calcinha enfiada no cú.

APÓS UM JANTAR
M U L H E R F I N A: O jantar estava divino, parabéns.
M U L H E R COMUM: Estou satisfeita.
M U L H E R VULGAR: Tô cheia.
MULHER DEPRAVADA: Comi até o cu fazer bico.

NO CHURRASCO
M U L H E R F I N A: Está ótima essa lingüiça.
M U L H E R COMUM: Muito boa essa lingüiça.
M U L H E R VULGAR: Noooosa que lingüiça grande!...
MULHER DEPRAVADA: Tô comendo a lingüiça do churrasqueiro (gargalhada).

VENDO UM AMIGO CHUPANDO UM SORVETE
M U L H E R F I N A: Posso experimentar!?
M U L H E R COMUM: Me dê um pedaço!?
M U L H E R VULGAR: Posso dar uma chupada?
MULHER DEPRAVADA: Deixa eu chupar? Não vou morder, garanto. (gargalhada)

COMO SE VESTEM
M U L H E R F I N A: de acordo com o evento.
M U L H E R COMUM: sempre da mesma forma, jeans, camisete e tênis em todos os eventos.
M U L H E R VULGAR: micro saia, bermuda agarrada, em todos os eventos.
MULHER DEPRAVADA: frente única no churrasco, micro saia mostrando a calcinha à noite.

BEBIDAS
M U L H E R F I N A: champanhe, uísque e vinho, dependendo da ocasião.
M U L H E R COMUM: batida.
M U L H E R VULGAR: cerveja.
MULHER DEPRAVADA: cachaça, conhaque, cerveja, vodca, licor, água de bateria, etc

PROCURANDO UM AMIGO QUE SE CHAMA PEDRO NUMA FESTA
M U L H E R F I N A: Você viu o Pedro?
M U L H E R COMUM: Cadê o Pedro?
M U L H E R VULGAR: Pedroooooooooooo!!!
MULHER DEPRAVADA: Caralho, onde o viado do Pedro se meteu, cacete!

SAINDO DA MESA PARA IR AO BANHEIRO
M U L H E R F I N A: Com licença, vou retocar a maquiagem.
M U L H E R COMUM: Vou a toilette.
M U L H E R VULGAR: Vou tirar água do joelho. (risos)
MULHER DEPRAVADA: Vou fazer um download, soltar um barro, matricular o Pelé na natação (gargalhada)

VENDO UM HOMEM INTERESSANTE

M U L H E R F I N A: Muito simpático


M U L H E R COMUM: Que homem liiiindo!
M U L H E R VULGAR: Dessa fruta eu chupava até o caroço!
MULHER DEPRAVADA: Eu deixava ele fazer barba, cabelo e bigode.

O QUE DIZEM QUANTO UM INDESEJÁVEL LHE FALA ALGUMA GRACINHA

M U L H E R F I N A: (ignora)

M U L H E R COMUM: Tem gente que não tem noção.
M U L H E R VULGAR: Vai te catar o meu! Não se enxerga não!?
MULHER DEPRAVADA: Vai tomar no cú, viado, corno...

O QUE ROLA NO PRIMEIRO ENCONTRO
M U L H E R F I N A: só um beijo de despedida.
M U L H E R COMUM: muitos beijos.
M U L H E R VULGAR: beijos e carícias (AMASSO)
MULHER DEPRAVADA: trepa e dá a bunda dizendo que era virgem atrás.

OUVINDO JAZZ
M U L H E R F I N A: Liiindo!
M U L H E R COMUM: Adoro qualquer tipo de música!
M U L H E R VULGAR: Que porra de música é essa?
MULHER DEPRAVADA: Tira essa merda aí, coloca um pagode, cacete!

DIANTE DE UMA BROCHADA DO PARCEIRO
M U L H E R F I N A: Meu amor, isso acontece. Fique tranqüilo.
M U L H E R COMUM: O problema é comigo?
M U L H E R VULGAR: Você já trepou hoje com alguma vadia?
MULHER DEPRAVADA: Caralho, quer que eu faça fio terra em você?

ASSISTINDO UM BALLET
M U L H E R F I N A: Bravo!!!
M U L H E R COMUM: Lindo!!!
M U L H E R VULGAR: Perdi meu tempo, deixei de ver as videocassetadas.
MULHER DEPRAVADA: Que porra é essa? Ridículo, isso é coisa de viado!

PRIMEIRO CONTATO NO MSN
M U L H E R F I N A: Boa Noite!
M U L H E R COMUM: Oiiiiiiiiiiiiiiiii
M U L H E R VULGAR: Falae gato.
MULHER DEPRAVADA: Peraê, vou ligar a webcam.